(*) Ucho Haddad
De volta ao Brasil, depois de longo período no exterior, fui alvo de impiedosa perseguição por parte de sindicalistas contrários ao jornalismo independente que sempre fiz e continuo fazendo. Alegavam os pretorianos de plantão que por ser autodidata não poderia escrever profissionalmente, como se a Constituição não garantisse o direito à livre manifestação do pensamento. Justificavam a sanha persecutória com a tese boquirrota de que a ausência de um diploma universitário remetia ao desconhecimento de questões sociológicas inerentes ao exercício da profissão de jornalista.
Não posso ser culpado por ter certa intimidade com as palavras, com a escrita. Resisti bravamente às investidas dos perseguidores. Cá estou para defender mais uma vez o jornalismo independente, não sem antes criticar o jornalismo “passa pano” que muitos fazem sem cerimônia, seja por interesses próprios, seja por ordens superiores.
Como sempre afirmo, não tenho político de estimação, jamais fui filiado a qualquer partido, não faço jornalismo de encomenda, não tergiverso diante dos fatos. Norteio meus textos pela verdade dos fatos, pela lógica e pelo bom-senso. Pouco importa se algum político tomará o meu pensamento como ofensa. A verdade é que faço jornalismo como manda o figurino, ou, como dizem os franceses, “comme il faut”. Os incomodados que se mexam!
Os últimos tempos foram marcados por avalanches de notícias falsas, algo que deve continuar sem freios. Mentira virou arma política em um cenário de polarização e ódio. Por enquanto, nenhuma medida prática foi adotada para conter tal desvario informativo. Muitos alegam que é preciso condenar a censura, com o que concordo, mas aguardar a Justiça punir quem dissemina mentiras é ignorar os efeitos colaterais que prevalecem até a tomada de uma decisão.
Estou cansado de fazer jornalismo político independente e sério, com didatismo, para uma sociedade que não se importa com o amanhã. Meu objetivo sempre foi levar a cada um a verdade, instigando o leitor à reflexão. Parece que para a grande maioria o ato de pensar dói.
A cada 24 horas, o volume de informações quadruplica em todo o planeta. Isso explica a quantidade de informações rasas, para não chamar de frivolidades, que nada acrescentam na vida do cidadão. Preocupante, tal cenário encontra explicação na necessidade dos veículos de comunicação que gravitam na órbita da internet de aumentarem o faturamento cada vez mais. Nessa toada de desinformação, importantes veículos de imprensa têm se dedicado ao jornalismo rasteiro. É o que rende audiência, acesso às páginas digitais, dinheiro no caixa.
As redes sociais foram transformadas em terra de ninguém, um faroeste digital. Todos sabem! O erro jornalístico está em repercutir, dar voz aos absurdos publicados nas redes sociais. Tantos absurdos servem como deleite aos que desprezam a democracia e o Estado de Direito, aos que ignoram as leis.
Noticiar que Jair Bolsonaro, o golpista fracassado, agora dá nome a uma linha de botinas, os populares borzeguins, é falta de assunto, é não ter uma pauta séria para gerar informação de qualidade. Se o período do ano não favorece a produção de matérias jornalísticas no âmbito político, que os veículos de comunicação publiquem textos que remetam à reflexão, que apresentem soluções ao cipoal de problemas que embala o Brasil. Qual é o benefício de uma matéria informando que Michelle Bolsonaro está lançando uma linha de cosméticos? Nenhum, a não ser colocar na mídia alguém que silenciou diante de um plano de golpe de Estado.
Fosse pouco, a Folha, que ousa ditar regras no jornalismo nacional, publicou matéria em que acusa o sobrinho do ministro Fernando Haddad, da Fazenda, de comandar a filial brasileira de empresa de criptomoedas que “fatura bilhões sem pagar imposto”. Até onde sei, cada cidadão tem uma identificação legal e é responsável por seus atos. Em suma, que arquem com as consequências.
A referida matéria foi publicada para denegrir a imagem de Fernando Haddad ou para denunciar mais uma empresa que sonega impostos? Se o alvo da publicação era a empresa sonegadora, não havia razão para vincular o nome do ministro. Sensacionalismo barato, que, vencidas as crispações, ao fim e ao cabo rende milhares de tostões.
A imprensa deveria publicar matérias sobre outros sonegadores de impostos, mas não o faz porque comprometeria o faturamento decorrente de publicidade. Para ser mais específico, grandes empresas sonegam impostos de maneira deslavada e institucionalizada, mas, quando executadas judicialmente pelo Estado, saem no mercado à caça de precatórios para quitar a dívida tributária. Em outras palavras, enriquecem com a sonegação, uma vez que precatórios são adquiridos por valor menor do que o de face. Uma grande rede atacadista é useira e vezeira dessa prática, mas ninguém ousa noticiar para não implodir a cornucópia.
Outra matéria descabida foi a que deu visibilidade a um influenciador digital que divulgou nas redes sociais imagens de Felipe Brandão, filho do ministro Benedito Gonçalves (STJ e TSE), usando artigos de luxo. A Justiça do Rio de Janeiro determinou que as imagens sejam removidas da internet.
A gravação foi feita pelo influenciador Anthony Kruijver em uma rua de Amsterdã, na Holanda, conhecida pelas lojas de luxo. Kruijver costuma questionar os participantes dos vídeos sobre quais marcas de roupa e acessórios estão usando.
No vídeo, Felipe Brandão se identifica como empresário do ramo de artigos de luxo. Ele é sócio em cinco empresas relacionadas com divulgação de atividades na internet, marketing, produções artísticas, serviços empresariais e uma franquia de açaí. Brandão não ocupa qualquer cargo público ou político.
Cada um faz o que quiser com o próprio dinheiro, desde que de origem lícita. Pode-se até mesmo jogar dinheiro pela janela. Resumindo, o objetivo da matéria era atingir o ministro Benedito Gonçalves, que como relator de processo no TSE votou pela inelegibilidade de Bolsonaro, o golpista.
Bom seria se a grande imprensa voltasse à carga com o escândalo dos relógios e joias contrabandeados pela trupe de Bolsonaro para os Estados Unidos, vendidos e recomprados às pressas por seus quejandos. O polêmico caso já não rende tanta audiência, agora flerta com o esquecimento.
Para finalizar, causou espécie matéria publicada no Estadão com críticas à decisão do presidente Lula de apoiar representação da África do Sul na Corte Internacional de Haia em que o Estado de Israel é acusado de genocídio na Faixa de Gaza.
A matéria destaca que a decisão de Lula deverá dificultar as relações diplomáticas e comerciais do Brasil com os Estados Unidos e países da Europa. Para o jornalão pouco importa que 14 mil crianças palestinas, que por certo não integram o grupo Hamas, foram cruel e covardemente assassinadas, desde que o governo brasileiro preserve as relações com países que criminosamente apoiam Israel. Há uma brutal diferença entre combater os radicais do Hamas e dizimar um povo que luta pelo direito de ocupar a terra que lhe foi tomada.
Configura erro injustificável confundir jornalismo com fofoca, que na minha humilde opinião é a patologia da informação. O Brasil é uma casa de Noca (cantou a grande e saudosa Elza Soares) que provoca engulhos, os brasileiros precisam ser estudados.
(*) Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, fotógrafo por devoção.
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