Legislativo versus Judiciário

(*) Gisele Leite

O Senado brasileiro aprovou PEC que limita decisões monocráticas de ministros do STF em dois turnos a Proposta de Emenda à Constituição 8/2021 que proíbe decisões monocráticas que suspendam a eficácia de leis ou atos dos Presidentes dos demais Poderes.

O autor do Projeto, senador Oriovisto Guimarães, minimizou a decisão do relator Esperidião Amin de retirar da proposta o prazo de seis meses para a concessão do pedido de vista, quando um ministro ou desembargador pediu mais tempo para análise de uma ação, o que leva o julgamento a ser suspenso até a sua devolução.

O senador proponente da PEC recordou que a própria Suprema Corte já limitou esse prazo em noventa dias, mas não de forma coletiva. Já sendo contrário à proposta, o senador Humberto Costa avaliar que o Senado invadiu a competência do Poder Judiciário ao definir regras de funcionamento.

O placar foi de 52 votos a 18. Eram necessários 49 votos favoráveis. Com a aprovação, agora o texto segue para a Câmara, onde também precisa ser votado em dois turnos.

A referida aprovação ocorreu em meio a crescente tensão entre o STF e o Congresso Nacional, com decisões divergentes em pautas como o marco temporal para demarcação de terras indígenas.

Outra votação foi a que aprovou a PEC que criminaliza a posse e porte de qualquer quantidade de entorpecente. O Senado aprovou em dois turnos a proposta de emenda à Constituição que criminaliza a posse e o porte de qualquer quantidade de droga ilícita (PEC 45/2023), em 16.4.2024.

A PEC, que agora segue para análise da Câmara dos Deputados, prevê que caberá à autoridade pública definir, de acordo com o caso concreto, se a pessoa flagrada com a substância ilícita responderá como traficante ou usuário. Nesse último caso, ela será condenada com pena alternativa à prisão e encaminhada para tratamento contra doença.

Convém recordar que a dita criminalização, mesmo para consumo, já está prevista na Lei de Drogas de 2006 e que está em vigor e, o Código Penal brasileiro igualmente prevê os crimes contra o tema. A intenção da PEC é incluir a criminalização como regra na Constituição brasileira tornando-a superior a uma lei, sendo mais difícil de ser alterada.

Essa PEC é encarada como uma reação do Legislativo contra o julgamento do STF sobre o mesmo tema, até 6.3.2024. Até o momento, foram cinco votos favoráveis e três contrários à descriminalização da posse de maconha para uso próprio. O julgamento foi pausado após novo pedido de vista do ministro Dias Toffoli.

Doravante, Toffoli terá até 90 (noventa) dias para analisar o processo antes de devolvê-lo para que o presidente da Casa, Luís Roberto Barroso, o coloque novamente na pauta do dia.

O julgamento, iniciado em 2015, foi suspenso pela segunda vez no dia 24 de agosto de 2023, após o ministro André Mendonça pedir vista. Caso o julgamento termine favorável à descriminalização da posse de pequenas quantias de drogas, a Suprema Corte discutirá os parâmetros de quantidade para diferenciar o usuário do traficante. Na visão de defensores dessa medida, poderá reduzir o que seriam prisões equivocadas por tráfico no país.

Caso a descriminalização seja aprovada no STF, a pessoa que portar entorpecentes para consumo próprio não poderá mais ser submetida a outras punições atualmente em vigor, como prestação de serviços à comunidade ou comparecimento a programa ou curso educativo, nem terá um registro na sua ficha criminal.

O Ministro Barroso e a Ministra Weber, por exemplo, propuseram 100 (cem) gramas de maconha como um corte para diferenciar usuário e traficante. A quantidade segue parâmetros usados em outros países, como Espanha e Holanda.

Já Moraes e Mendes sugeriram 60(sessenta) gramas, enquanto Zanin defendeu apenas 25 (vinte e cinco).

