O coldre da pistola sem mira

(*) Carlos Brickmann

Não se preocupe com a ameaça do presidente Bolsonaro sobre sua vida como cidadão comum, se perder a reeleição. Disse que nunca será preso; e que, se a Polícia bater à porta de sua casa, atirará para matar. Nada disso. A têmpera do Bolsonaro armado já foi testada quando, pilotando sua moto de boa marca e modelo, foi assaltado por outro motoqueiro. Estava armado com uma pistola Glock, de excelente reputação. Sua preparação, feita no Exército, certamente era melhor que a do ladrão.

Bolsonaro entregou a pistola e a moto ao assaltante, numa boa; não se sabe se deu também o coldre onde guardava a pistola de grosso calibre. Por que, diante de um policial, certamente munido de ordem judicial, iria tomar soro de galo e se imaginar um John Wayne?

Mas um fato aí é real: a grande preocupação de Sua Excelência é ser preso após deixar o cargo – justo ele, o 000, acompanhado dos 01, 02 e 03. Muitos de seus atos são passíveis de contestação na Justiça e não faltam adversários a querer processá-lo. Bolsonaro tem também conhecimento de alguns fatos: sabe que parte dos aliados que hoje o abraçam continuarão a abraçá-lo, mas com o objetivo de imobilizá-lo para facilitar a colocação de algemas.

Se tiver garantias de imunidade, deve ficar contente (e políticos de sua confiança conversam com adversários sobre isso). O problema é fazer com que ele possa confiar nas imunidades. Não há no mundo político tanta gente em cuja palavra seja possível acreditar e que tenha força para mantê-la.

Como era…

No Brasil sempre foi assim: o ditador Getúlio Vargas foi deposto por seu ministro da Guerra, marechal Dutra, foi em paz para São Borja e voltou cinco anos depois, eleito presidente (Dutra se aposentou, ponto final). Juscelino perdoou os responsáveis pela tentativa de impedir sua posse e, mais tarde, por duas vezes tentaram derrubá-lo. A democracia voltou com a anistia até mesmo para os torturadores a serviço do regime militar. Mas a época mudou.

…como é

A Comissão da Verdade criada por Dilma mudou esses hábitos. Foi uma comissão de esclarecimento. Mas houve movimento para que, com base em suas conclusões, certos crimes fossem julgados. Nem nos EUA o perdão presidencial, que permitiu a Nixon evitar punições, manteve-se forte. Trump está sob ataque. Ninguém duvida de que os cem anos de sigilo impostos por Bolsonaro aos esgotos de seu regime sejam revogados assim que ele sair.

Os fatos como os fatos são

Caso se dê um jeito de tornar o 000 e os três zeros à esquerda livres de problemas policiais, o golpe perde força. Mas precisa ser uma fórmula menos escandalosa do que essa de dar-lhes cadeira e salários de senador.

As mulheres e os homens

Lamento, caros leitores, mas uma parte substancial dos nossos políticos não sabe lidar com a presença de mulheres na política. Fazem questão de não discutir ideias e de distribuir galanteios (ou conforme cada um, grosserias).

E estamos falando do PSDB, o partido da impecável Ruth Cardoso, onde a notável Alda Marco Antônio deslanchou sua bela carreira política (sim, era do PMDB, mas o PMDB de Franco Montoro, que logo fundaria o PSDB), de Ana Tavares, uma excelente e inatacável assessora de imprensa.

Ontem, terça, o PSDB indicou a senadora paulista Mara Gabrilli para vice de Simone Tebet, candidata do Centro Democrático. Alguns comentários: “Elas estão bonitas hoje. Se produziram. Eu presto atenção” (José Serra). “A Elena Landau -economista de prestígio que coordena o projeto econômico de Simone- é meio rebelde, mas a gente controla” (Tasso Jereissati). “Sei como é difícil para nós homens, que fomos criados para não ter esse romantismo e gentileza, falar de amor. As mulheres sabem falar de amor” (Roberto Freire). Se os partidos estivessem lançando a candidatura de Tasso, alguém estaria louvando sua produção, ou prometendo controlar o rebelde?

Tasso, a propósito, elogiou também “a docilidade das mulheres”. Enfim, a chapa está nas ruas. Não deve ter apoio integral do PMDB nem do PSDB: tanto em um partido como no outro, há alas fechadas com Lula no primeiro turno. Mas, se deslanchar, sabe como é: aí o apoio volta na hora.

Questão eleitoral – custo de vida

Isto dá voto, isto tira voto: a média dos alugueis nas grandes cidades subiu 9,49%, com o retorno dos moradores ao trabalho presencial (já a renovação dos aluguéis subiu pouco mais de 10%). Mas há lugares em que a alta dos novos alugueis foi maior, chegou a 19,55%. Os interessados acabam sendo levados a procurar imóveis menores e prédios com menos serviços.

Questão eleitoral – armas

Uma criança pequena, autista, estava chorando. O vizinho (e cunhado) do pai saiu de casa armado e mandou chamar o cunhado A mãe fechou a porta, o vizinho tentou arrombá-la, o pai da criança atirou, o vizinho devolveu, ambos morreram. A babá está ferida na cabeça. Teresina, sábado.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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