Lula x Bolsonaro: declarações de apoio aos candidatos não garantem transferência de votos

 
Em 2018, os candidatos ao Palácio do Planalto falavam em defesa da democracia sem descer do pedestal. No primeiro turno da eleição presidencial deste ano o cenário não foi diferente. Todos defenderam a democracia, cada um a seu modo, mas ninguém se dispôs a desistir da própria candidatura para possibilitar a formação de uma frente democrática capaz de derrotar Jair Bolsonaro.

Uma parcela do MDB, partido da senadora Simone Tebet, defendeu logo de início apoio ao ex-presidente Lula, mas alguns caciques da legenda apostaram todas as fichas na tese da chamada terceira via, que desmoronou muito antes de existir de maneira formal. Isso porque o então governador João Dória Júnior (PSDB), de São Paulo, acreditava ser a tábua de salvação do País.

Dória saiu do palco político muito menor do que entrou, em 2016, quando concorreu à Prefeitura de São Paulo, não sem antes ter prestado um desserviço à política e ao próprio partido, que se transformou em medíocre linha auxiliar do bolsonarismo.

Simone Tebet e MDB

Terceira colocada na fase inicial da disputa pela Presidência da República, Simone Tebet já dava sinais de que apoiaria Lula em eventual segundo turno. Após a divulgação dos resultados do primeiro turno, a candidata emedebista afirmou que não ficaria “em cima do muro” e deu prazo de 48 horas para que os partidos da coligação decidam quem apoiar.

Enquanto Tebet tende a confirmar apoio a Lula, o MDB deve anunciar na quarta-feira (5) posição de neutralidade em relação ao segundo turno da disputa presidencial, liberando os filiados para decidir quem apoiar. Isso porque há na legenda duas correntes distintas: uma, do Norte e do Nordeste, que defende apoio a Lula, outra, do Sul e do Centro-Oeste, que prefere apoiar Bolsonaro.

PDT e Ciro Gomes

O PDT decidiu que no segundo turno apoiará o candidato do PT à Presidência da República. Quarto colocado no primeiro turno, com apenas 3% dos votos válidos, Ciro Gomes (PDT) anunciou que acompanhará a decisão do partido, sem citar o nome de Lula, alvo de duras críticas por parte do pedetista.

O presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, minimizou as críticas de Ciro ao petista. “O processo político às vezes se acirra de uma maneira, eu vivi isso com Brizola e Lula lá em 1989. Um teria que engolir o sapo barbudo, o outro fugiu com a saia da mãe. Uma coisa muito forte. Isso não impediu Brizola de estar com Lula na campanha”.

PSDB e Rodrigo Garcia

O PSDB, por sua vez, sequer teve tempo para se reunir e foi surpreendido pelo anúncio do governador de São Paulo, Rodrigo Garcia, que declarou apoio incondicional a Jair Bolsonaro e Tarcísio de Freitas, candidato bolsonarista ao Palácio dos Bandeirantes.

Garcia, considerado “cristão novo” no PSDB, disse que vê no ex-ministro da Infraestrutura “não só um bom trabalho, mas condição de evitar que o PT ganhe em São Paulo”. O governador paulista destacou que seu apoio decorre de decisão pessoal, discutida com alguns membros do PSDB, mas não representa o entendimento do partido como um todo.

“Esse apoio do Rodrigo é muito bem-vindo, agradeço de coração a ele. Ele já tinha um amigo e vai ter um melhor amigo ainda para propostas que ele porventura queira sugerir para o nosso governo. Porque o governo não é uma pessoa só, são várias”, disse Bolsonaro, durante rápido encontro com o governador no Aeroporto de Congonhas.

O adesismo de Rodrigo Garcia é tão incompreensível em termos políticos, que o governador não rebateu de maneira contundente a declaração de Tarcísio de Freitas, que horas antes do anúncio disse que “não faz sentido” ter o tucano no palanque, apesar de contar com o apoio do PSDB.

