(*) Gisele Leite
O contundente depoimento do tenente-brigadeiro Baptista Júnior, ex-comandante da FAB (Força Aérea Brasileira) foi o oposto do comportamento evasivo do general Freire Gomes, no depoimento ao STF. O militar, além de enfático, foi firme em confirmar que o ex-Presidente da República atuou para impedir a posse de Lula no Palácio do Planalto e que a negativa por parte das Forças Armadas de aderir à trama golpista foi crucial para que não se materializasse qualquer ruptura democrática no país.
O militar ainda confirmou que houve ameaça de prisão por parte do general Freire Gomes ao então presidente Jair Bolsonaro, caso ele insistisse em continuar no poder. O tenente-brigadeiro não soube precisar ao certo a data, mas disse que o ato ocorreu em reuniões entre o dia 1º e 14 de novembro de 2022, em encontros em que estavam Bolsonaro, o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira e os três comandantes das Forças Armadas, no Palácio do Alvorada.
Baptista Júnior disse “não ser simples” esquecer a ameaça de prisão de um general ao Presidente da República. Contudo, ele não confirmou que Freire Gomes tenha emitido uma voz de prisão.
Também confirmou que o almirante Almir Garnier Santos, então comandante da Marinha brasileira, colocou as tropas à disposição de Bolsonaro. “Em uma das reuniões ele disse que as tropas da Marinha estavam à disposição do presidente”. Tanto assim, ele soube que a Marinha tinha quatorze mil fuzileiros. Disse ainda que a postura dos três comandantes em relação à tentativa de golpe era conhecida nas Forças Armadas.
Narrou o depoente que foi ficando “desconfortável” com as reuniões marcadas pelo ex-presidente com o ministro da Defesa e os chefes das Forças Armadas no Alvorada após as eleições de 2022.
Narrou que esteve pelo menos cinco vezes no Palácio da Alvorada em novembro, após Jair Bolsonaro perder as eleições para Lula, mas foi sentindo que o tom dos debates sobre Estado de Sítio, Estado de Defesa ou decreto para Garantia da Lei e Ordem (GLO) caminhava para impedir a assunção de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República e não para manter a ordem de um país dividido.
Baptista Júnior disse que, na reunião do dia 14 de novembro de 2022, o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio apresentou a minuta golpista. O militar descreveu com precisão que ao chegar no Alvorada, Garnier estava de costas, Paulo Sérgio, de lado, Freire Gomes, de frente.
Assim que começou a reunião, Paulo Sérgio disse: “trouxe um documento para vocês verem”. O documento estava na mesa e dentro de um plástico. Ele perguntou se o texto previa a não assunção do presidente eleito e recebeu um silêncio como resposta, o que interpretou com um sinal positivo. Na sequência, o militar disse: “Não admito sequer receber esse documento, levantei e fui embora”.
Depois que se opôs à minuta golpista, sofreu pressões e ataques contra ele e a família e que a fonte dos ataques era o general Braga Netto e toda a situação foi “difícil”.
Ressaltou que foi chamado de “melancia” [em referência a ser vermelho, cor associada ao PT, por dentro]. O ex-chefe da FAB disse que um dos incômodos com os rumos das conversas no Alvorada veio quando foi aventada a possibilidade da prisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF.
Outro ponto de desconforto veio quando Bolsonaro disse na porta do Alvorada que teria apoio das Forças Armadas frente a medidas necessárias para manter a ordem no Brasil.
Baptista Júnior disse que sempre houve a convicção de que não havia fraudes nas urnas eletrônicas dentro das Forças Armadas e que Bolsonaro sabia dessa informação.
O militar disse que a única retificação que faria em relação ao seu depoimento na PF é que Anderson Torres não participou das reuniões com o presidente e os comandantes das Forças Armadas.
Enfim, Baptista Júnior é testemunha de acusação e de alguns réus na ação sobre o núcleo um da trama golpista, em que Bolsonaro é um dos réus.
O depoimento começou às 11h30 da manhã e durou cerca de uma hora e meia. Baptista Júnior foi interrogado pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, na condição de acusador e autor da ação penal, e ouvido pelos advogados de defesa dos réus do chamado Núcleo 1 ou Núcleo Crucial da articulação golpista.
Integram o rol de acusados na AP que investiga a trama golpista o ex-presidente da República Jair Bolsonaro, o ex-comandante da Marinha Almir Garnier dos Santos, o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem, o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, o ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid e o ex-ministro da Casa Civil e da Defesa Walter Braga Netto.
Todos eles respondem por cinco crimes: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Diante das provas documentais já existentes nos autos e as testemunhais, como essa, a prisão iminente do ex-presidente da República parece ser uma perspectiva concreta.
(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.
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