“Bolsonaro deveria repetir José Sarney e proteger a Amazônia com firmeza e responsabilidade”, por Waldir Maranhão

 
(*) Waldir Maranhão

A repercussão internacional das decisões anunciadas pelos participantes da Cúpula de Líderes sobre o Clima impede que a crise ambiental brasileira seja varrida para debaixo do tapete. Por isso abordo o tema neste artigo, com uma visão mais ampla do tema e com direito à uma rápida viagem no tempo.

O presidente Jair Bolsonaro prometeu, durante o encontro de líderes internacionais, dobrar os recursos destinados à fiscalização ambiental, mas horas depois a promessa se desfez por conta de um Orçamento que acende o sinal de alerta em todas as direções. Na verdade, os recursos foram reduzidos, se comparados com as previsões orçamentárias.

O desmatamento no Brasil é um processo que remonta a 1500, quando o país ainda era Pindorama, que em tupi-guarani significa “terra livre dos males”. Mais de cinco séculos se passaram e boa parte da cobertura florestal do país desapareceu, ficando, ao que parece, apenas os males que os indígenas imaginavam inexistir por aqui.

A preservação ambiental é preponderante para garantir a vida do ser humano em todo o planeta, ao mesmo tempo em que é necessário ter olhos para a exploração sustentável das florestas, sem agredir o meio ambiente, livrando seus habitantes da ameaça da depredação da natureza e garantindo o seu sustento de forma digna e consciente.

Maior floresta tropical do mundo, a Amazônia é um patrimônio valiosíssimo que o Estado brasileiro precisa usar corretamente para garantir, ao final, a movimentação da roda da economia. Sem isso, o Brasil enfrentará barreiras comerciais perigosas.

Para que a viagem na linha do tempo não seja tão longa, volto a meados da década de 80, quando o então presidente José Sarney criou o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), que sucedeu algumas agências de fiscalização ambiental que por diversos motivos fracassaram no cumprimento de seus objetivos.

À época, o presidente Sarney foi aconselhado a criar o Ministério do Meio Ambiente, mas a criação do Ibama, órgão que surgiu a partir do “Programa Nossa Natureza”, tinha podres de fiscalizar o meio ambiente e propor medidas para preservá-lo. A criação do Ibama tinha como eixo o desenvolvimento sustentável, principal proposta da ECO 72, em Estocolmo.

Para levar adiante uma política ambiental que se fazia extremamente necessária naquele momento, Sarney editou decretos importantes visando o meio ambiente, encaminhou ao Congresso Nacional projetos de lei que, após aprovação, foram regulamentados com celeridade.

O mais importante dos decretos para a defesa e preservação da floresta amazônica impedia o uso de recursos obtidos através de financiamentos oficiais em ações que resultassem em desmatamento.

Essa medida serviu para barrar o movimento iniciado durante a ditadura, quando os militares incentivavam o desmatamento da Amazônia para, sob a justificativa de que a região precisava ser ocupada, criar enormes áreas para a agricultura e pastagem. Isso se deu com a derrubada e a queima de milhões de árvores.

Contudo, não foi apenas um conjunto de medidas adotadas pelo governo Sarney no âmbito legal que permitiu combater o desmatamento e as queimadas na Amazônia. O então presidente da República aportou recursos financeiros no Ibama, dando ao órgão capacidade operacional.

À época, a imagem do Brasil no exterior era ruim, o que causava dificuldades e constrangimento aos nossos diplomatas, a ponto de entidades financeiras internacionais suspenderem financiamentos para qualquer projeto econômico do país. Porém, a atuação do Ibama, comandado por Fernando César Mesquita, possibilitou a redução gradual dos índices de desmatamento na floresta amazônica.

Levantamento feito na ocasião pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão que é demonizado pelo governo atual, mostrou que o desmatamento havia caído de 17.770 km² (1988-1989) para 13.730 km² (1989-1990). No período 90-91 caiu ainda mais, ficando em 11.030 km².

Considerado por muitos como celeiro global, o Brasil, como diz a sabedoria popular, precisa ter “calma com o andor porque o santo é de barro”. Em outras palavras, de nada adianta desmatar para abrir pastagens e áreas agriculturáveis se em breve não terá quem consuma o fruto do desmatamento.

Reconheço que produzir alimentos para 210 milhões de pessoas, no caso do Brasil, não é tarefa fácil, mas é importante que essa operação respeite o meio ambiente e principalmente os povos das florestas. Diante disso, cito frase do filósofo Lao-Tsé, da China Antiga: “Rico é aquele que sabe ter o suficiente”. Creio que a pandemia nos ensinou muito a esse respeito.

Com o processo de desidratação que o atual governo impôs aos órgãos ambientais, dificultando e até impedindo a fiscalização, reforçou a sensação de impunidade que permeia o universo de desmatadores e grileiros, permitindo a devastação do maior patrimônio dessa e de outras tantas gerações.

O governo de agora insiste em ressuscitar os absurdos da ditadura militar, quando na verdade deveria repetir o gesto pioneiro de José Sarney de combater o desmatamento com mais empenho e vigor.

Para concluir recorro a Demócrito, que em célebre frase anteviu o que vivemos hoje: “O animal é tão ou mais sábio do que o homem: conhece a medida da sua necessidade, enquanto o homem a ignora.”

(*) Waldir Maranhão – médico veterinário e ex-reitor da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), onde lecionou durante anos, foi deputado federal, 1º vice-presidente e presidente da Câmara dos Deputados.

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