Jornal Nacional: propostas de Lula dependem de orçamento com folga e anestesiar o malfadado Centrão

 
Ex-presidente da República e candidato ao Palácio do Planalto, o petista Luiz Inácio Lula da Silva foi entrevistado nesta quinta-feira (25) pelos apresentadores do Jornal Nacional. O tema corrupção abriu a entrevista, como esperado.

O assunto incomodou Lula, mas é preciso reconhecer que houve corrupção nos seus dois governos e no de Dilma Rousseff – o segundo foi completado por Michel Temer. O esquema de corrupção na Petrobras, cuja primeira denúncia – e outras subsequentes – coube ao editor do UCHO.INFO, em agosto de 2005, decorreu do fracasso do Mensalão.

Quando o escândalo do Mensalão veio à tona na esteira da CPMI dos Correios, o núcleo duro do governo petista decidiu mudar a forma de recompensar os partidos da base aliada pelo apoio no Congresso. Houve um avanço no loteamento do governo, sendo que as legendas passaram a ser responsáveis pelo ônus. No momento em que os políticos erraram na dose, um escândalo de corrupção maior tornou-se público.

É importante lembrar que por ocasião do Mensalão, o então presidente Lula veio a público para admitir a existência do esquema e pedir desculpas à população. Se Lula não se recorda desse episódio, nós do UCHO.INFO temos excelente memória.

Até 2009, quando levamos as denúncias ao Ministério Público Federal, este site noticiou diversas vezes a existência de um esquema de corrupção envolvendo a Petrobras, que diante da volúpia dos parlamentares acabou migrando para outros órgãos oficiais.

Em 2014, com o advento da Operação Lava-Jato, o UCHO.INFO alertou que as investigações e os eventuais julgamentos deveriam acontecer dos limites da lei, sob pena de se repetir o que aconteceu com as operações Satiagraha e Castelo de Areia, ambas anuladas pela Justiça.

Lava-Jato e triplex

O que se viu na Lava-Jato, em especial na força-tarefa de Curitiba, foi um premeditado desrespeito à legislação vigente em nome de um projeto de poder que se comprovou anos mais tarde. Quando o então juiz Sérgio Moro determinou a condução coercitiva de Lula, ficou claro que o resultado da Lava-Jato seria um desastre. Mesmo assim, sempre defendemos o respeito às decisões judiciais, que podem e devem ser contestadas na forma da lei.

A arbitrariedade da força-tarefa de Curitiba ficou evidente quando Moro condenou o ex-presidente Lula no caso do apartamento triplex no Guarujá (SP). A ex-primeira-dama Marisa Letícia tinha uma cota no empreendimento cuja construção era de responsabilidade da Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo (Bancoop). O fato de o triplex ter sido oferecido a Lula pela empreiteira OAS não significa que o direito de Dona Marisa a uma unidade básica do empreendimento deixou de existir.

Moro condenou Lula com base em indícios, não em provas, confirmando nosso alerta inicial: desrespeito à lei. Aliás, com o conhecimento de Sérgio Moro, que pautava os integrantes da força-tarefa de Curitiba, acordos de colaboração premiada foram obtidos à base de chantagem. Mediante a possibilidade de ser preso e ver a família ser arrastada ao cerne de determinado escândalo, o investigado acabava falando aquilo que os procuradores queriam ouvir.

 
STF e Lava-Jato

O Supremo Tribunal Federal (STF) anulou as condenações impostas a Lula pela Lava-Jato por entender que Sérgio Moro foi parcial e que Curitiba não era o foro competente para julgar ações penais que não envolviam a Petrobras.

Cabe ressaltar que a anulação das condenações não significa que Lula é inocente, mas não estamos a afirmar que é culpado, mas o petista sempre soube da existência do esquema de corrupção, até então o maior da história nacional.

