Terra na CPI da Pandemia

(*) Gisele Leite

As declarações de Osmar Terra não trouxeram maiores esclarecimentos, apesar de ser considerado importante integrante do gabinete das sombras. Afirmou que o STF em 15 de abril de 2020 impediu e limitou o poder do presidente da república de interferir. Em verdade, o STF apenas reconhecera que os Estados, Distrito Federal e municípios têm competência concorrente na área da saúde.

O mesmo entendimento fora reafirmado pelos ministros da Suprema Corte em diversas ocasiões. O Deputado Terra também afirmou peremptoriamente que não tem nenhum impacto fazer o lockdown e a quarentena. Há estudos brasileiros e internacionais sérios que já comprovaram cabalmente a eficácia do isolamento social e do distanciamento para conter a transmissão do coronavírus.

Outro estudo publicado no “International Journal of Infectious Diseases” em outubro de 2020 mostrou a eficácia de intervenções não farmacêuticas, como uso obrigatório de máscara em público; isolamento social ou quarentena; distanciamento social e restrição na mobilidade urbana.

Além da recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS), institutos brasileiros como a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), responsável pela produção da vacina AstraZeneca contra a Covid-19, também defendem a importância do isolamento social.

Bem como a utilização de máscaras mesmo após a vacinação plena (que em geral é depois da segunda dose). Outra inverdade dita, foi afirmar que nenhuma outra pandemia teve variante. Pois existem evidências concretas de que versões diferentes de influenza circulavam no início e no fim da pandemia de 1918, por exemplo, conforme explica o virologista Rômulo Neris, doutorando da UFRJ. Apesar de ser difícil dimensionar a influência de variantes no cenário da pandemia, especialmente na época, Neris afirma que a seleção de variantes representa um fenômeno natural que acontece quando o patógeno se multiplica descontroladamente.

Um artigo publicado na revista “The Lancet” menciona uma série de casos de autópsia de soldados que morreram de gripe em 1918 que revelam um processo evolutivo; as sequências virais obtidas dos pulmões das vítimas que morreram em maio de 1918 (antes que a pandemia realmente decolasse) mostraram uma baixa transmissibilidade.

No entanto, no outono de 1918, o material da autópsia revelou que o vírus havia sofrido mutações que aumentaram sua capacidade de se ligar aos receptores das vias aéreas humanas, ganhando transmissibilidade.

Enfim, seu depoimento citou dados falsos sobre a pandemia, foi rapidamente corrigido pelos senadores presentes. Apesar de reconhecer que teve de fato vários encontros com o atual Presidente da República, afirmou que não existe gabinete paralelo.

E afirmou não se lembrar se tratou ou não sobre assuntos específicos, como a questão de imunidade de rebanho, ou seja, sem vacinas. Apenas confirmou que tem relação de amizade com atual Presidente da República. O relator da CPI da Covid do Senado, Renan Calheiros apontou oito contradições no depoimento do deputado federal Osmar Terra e, apenas admitiu ter errado em suas projeções sobre número de óbitos no país. E, até citou Dráuzio Varella que cunhou a expressão “gripezinha” para a infecção produzida pelo coronavírus.

O negacionismo foi a nota constante em todo depoimento. Ora negando a doença e, ora negando o conluio estatuído na falta de gestão do governo federal em face da pandemia de Covid-19.

A tragédia nacional com mais meio milhão de óbitos pela Covid-19. Muitas famílias perderam seus arrimos e, sem renda, passam fome e dependem da solidariedade humana. Há a perda emocional de órfãos, de mulheres, de mães e familiares que precisam assimilar a perda. Processar o luto. E, infelizmente, não há vacinas para todos, e a vacinação segue em todo país em ritmo de tartaruga aleijada.

Do total de vinte e dois ministros que integram o (des)governo federal, apenas três manifestaram honroso pesar pelas mortes. A saber: Queiroga, Tereza Cristina e Gilson Machado. Igualmente, os presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado, do STF e do STJ também fizeram manifestações de pesar. Do mandatário da nação, nem sequer uma única palavra. Mas, ainda ecoa, a vulgar expressão: – E daí?

O que podemos fazer? Lamentar profundamente. Mas não há mal que sempre dure. Manifesto meu pesar pelo país, que sofre duplamente.

(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.

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