Os ministros também discutem fixar uma quantidade máxima de pés de maconha para um usuário cultivar. Luís Roberto Barroso, por exemplo, sugeriu que o usuário possa ter seis plantas fêmeas (aquelas que produzem flores com THC para serem fumadas) em casa.

Os três poderes estão presentes na administração do Estado brasileiro e, essa tripartição foi estabelecida pela Constituição Federal brasileira de 1988. Os poderes, como é cediço, são: Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário.

A origem dos Três Poderes tem origem na Antiguidade, com Aristóteles estabelecendo essa divisão, mas sua consolidação se deu por meio de doutrinadores iluministas tais como John Locke e Montesquieu.

E, visa impedir a concentração de poder e ainda impossibilitar que o governo de uma só pessoa se transformasse em tirania. Assim, nesse modelo cada poder deve atuar de forma independente, cada um fiscalizando o outro para evitar que estes excedam seus limites.

As PECs acima comentadas violam gravemente o equilíbrio entre os Três Poderes, manifestando uma prevalência do Legislativo sobre o Judiciário. Lembremos que o Poder Judiciário é responsável pela interpretação e execução das leis, devendo sempre observar os limites da legislação brasileira vigente e ainda obedecer ao que é determinado pela Constituição Federal brasileira vigente.

Além de ter o dever de mediar os conflitos entre os cidadãos e, também entre os cidadãos e o Estado, além de garantir o respeito aos direitos da população brasileira.

Esse poder é chefiado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas existem tribunais regionais espalhados pelo país. O STF tem a prerrogativa de julgar os membros da Câmara dos Deputados e do Senado, conforme estabelecido na Constituição brasileira vigente.

A Teoria da Separação dos Poderes conhecida, também, como Sistema de Freios e Contrapesos, foi consagrada pelo pensador francês Charles-Louis de Secondat, Baron de La Brède et de Montesquieu, na sua obra “O Espírito das leis”, com base nas obras de Aristóteles (Política) e de John Locke (Segundo Tratado do Governo Civil), no período da Revolução Francesa. Montesquieu permeando as ideias desses pensadores e, com isso, explica, amplia e sistematiza, com grande percuciência, a divisão dos poderes.

O poder é uma forma de controle social capaz de direcionar a conduta de um determinado grupo de pessoas. Contudo, o exercício do poder tende, a ultrapassar e, até mesmo, abusar dos limites estabelecidos pela lei.

Logo, é fundamental a constante alternância dos dirigentes nos poderes Legislativo e Executivo, nos regimes democráticos. A Separação dos Poderes é princípio básico de organização da maioria dos Estados democráticos.

O princípio da Separação dos poderes inspirou os modelos constitucionais das liberdades fundamentais do homem, estando presente no Estado liberal, no Estado Social e no Estado Democrático, fazendo parte de todos os modelos do Estado de Direito.

Frise-se que o Brasil é uma República Federativa e tem como princípio fundamental o Princípio da separação dos poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário), como a base para se constituir em um Estado Democrático de Direito.

O preâmbulo da Constituição Federal brasileira de 1988 apresenta o Brasil, pela Assembleia Nacional Constituinte, como um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.

Em tempo: a eleição para a sucessão do Presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, acontecerá no começo de 2025 e o escolhido para ser seu sucessor é o deputado Elmar Nascimento.

Referências
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 10ª edição. São Paulo: Malheiros, 1988.
BRASIL, Constituição Federal 1988. Brasília: Senado Federal, 2018.
VASCONCELOS, Pedro Carlos Barbosa de. Teoria Geral do Controlo Jurídico do Poder Público. Lisboa: Edições Cosmos, 1996.
WOLKMER, Antonio Carlos (Org.) Introdução à história do pensamento político. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.

As informações e opiniões contidas no texto são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo obrigatoriamente o pensamento e a linha editorial deste site de notícias.


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