Em que pese o direito dos petistas de negarem a existência do esquema criminoso que embasou a Lava-Jato, não se pode tergiversar diante de fatos. Até porque, delatores aceitaram devolver boa parte do dinheiro desviado da Petrobras e de outros órgãos do Estado. Só devolve dinheiro aos cofres públicos muito além das próprias posses quem esse envolveu em corrupção. Aliás, o emedebista Geddel Vieira Lima não guardou mais de R$ 50 milhões em dinheiro vivo em apartamento de Salvador porque a origem era lícita. E o MDB era da base de apoio aos governos do PT.

Lula não foi inocentado pela Justiça, como querem fazer crer alguns aliados, apenas as condenações foram anuladas porque Sérgio Moro e sua trupe desrespeitaram o direito do réu à ampla defesa e ao devido processo legal. Como os processos foram ilegais, o passo seguinte foi a anulação das condenações. Mesmo assim, Moro é candidato ao Senado pelo Paraná, ou seja, alguém que desrespeitou a lei quer ser legislador.

Ministério Público e PF

Gostem ou não os que demonizam Lula, o petista sempre indicou para o comando da Procuradoria-Geral da República um nome que constava da lista tríplice, assim como fez Dilma Rousseff. Bolsonaro decidiu quebrar a tradição e acabou indicando alguém – no caso Augusto Aras – que mais parece seu advogado de defesa.

Em relação à Polícia Federal, Lula, assim como Dilma, jamais impediu qualquer investigação. O ex-presidente pode ter não concordado com essa ou aquela investigação, mas é preciso ser justo: a PF sempre agiu com total independência. Tanto é assim, que as investigações da Lava-Jato ocorreram sem qualquer interferência do Palácio do Planalto.

Economia e bomba fiscal

Sabem os leitores e leitoras que não temos político de estimação, assim como não fazemos jornalismo de encomenda. Durante mais de treze anos criticamos os governos petistas, por isso nos sentimos à vontade para criticar Jair Bolsonaro e seus comparsas.

Lula disse ao JN que deseja fazer mais e melhor para o povo, mas é importante reconhecer que a situação econômico-fiscal do País não favorece. Como temos afirmado ao longo dos últimos meses, o atual governo armou uma bomba fiscal de efeito retardado que acabará estourando no colo do próximo presidente da República.

 
Se Lula conseguirá fazer o que pretende e o que expôs no JN não se sabe, mas é certo que será preciso um intenso malabarismo fiscal para que as promessas sejam minimamente cumpridas. Não se pode esquecer que o primeiro ano do próximo governo está desde já seriamente comprometido, sendo que os efeitos colaterais desse cenário atingirão os mais pobres, como sempre.

A geração de empregos, como anunciou Lula, exigirá uma ginástica tremenda por parte do governo, em especial da próxima equipe econômica. É impossível movimentar a economia de um país onde a maioria da população recebe menos de dois salários mínimos por mês. A fórmula do crédito fácil, adotada nos governos petistas como propulsora da economia e duramente criticada pelo UCHO.INFO, foi uma bomba de efeito retardado. A economia cresce de maneira sustentável quando são criadas condições para o trabalhador gerar a própria riqueza, não à sombra do crédito fácil e do endividamento irresponsável.

Políticas sociais

Não há como negar que os brasileiros das classes mais baixas em termos econômicos experimentaram algum alívio existencial pela primeira vez, depois de décadas de sufoco, nos governos de Lula, principalmente no primeiro. É impossível não reconhecer isso.

Melhorar as políticas sociais é uma necessidade premente, mas nenhum cidadão deve esperar milagre no próximo ano, pois a proposta de Orçamento para 2023 já está no Congresso e o panorama não é dos melhores. Melhor seria se Lula dissesse aos eleitores que fará o máximo possível, de acordo com o Orçamento, o teto de gastos e o equilíbrio fiscal. Não se trata de desanimar quem busca esperança, mas de entender que mudanças não acontecem da noite para o dia e devem ser de longo prazo. Do contrário a gangorra do caos continuará se movimentando.

Orçamento secreto

O orçamento secreto não é algo fácil de ser eliminado, como propôs Lula, que prometeu governar baseado no diálogo com os partidos políticos, não com o Centrão. O petista é persuasivo e sabe como fazer política, mas prometer acabar com o orçamento secreto é um ato de irresponsabilidade.

