Tinindo as espadas. Para quê? Para nada

(*) Carlos Brickmann

O presidente da Petrobras pediu demissão, como Bolsonaro queria. E que é que vai acontecer? Os preços vão continuar altos. O ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida (nomeado há pouquíssimo tempo por Bolsonaro) disse ontem na Câmara que não é possível interferir na política de preços da Petrobras. O ministro que manda de verdade no Governo, Ciro Nogueira, do PP e do Centrão, disse que é contra desvincular o preço dos combustíveis da variação do dólar e da cotação internacional. O que pode ocorrer é a criação de um fundo para diluir os aumentos por períodos maiores. O fundo seria formado com os dividendos que a Petrobras paga ao Governo e com aumento dos impostos sobre as operações da empresa. São verbas que vão faltar para outros setores – o Auxílio Brasil, por exemplo. Ou Educação e Saúde.

Mas, se é tudo apenas maquiagem, por que tanta briga? Guerra eleitoral: Bolsonaro administra por atrito, precisa ter inimigos mesmo entre os amigos. E por que, sendo o sócio majoritário da Petrobras, o Governo não mexe na política de preços da empresa? Aí é preciso voltar alguns anos no tempo.

Com a Operação Lava Jato divulgando a ordenha da Petrobras nos governos petistas, os sócios minoritários pediram imensas indenizações à empresa, proporcionais aos valores envolvidos: falou-se de R$ 4 bilhões que foram devolvidos, mais jatinhos, obras de arte, coisas caras. Michel Temer acertou tudo, mas garantindo que o lucro dos minoritários seria mantido.

O acerto

Dizem que foi um bom acerto, evitando processos que poderiam quebrar a Petrobras. Seja bom ou não, existe; faz parte das normas de conduta (“compliance”) da empresa. Violá-lo seria brigar com fundos de pensão internacionais, que têm mais da metade do capital da Petrobras – o Governo tem a maioria do capital votante, manda na empresa, mas tem de cumprir as normas acertadas.

Seria uma briga muito cara e difícil de ganhar.

São eles, eram eles

Ciro Nogueira diz que a importação de quase 30% dos combustíveis queimados no país é em boa parte culpada pela alta de preços. Culpa do PT, afirma, que teria desviado o dinheiro a ser usado para construir refinarias. Pois é. Paulo Roberto Costa, diretor de Abastecimento da Petrobras de 2004 a 2012, foi indicado ao presidente Lula pelo deputado José Janene, do PP. Em 2014, preso pela Operação Lava Jato, fez delação premiada, acusando políticos de corrupção. Entre eles, Ciro Nogueira, do PP – que acusa só o PT.

A grande frase

O pastor evangélico e deputado federal bolsonarista Otoni de Paula (MDB-Rio), disse em vídeo: “se duvidam de Deus, se duvidam do presidente da República, se duvidam de Deus e do diabo…”

Que quis dizer com isso?

Os preços no mundo

O problema não é o petróleo: petróleo existe em abundância e há países que podem aumentar muito a produção. O problema maior é o refino, diz a ótima revista britânica “The Economist”. A previsão é de que o consumo de petróleo caia nos próximos vinte anos, devido a problemas ambientais e às leis que favorecem combustíveis renováveis. Com essa perspectiva, por que investir em refinarias de alto custo que podem logo ficar ociosas? A revista cita o especialista Alan Gelder, da consultoria Wood Mackenzie: o refino se reduziu em três milhões de barris por dia desde o início da Covid.

Há outro problema: a China, que costumava exportar produtos refinados, reduziu sua exportação à metade, neste ano, para combater a poluição. E há a guerra: com embargo e tudo, a Rússia exporta hoje mais petróleo do que antes. Os clientes pagam menos, mas compram. A Índia, por exemplo, compra dos russos 700 mil barris por dia a mais do que antes da guerra. Mas a venda de produtos refinados russos foi pesadamente atingida pelo embargo.

Piorar e melhorar

As perspectivas são ruins, independentemente da guerra. Prevê-se que a temporada de furacões no Atlântico será mais intensa, o que pode levar à paralisação de refinarias no Golfo do México. Mas talvez, como observa a “Economist”, as leis de mercado deem um jeito na situação: os preços altos devem esfriar a procura, estimular a busca de mais eficiência energética e, mantendo-se a taxa de lucro, incentivar o uso máximo das atuais refinarias.

É campanha. Pague!

Os gastos do cartão corporativo do presidente Jair Bolsonaro atingiram o maior nível desde que tomou posse: neste ano eleitoral, chegaram a R$ 1,2 milhão por mês (em 2019, eram R$ 736 mil, em 2020 R$ 862 mil e, em 2021, R$ 1,1 milhão). É campanha, claro: o presidente está viajando mais para suas passeatas de moto e intensificando sua participação em eventos religiosos. Em 2018, na campanha, Bolsonaro era duro na crítica ao uso dos cartões por seus antecessores e exigia transparência nos gastos.

Nisso ele é coerente: seus gastos serão transparentemente divulgados, só que daqui a cem anos.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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