(*) Carlos Brickmann
Foi pura coincidência: embora o apagão do Facebook (e de suas outras marcas, Instagram e WhatsApp) tenha custado US$ 6 bilhões do valor de mercado das empresas, esse prejuízo é tolerável para firmas tão lucrativas. O problema é a iniciava da Federal Trade Comission, Comissão Federal de Mercado, de pedir que o Facebook venda o WhatsApp e o Instagram, por questões de monopólio. O maior acionista do Facebook, Mark Zuckerberg, garantiu que não monopoliza o setor de redes sociais. Mas a lei americana pode ser severa: desde 1890 está em vigor o Sherman Act, cujo objetivo é lutar pela livre concorrência e contra monopólios. De acordo com a lei, a Suprema Corte americana determinou que a Standard Oil Company, a maior empresa americana, controlada pelo maior milionário do país, John D. Rockefeller, vendesse (em 1911!) sua participação em uma série de empresas petrolíferas, mais outras que oferecessem vantagens competitivas a elas. No total, a Standard Jersey (no Brasil, Esso) teve de sair de outras 32 empresas. E os concorrentes que enfrentava eram do porte da Shell, Texaco, Atlantic.
As Big Techs de Zuckerberg enfrentam muito menos concorrência. Além disso, o sistema jurídico americano dá extrema importância à jurisprudência. Se a Standard-Jersey, com Rockefeller e tudo, pôde ser dividida, por que não o Facebook? Ali se determinou que a combinação de diversos negócios não pode impedir a livre concorrência. Quem é que consegue enfrentar o Face?
O novo mercado
Com a decisão, a Standard-Jersey foi dividida em 33 empresas diferentes. Hoje, passados 110 anos, a Standard-Jersey se chama Exxon e faz parte da Exxon-Mobil; a Standard-Nova York virou Mobil, e está na Exxon-Mobil. Standard-California é a Chevron; a Standard-Indiana virou Amoco, American Oil Company, e, com a Standard-Ohio, foram compradas pela BP, British Petroleum. A Ohio Oil hoje é Marathon; a Continental Oil se fundiu com a Philips na ConocoPhilips. A South Penn Oil, Pennzoil, agora faz parte da Shell. E a Chesebrough Manufacturing, que trabalhava com resíduos de petróleo, está na Unilever. John D. Rockefeller, excelente administrador, não perdeu nada: triplicou sua fortuna com a venda das ações de outras empresas.
Funcionou: a concorrência baixou o preço do petróleo para o consumidor.
O dono das informações
No caso atual, há uma questão extra a discutir: não é publicando fotos de pessoas deslumbradas por uma paisagem ou a beleza da comida bem montada na mesa que Face, Instagram e WhatsApp ganham dinheiro: faturam com as informações que seus clientes lhes oferecem, pelas quais não pagam, usadas para vender tendências de mercado a quem vende pesquisas.
Peguem, mas paguem
Um risco que correm é o de ter de pagar pela informação que os clientes nem sabem que lhes estão dando de graça, e que lhes garante as despesas e os lucros. Pense só: a cada vez que o caro leitor examina as ofertas de um site, recebe ofertas para, em vez de cadastrar-se de novo, e chatear-se passando informações desnecessárias (afinal, os cartões indicam que o cliente tem saldo para pagar a compra), entrem no sistema da loja via Facebook ou Google. E, faça ou não a compra, receberá durante semanas propostas de compra de produtos iguais ou similares àqueles que examinou. Se cada cliente receber pelas informações que oferece, haverá uma saudável repartição de renda entre quem dá a informação e quem a vende.
Ação conjunta
Big Tech são as empresas de Zuckerberg, mas é também o Google e ainda outras menos conhecidas. Reduzir o poder das Big Tech reduzirá ao mesmo tempo o perigo da Big Data, do processamento maciço de informação para acompanhar os movimentos e pensamentos de cada cidadão. Pode ajudar a evitar a piada da pizzaria: o sujeito liga e pede uma pizza marguerita com bordas recheadas. Mas o atendente da pizzaria diz que não pode: os remédios que o cliente está tomando indicam que precisa evitar gordura, e ele só pode vender-lhe coisas magrinhas, como pizza integral com cobertura de ricota e rúcula.
E, aliás, é só desta vez: o registro indica que o cliente está atrasado com a consulta médica e assim não poderá mais comprar pizza. Não adianta dizer que vai sair do país: o pizzaiolo sabe que seu passaporte está vencido.
Ler é um bom remédio
Aylê-Salassié Filgueiras Quintão, nosso colaborador no Chumbo Gordo (www.chumbogordo.com.br), lança um belo livro: Lanternas Flutuantes – habitando poeticamente o mundo. A edição é simultânea no Brasil (Albatroz) e Alemanha (Omni Scripta, de Saarbrucken).
Uma delícia: mostra como se absorve o modo de ser, de falar, das pessoas com quem convivemos, e que se distinguem por traços singulares e expressivos, fortes ou originais (ou ambos). Lanternas pode ser comprado no Rio, na Albatroz; em Brasília, na Livraria do Chiquinho, na UnB ou com o autor, em [email protected]
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.
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