Festival do preço alto

(*) Carlos Brickmann

George Bush, o pai, teve bom desempenho como presidente, teve amplo apoio internacional para obrigar o Iraque a se retirar do Kuwait, acreditava que sua reeleição era certa. Seu adversário, Bill Clinton, cujo posto máximo tinha sido o governo do Arkansas, escolheu o campo de campanha: em vez de glórias militares, os problemas de emprego. Ganhou e se reelegeu.

No Brasil, Bolsonaro pode falar o que quiser, mesmo que seja bobagem. Pode falar uma coisa e fazer outra, pode tirar férias caríssimas a toda hora, pode ter ministros como este da Educação, que repassa o controle de verbas a pastores (cujo objetivo, diz ele, é “construir igrejas”), mas nada disso tira voto. Os inimigos de Bolsonaro são o desemprego e a carestia. Vota-se com o bolso. Bolsonaro sabe disso, tanto que baseia a maior parte de seus esforços eleitorais em auxílios calculados para durar até a votação. E, mesmo assim, não conquistou ainda corações e bolsos: os preços estão vencendo a batalha.

O excelente jornal eletrônico “Giro News”, dedicado ao comércio, acaba de divulgar a inflação nos supermercados: em fevereiro, os preços de comida subiram 6,7%, comparados aos de fevereiro do ano passado (convenhamos, não são muito assalariados que tiveram aumentos desse porte). O café lidera as altas: 83,4%. Cafezinho com açúcar? O açúcar subiu 53%. Estão a preço de banana (já que a banana aumentou quase 20%). Pãozinho, farinha, óleo, batata, legumes, tudo subiu mais de 10%.

É duro pedir votos nessa situação.

Sempre certo

O presidente acha que, apesar da alta dos alimentos (que, aliás, nem são aqueles cuja exportação cresceu), a política econômica está certa e seu Posto Ipiranga, o ministro Paulo Guedes, faz o que pode. Diz o presidente: “Quem esperava o Paulo Guedes liberar R$ 700 bilhões em plena pandemia? Um homem austero, sabemos disso”. E fez dois, digamos, elogios a Guedes.

Elogio 1

“Às vezes, Paulo Guedes, quando alguém fala alguma coisa de você, a gente fala: “Se está ruim com o Paulo Guedes, pior sem ele”.

Elogio 2

“E é o que nós temos…”

Tem quem goste

Talvez o prezado leitor se ofendesse ao receber esse tipo de elogio. Mas o ministro resiste para servir ao país. Deve amar ser chamado de Excelência.

Que situação!

A situação do ministro da Educação, pastor Milton Ribeiro, é difícil: ele delegou a dois outros pastores, que nada têm a ver com o Ministério, a tarefa de cuidar da distribuição de verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento Educacional, FNDE.

Os pastores são Gilmar dos Santos e Arilton Moura, do Ministério Cristo para Todos, uma igreja evangélica da Assembleia de Deus em Goiânia. Em conversa gravada, o ministro diz que sua prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam; em segundo, “atender a todos que são amigos do pastor Gilmar”. Por que? “Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do Gilmar”.

Com que objetivo? “O apoio que a gente pede não é segredo (…) é apoio sobre construção das igrejas”. Aguarda-se que peça demissão.

Demissão difícil

O ministro dificilmente continuará no cargo. Mas que demissão difícil! Ele quer indicar o substituto, um auxiliar direto. O ministro Ciro Nogueira, homem-forte do Centrão e do Governo, também quer. Promete dar a Arthur Lira, presidente da Câmara, mais um cargo no governo. E Valdemar Costa Neto, presidente do partido da família Bolsonaro, também tem candidato.

Notícia boa…

Aquilo que sucessivas autoridades vinham tentando há anos se realizou de repente, sem o menor tumulto: a Cracolândia, área próxima ao centro de São Paulo onde se concentravam viciados em crack e traficantes, esvaziou-se em dois dias. Há quem diga, até mesmo fontes policiais, que foi ordem do crime organizado. A Prefeitura nega qualquer negociação com criminosos.

Secretário-executivo municipal de Projetos Estratégicos, Alexis Vargas atribui a dispersão a ações contínuas que prenderam quase cem traficantes. As ações fazem parte da Operação Barca de Caronte (Caronte, na mitologia grega, era o barqueiro que atravessava o rio Estige, limite do reino dos vivos, levando os mortos para sua nova morada). A Operação Barca de Caronte é real, prendeu muitos traficantes. Mas a dúvida é se terá sido efetivamente o principal motivo para a saída dos craqueiros.

…e má

Entretanto, os craqueiros não se evaporaram: concentraram-se em áreas próximas, formando novas Cracolândias. E muitos se juntaram na avenida Paulista, área importante de São Paulo, aos que já lá se haviam instalado.

A Paulista está lotada de moradores de rua, muitos dos quais craqueiros.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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