Projeto que equipara aborto a homicídio é inconstitucional e coloca o Brasil na direção do retrocesso

 
No início de 2006, alertamos para o perigo que à época representava o avanço da bancada evangélica no Congresso Nacional, movimento que em pouco tempo atropelaria a liberdade e os direitos individuais do cidadão, empurrando o País na direção do retrocesso. Naquele momento, destacamos que em um Estado laico nenhuma corrente religiosa pode ter prevalência sobre as demais.

Quase dezenove anos depois, o Brasil assiste passivamente ao “rolo compressor” da bancada evangélica no Parlamento, com a imposição criminosa de uma pauta de costumes que atenta contra o direito da dignidade humana.

Na noite de quarta-feira (12), Câmara dos Deputados aprovou de forma simbólica e rasteira o regime de urgência para o Projeto de Lei nº 1.904/24, que equipara o aborto de gestação acima de 22 semanas ao homicídio, aumentando de dez para 20 anos a pena máxima para quem fizer o procedimento. Os projetos com urgência podem ser votados diretamente no Plenário, sem ser submetido à apreciação das comissões temáticas permanentes da Câmara.

A manobra escusa para aprovar o regime de urgência de maneira meteórica, sem que a votação tivesse sido anunciada, foi mais uma manobra escusa do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que busca na bancada evangélica apoio para fazer seu sucessor no comando da Casa legislativa.

O texto fixa em 22 semanas de gestação o prazo máximo para abortos legais. Atualmente, a lei em vigor permite o aborto nos casos de estupro, de risco de vida à mulher e de anencefalia fetal (quando não há formação do cérebro do feto). Não há no Código Penal definição de tempo máximo de gestação para o aborto legal.

O aborto não previsto em lei é punido com penas que variam de um a três anos, quando provocado pela gestante ou com seu consentimento, e de três a dez anos, quando quem provocar um aborto sem o consentimento da gestante.


 
A pena máxima prevista para esses casos passa a ser de 20 anos nos casos de abortos cometido acima das 22 semanas de gestação, idêntica à punição para homicídio simples prevista no artigo 121 do Código Penal.

Absurdo, o projeto em questão é condescendente com o estuprador, cuja pena máxima é de 10 anos de prisão, ou seja, o criminoso será punido com pena menor do que a prevista às vítimas.

O projeto de autoria do deputado federal Sóstenes Cavalcante é uma retaliação ao Supremo Tribunal Federal (STF), mais precisamente ao ministro Alexandre de Moraes, que recentemente decidiu em caráter liminar ser inválida regra instituída pelo Conselho federal de Medicina para abortos previstos em lei.

No caso de ser aprovado nas duas Casas legislativas (Câmara e Senado), o projeto certamente será derrubado pelo STF com base na garantia da dignidade da pessoa humana, explicitada no artigo 1º da Constituição Federal de 1988.

É preocupante a não manifestação da sociedade brasileira diante de escárnio legislativo proposto por fundamentalistas religiosos, que tentam impor à população crenças e valores, em claro desrespeito ao Estado Democrático de Direito.

Por outro lado, causa espécie o silêncio do governo do presidente Luiz Inácio da Silva em relação ao tema, apenas porque o Palácio do Planalto procura evitar frente de confronto com a bancada evangélica.

É notório que a maioria do Congresso Nacional está empenhada em inviabilizar o governo Lula, que dia após dia é emparedado por políticos desqualificados que usam o mandato parlamentar para chantagear o Executivo, cobrando contrapartidas criminosas em troca de apoio.


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