(*) Ucho Haddad
Mais um ano ameaçador e pandêmico chega ao seu final. Vida fácil demais acaba perdendo a graça, o sentido, a razão de ser. Não que tenha vocação para Indiana Jones ou seja fã dos aperreios, pelo contrário, mas a vida não pode ser insípida. Como dizia o saudoso Wilson Simonal, é preciso “champignon”.
Sou o melhor produto dos meus próprios erros – e continuo sendo. Isso não me faz melhor nem pior, apenas me dá tranquilidade para ser como sou. Não foram apenas os erros que levaram a caminhos supostamente melhores – talvez sem tantas curvas e ribanceiras –, mas também as dificuldades que enfrentei. Na estrada das dificuldades jamais andei pelo acostamento. Nessa caminhada tive a resiliência como parceira de todos os momentos, acreditando em dias menos atabalhoados, na volta por cima. Sou fênix, sempre renascendo das cinzas.
Nos primeiros capítulos da pandemia imaginei que enfrentar o desconhecido proporcionaria a cada um a reflexão sobre a fragilidade vida, o respeito recíproco, a tolerância, o amor ao próximo. Mera ilusão! Os que tombaram diante da pandemia viraram números. Houve, logo no começo, uma tentativa vã de tratar o assunto de forma mais humana, mas durou pouco. Os que sobreviveram, após internações e sequelas, fazem parte das estatísticas. Alguns meses adiante e os mais de 600 mil mortos serão esquecidos, ficarão nas páginas da história negacionista que vivemos.
O ser humano pode não ter piorado de lá para cá, mas continua como antes, mesquinho, míope em relação ao outro. O que costumo chamar de “mais do mesmo”. Perdeu-se a grande chance de evoluir em termos coletivos, de companheirismo e solidariedade. Até mesmo de respeito ao próximo e suas dores. Ainda nutro esperança no ser humano, creio que em algum momento a extensa maioria há de despertar para a realidade.
Às vezes penso que a teoria do quartel de Abrantes insiste em dar as cartas por aqui. Resumindo, o homem continua sem saber olhar para o lado, para o seu semelhante. Sem olhar para o lado nem para frente, passou a mirar apenas os próprios problemas e interesses. Otimista que sou, aposto em uma mudança que ainda está por vir. O planeta mandou duro e claro recado, o Criador também. Ninguém se deu conta disso, para minha decepção.
Recluso, consegui driblar o desconhecido durante quase ano e meio, mas acabei na marca do pênalti, sem direito a reclamação. Temporada de dificuldades e desafios de sobra. Com o apoio de algumas poucas pessoas próximas consegui virar o jogo. Por diversas vezes cheguei a pensar que não resistiria. Há dias, conversando com um velho amigo, confessei que tive medo de morrer. Tenho plena consciência da nossa finitude, mas a “paura” chegou ao pé da cama, onde fiquei por longos e difíceis cinco meses. Não se tratava de “baile do adeus”, mas de não poder levar adiante os muitos projetos que ainda tenho.
Há quase 25 anos, bem longe de casa, tive a mesma sensação: misto de temer a morte e acreditar no tratamento médico. À época, entrava no carro e rodava horas a fio por estradas, sem destino, para talvez compreender os meandros da árdua batalha. Muitas foram as lágrimas que derramei ao volante, sozinho, eu e Deus. Naquele tempo era possível sair para todo canto, sob os soslaios das madrugadas. Voltava para casa, horas depois, sem entender coisa alguma, mas a fé estava lá a me empurrar para frente.
Agora, esgrimando com o coronavírus, era impossível sair. Não tinha força para ficar de pé, sequer tinha lágrimas para chorar. A imagem refletida no espelho do banheiro era estranha para mim. Medo, muito medo. Medo, mais uma vez, de não conseguir levar adiante os muitos planos e sonhos que cultivo a cada instante. Ainda quero fazer mais. Tenho esse compromisso comigo, com o Brasil, com aqueles que amo, com minhas crenças.
Nesse período fiz profunda e lenta retrospectiva da vida, penitenciei-me diante dos erros, os quais, como escrevi, permitiram que corrigisse a rota quando preciso. Também sou fruto das dificuldades que se apresentaram sem cerimônia, como mencionei. Sou grato por ter vivido tudo o que vivi, pois entre erros e acertos, risos e lágrimas, alegrias e decepções tive a chance de evoluir como ser humano.
Que 2022 venha como vier, como Deus quiser. Que o novo ano não interrompa o aprendizado contínuo, não boicote minha preocupação com o próximo, até porque só sei conjugar a vida na primeira pessoa do plural. Assim continuarei fazendo, porque esse é o meu jeito de ser. A vida me deu nova chance, agora, de novo, é comigo. Paz, amor, saúde, fé e esperança a todos. Fiquem bem!
(*) Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, escritor, poeta, palestrante e fotógrafo por devoção.
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