Quatro secretários do governo de São Paulo, pelo menos, podem pedir demissão em razão do apoio de Garcia a Bolsonaro. São eles: Rodrigo Maia (Projetos Estratégicos), Sérgio Sá Leitão (Cultura), Laura Machado (Desenvolvimento Social) e Zeina Latif (Desenvolvimento Econômico), Os quatro solicitaram uma reunião com o governador paulista, na quarta-feira, quando devem formalizar a debandada.

 
Cidadania e Roberto Freire

Presidente nacional do Cidadania, Roberto Freire se antecipou e anunciou que a legenda apoiará Lula na disputa contra Jair Bolsonaro. Considerando história de Freire e do próprio partido, ninguém esperava outra decisão.

Freire afirmou que o apoio a Lula não está relacionado a qualquer compromisso programático e se deve à avaliação de que uma eventual reeleição Bolsonaro representa “risco ao processo democrático”.

“Bolsonaro, nesses quatro anos, demonstrou sua total falta de respeito às suas instituições democráticas. Inclusive vocês, da imprensa, conhecem bem o que isso significa. Portanto, contra todo esse atropelo, contra todo o risco de retrocessos na questão democrática, nós vamos votar no número 13”, disse o presidente do Cidadania, em coletiva.

A decisão de Rodrigo Garcia é um escárnio, um golpe rasteiro contra a democracia, a ponto de Roberto Freire sugerir que ele seja defenestrado do PSDB. Em sua conta no Twitter, Freire foi certeiro e contundente: “O senhor Rodrigo Garcia não respeitou o PSDB que não se reuniu e nada decidiu e já se entregou ao protofascista Bolsonaro. Penso que os tucanos social-democratas devem convida-lo a sair do PSDB em respeito a sua própria história.”

Serra, Aloysio, Tasso e FHC

Adversário de Lula na eleição presidencial de 2002, o senador José Serra (PSDB) declarou apoio ao petista no segundo turno. “Não vou me alongar sobre o tema. Diante das alternativas postas, votarei em Lula. E, pela mesma razão, em São Paulo, meu voto será em Tarcísio de Freitas”, afirmou Serra em nota.

Um dos quadros históricos do PSDB, o ex-ministro Aloysio Nunes Ferreira, que desde o primeiro turno apoia Lula, mostrou indignação com o anúncio do governador de São Paulo.

“É uma vergonha, é o fim do mundo. Esse apoio do Rodrigo ao Bolsonaro me constrange. Nem sei se constrange mais o PSDB. É um absurdo o partido ficar indiferente a essa ameaça à democracia que se avizinha”, disse Aloysio ao jornal “O Estado de S. Paulo”.

Ex-presidente nacional do PSDB e senador pelo Ceará, Tasso Jereissati ficou com a democracia e anunciou apoio a Lula. “Minha posição é Lula. Evidente que o partido tem que discutir alguns pontos com a equipe dele, mas o que está em jogo para nós é a democracia e a democracia acima disso tudo”, afirmou Tasso.

Há no comando da campanha de Lula uma expectativa em relação ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que no primeiro turno defendeu o voto na democracia e de forma velada se posicionou contra a reeleição de Bolsonaro.

Zema e o Novo

Legenda que encolheu no Congresso, o Novo preferiu liberar os filiados em vez de decidir por um candidato. Isso fez com que Romeu Zema, reeleito em primeiro turno para o governo de Minas Gerais, anunciasse apoio a Bolsonaro, com base em negociação com políticos locais ligados ao presidente.

Zema justificou a decisão alegando que a gestão do PT em Minas Gerais foi “desastrosa”. Fazendo referência ao antecessor, o petista Fernando Pimentel, o governador afirmou: “Foi uma gestão desastrosa que arruinou o Estado de Minas. É só perguntar para qualquer prefeito de Minas Gerais o estrago que o PT fez no Estado. Então, estou aqui para declarar o meu apoio à candidatura do presidente Bolsonaro, porque eu mais do que ninguém herdei uma tragédia”, disse.

Apoios X votos

Os apoios acima citados, além de outros que devem surgir nas próximas horas, não garantem a transferência de votos. No máximo servem com balizadores para os indecisos. Da forma como tem ocorrido as negociações para a obtenção de apoio, os eleitores são tratados como mercadoria pelos candidatos e seus respectivos apoiadores.


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