O País está focado na polarizada disputa pela Presidência da República, mas a população deveria estar atenta aos candidatos à Câmara dos Deputados e ao Senado. Na Câmara, por exemplo, 87% dos parlamentares tentarão a reeleição, o que significa que a partir de 2023, durante quatro anos, teremos “mais do mesmo” no Parlamento. Não por acaso, Lula pediu que em 2 de outubro os eleitores votem com esperança.

Querer tirar do Centrão, o que há de pior na política brasileira, o poder que cresceu sob Bolsonaro, cortando recursos do orçamento secreto, é inviabilizar desde já o próximo governo. Esse “toma lá, dá cá”, que Jair Bolsonaro prometeu extirpar da cena política, mas não conseguiu, só deixará de existir quando o brasileiro aprender a votar. Isso exige paciência e depende de investimentos na educação para que o cidadão consiga compreender minimamente a política. Caso contrário, a ciranda da patifaria política será perene.

Por outro lado, o PT criou os balões de ensaio que viabilizaram o malfadado orçamento secreto. O Mensalão e o Petrolão abriram caminho para que o Centrão avançasse de forma voraz sobre o atual presidente, que é desprovido de traquejo político e cometeu uma série de crimes de reponsabilidade. Represar mais de 140 pedidos de impeachment contra o presidente da República tem um preço, excessivamente caro. E o Centrão foi implacável ao cobrar a fatura.

Para quem não se recorda, os que participaram de forma criminosa do Mensalão e do Petrolão são os mesmos que fizeram de Jair Bolsonaro uma presa fácil. O Partido Progressista, de Arthur Lira e Ciro Nogueira, foi um dos pivôs do Petrolão, enquanto Valdemar Costa Neto, presidente do partido de Bolsonaro (PL), foi um dos destaques do Mensalão. Com o volume de dinheiro desviado das emedas do orçamento secreto e dos cargos entregues aos proxenetas da política, muitos dos “centristas’ serão reeleitos.

 
Agronegócio, Meio Ambiente e MST

Na entrevista ao JN, Lula defendeu a preservação da Amazônia e de outros biomas, ao mesmo tempo em que teceu críticas a setores do agronegócio. O ex-presidente disse que as grandes empresas do setor não defendem o desmatamento, mas alguns segmentos do agronegócio se beneficiam do desmatamento.

Não é de hoje que o UCHO.INFO afirma que o agronegócio brasileiro recorre ao bom-mocismo, inclusive se valendo de caríssimas campanhas publicitárias, mas não se deve esquecer que muitas empresas grandes do setor têm fornecedores que se beneficiam do desmatamento e da exploração ilegal de áreas rurais. O recente escândalo envolvendo o presidente da Funai, Marcelo Augusto Xavier, é prova disso. Em gravação telefônica, Xavier foi flagrado oferecendo apoio a Jussielson Silva, servidor da Funai, preso pela Polícia Federal em maio passado por arrendar a agricultores terras indígenas.

Em relação ao MST, que por diversas vezes foi alvo de nossas críticas, Lula disse que o Movimento dos Sem Terra não é mais como antigamente. Disse o petista que o MST é o maior produtor de arroz orgânico do País. E sugeriu que os apresentadores do JN visitassem as cooperativas agrícolas do movimento. A agricultura familiar, que engloba as cooperativas do MST, é uma grande produtora de alimentos.

O UCHO.INFO sempre defendeu o direito à propriedade, como estabelece a Constituição Federal, mas terra improdutiva em um país com 33 milhões de famintos é uma aberração. Considerando que o Estado indeniza os proprietários das terras improdutivas e invadidas, não há o que contestar.

Contudo, em 2002, quando o MST invadiu a fazenda Córrego da Ponte, em Buritis (MG), à época pertencente à família do então presidente Fernando Henrique Cardoso e a Jovelino Mineiro, fomos contundentes ao criticar o movimento, que chegou a ocupar a sede da propriedade rural. Na ocasião, a fazenda era produtiva e a invasão ocorreu por questões político-ideológicas, não por falta de terra para plantar em outras regiões.


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