Prosseguimento da ação contra Ramagem por três crimes

(*) Gisele Leite

A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria em 9.5.2025 para contrariar a decisão da Câmara dos Deputados que determinou a suspensão da Ação Penal (AP) 2.668 em face do deputado Alexandre Ramagem que é integrante do Núcleo 11 da trama golpista que culminou nos atos de oito de janeiro de 2023.

Votaram pelo parcial prosseguimento da ação contra Ramagem os Ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Flávio Dino. A Ministra Cármen Lúcia e o Ministro Luiz Fux têm até 13.5 para votar. Recentemente, em 26.3 Ramagem se tornou réu por cinco crimes, a saber: organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave violência contra o patrimônio da União e, deterioração de patrimônio tombado.

Na mesma ocasião, a Primeira Turma do STF igualmente aceitou a denúncia contra os demais integrantes do Núcleo 1, tais como: Bolsonaro, Mauro Cid, Walter Braga Netto que se encontra preso e fora ex-ministro e vice de Bolsonaro na chapa de eleições de 2022, Augusto Heleno, Anderson Torres, Almir Garnier e Paulo Sérgio Nogueira.

O quórum do Plenário da Câmara de Deputados decidiu em sete de maior do corrente ano, com o voto de trezentos e quinze votos favoráveis, e cento e quarenta e três votos contrários e quatro abstenções para suspender a ação contra o congressista. E, fundamentaram a decisão no artigo 53, terceiro parágrafo da vigente Constituição Federal brasileira.

De acordo com o Regimento Interno do STF, a sustação de processo contra congressistas por alguma das casas legislativas deve ser analisada pelo colegiado competente para a ação. Por essa razão, o Presidente da Primeira Turma do STF, Ministro Zanin convocou a sessão virtual extraordinária com o fito de decidir sobre a aplicabilidade do dispositivo constitucional ao caso de Ramagem.

O Ministro relator da ação penal, Alexandre de Moraes votou por reconhecer positivamente, até o término do mandato de Ramagem, a validade da decisão da Câmara dos Deputados para os crimes praticados depois da diplomação de deputado.

Ressalte-se que o texto recém aprovado pelo Congresso Nacional ao editar a Emenda Constitucional 35/2001 somente admite a possibilidade de suspensão da ação penal contra parlamentar quando o STF receber denúncia por crime que o próprio tribunal reconhecer como praticado depois da diplomação, conforme justificou Ministro Alexandre de Moraes.

Assim, Ramagem somente deixa de responder pelos crimes de dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado. Quanto aos demais crimes o STF dá continuidade ao processo.

O Ministro relator fora acompanhado integralmente por Zanin. Já o Ministro Flávio Dino somou mais duas ressalvas ao Ministro de Alexandre de Moraes. Pois sugeriu que o STF separe do processo principal os dois crimes afetados pela decisão da

Câmara dos Deputados. Restando garantido o prosseguimento norma da ação penal quanto os demais crimes atribuídos a Ramagem e quanto aos outros réus. E, também entendeu que a suspensão da ação e da prescrição deve ter validade até o término do presente mandato e que, caso Ramagem seja preso ou afastado da função, a referida suspensão deixará de prosseguir.

O termo a quo de incidência das citadas disposições constitucionais, particularmente, no presente caso, do artigo 53, §3ª da CF/1988 é o momento da diplomação. Pois é esta que atesta que o candidato foi efetivamente eleito, instituindo-se, a partir de então, o vínculo jurídico entre parlamentar-representante e aqueles por ele representados.

A diplomação constitui a derradeira fase do processo eleitoral, sendo sacramentados, por meio desta, os resultados das eleições. Não há de se cogitar em atribuição da Casa Legislativa para buscar suspender ação penal quanto aos crimes supostamente praticados por parlamentar antes da diplomação.

O contrário resultaria na insustentável e ilógica conclusão de que o “Estatuto dos Congressistas” que destina-se a criar condições para o exercício da atividade parlamentar se aplica a não parlamentares, explicitou Ministro Dino em seu voto.

Já o Ministro Relator em seu voto apontou que a Resolução 18 de 2025 da Câmara dos Deputados é inaplicável em relação aos corréus Garnier Santos, Anderson Torres, Augusto Heleno, Jair Messias Bolsonaro, Mauro César Barbosa Cid, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira e Walter Souza Braga Netto, nos termos do terceiro parágrafo do artigo 53 da CF/1988, devendo a AP 2668 prosseguir integralmente em relação a todos os crimes constantes na decisão de recebimento da denúncia.

Enfim, a decisão recente da Câmara dos Deputados é inócua e não suspenderá ação penal contra Ramagem. Resta evidente que o Legislativo só tem poder para travar ação penal de crimes cometidos depois da diplomação do parlamentar e apenas em relação a este. Recorde-se que o enunciado da Súmula 245 do STF, por outro lado, já decidiu que a imunidade parlamentar não pode ser estendida a outros réus na mesma ação penal. Não podendo beneficiar, desta forma, o ex-presidente Bolsonaro e seus ex-ministros e corréus.

Segundo a avaliação dos Ministros do STF, o atual presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta também sabe que a resolução é inconstitucional, mas colocou a medida em votação porque fora muito pressionado pelos bolsonaristas após de ter barrado o projeto da anistia aos golpistas de oito de janeiro de 2023.

Cumpre sublinhar a relevância de que os três poderes da República (Legislativo, Executivo e Judiciário) devem atuar de forma independente, harmônica e equilibrada, garantindo a separação de funções e a fiscalização mútua para evitar abusos de poder. O objetivo é construir um Estado Democrático de Direito, onde a lei e a justiça prevalecem.

(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.

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