(*) Gisele Leite
Sem dúvida, 2024 figura como um ano em que o Supremo Tribunal Federal mais autuou na defesa da democracia brasileira e dos poderes constituídos da República diante de aventuras autoritárias e golpistas.
Como guardião do texto constitucional brasileiro, merece ter o seu papel reconhecido na defesa de democracia. Enfim, nem o medo, nem o discurso de ódio, a mentira e a vileza de certos capitais políticos poderão fazer fenecer a democracia pátria.
Assistimos a progressiva fragilização dos espaços e sentidos da democracia e da relação de pertencimento da sociedade com o pacto civilizatório.
Atos de violência objetivaram, para além de mero inconformismo com o processo eleitoral que elegeu o atual Presidente da República, e procurou implementar um golpe de Estado, abolindo o Estado Democrático de Direito.
Tudo foi desnudado pelo STF e com a relatoria do Ministro Alexandre de Moraes. A busca da devida responsabilização dos atos antidemocrático e contundente deve trilhar a trajetória da nossa jurisdição constitucional por diversos outros aspectos.
Lembremos que em abril o STF exarou que a missão institucional das Forças Armadas na defesa da pátria, na garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem não acomoda o exercício de um poder moderador entre os Poderes constituídos (ADI 6.457DF).
Nesse mesmo abril, o STF decidiu que a busca pessoal sem mandado judicial deverá estar fundada em elementos indiciários objetivos de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, orientação sexual, cor da pele ou aparência física (HC 208.240/SP).
Em maio, o STF decidiu que constitui assédio judicial comprometedor da liberdade de expressão atentatório à atividade jornalista o ajuizamento de inúmeras ações a respeito dos mesmos fatos, em comarcas diversas, com o intuito de constranger jornalista ou órgão de imprensa, dificultar sua defesa ou torná-la excessivamente onerosa (ADI 6.702/DF e ADI 7.055/DF).
E ainda se decidiu que é inconstitucional a prática de desqualificar a mulher que foi vítima de violência durante a instrução e o julgamento de crimes contra a dignidade sexual e todos os crimes de violência contra a mulher, proibindo-se eventual menção, inquirição ou fundamentação sobre vida sexual pregressa ou o modo de vida da vítima em audiências e decisões judiciais (ADPF 1.107/DF).
Em julho, a Corte Suprema decidiu que não comete infração penal quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo para consumo pessoal, a substância cannabis sativa, sem prejuízo do reconhecimento da ilicitude extrapenal da conduta (Tema 506 RG).
Em outubro, o STF decidiu que o Ministério da Saúde em observância aos direitos à dignidade da pessoa humana à saúde e à igualdade deve garantir atendimento médico para pessoas transexuais e travestis, de acordo com suas necessidades biológicas e acrescentar termos inclusivos para englobar a população transexual na Declaração de Nascido Vivo de seus filhos. (ADPF 787/DF).
No mesmo mês, a Suprema Corte decidiu que o dolo é necessário para a configuração de qualquer ato de improbidade administrativa, sendo inconstitucional a modalidade culposa de ato de improbidade administrativa prevista pela Lei de Improbidade de 1992.
Ademais, o Supremo, nesse mesmo julgamento, decidiu que a contratação direta de serviços advocatícios pela Administração Pública, por inexigibilidade de licitação, além demandar procedimento administrativo formal, requer notória especialização profissional, natureza singular do serviço, inadequação da prestação do serviço pelos integrantes do poder público, cobrança de preço compatível com a responsabilidade profissional, observado, igualmente, o valor médio cobrado pelo escritório de advocacia contratado em situações similares anteriores (Tema 309 RG, RE 656.558/SP).
Em novembro, o STF decidiu que é constitucional, por não ter violado o devido processo legal legislativo, a revogação, pela Emenda Constitucional nº 19/1998, da redação original do artigo 39 da Constituição, que previa, no âmbito da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, a instituição de regime jurídico único para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas (ADI 2.135/DF).
É constitucional, por não ter violado o devido processo legal legislativo, a revogação, pela Emenda Constitucional nº 19/1998, da redação original do artigo 39 da Constituição, que previa, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, a instituição de regime jurídico único para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas (ADI 2.135/DF).
Enfim, foi um ano de bastante trabalho do STF para permitir não somente a concretização dos direitos fundamentais, mas, principalmente, garantir a defesa da democracia e da cidadania brasileira.
(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.
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