Mergulhado em um oceano de problemas, o Brasil ainda acredita no jornalismo que trata as questões políticas – na verdade são policiais – como se fossem ingredientes de um desses decadentes “reality shows”. No afã de conseguir elevar a audiência e prender a atenção da população, boa parte da imprensa nacional dedicou-se nos últimos dias a divulgar informações insossas e descabidas acerca do empresário Eike Batista, preso pela Polícia Federal ao desembarcar de um voo vindo de Nova York.
O ponto alto das desconexas reportagens foi o fato de Eike ter sido obrigado a raspar o cabelo, como se isso pudesse resolver os problemas do País ou decifrasse mais um capítulo do maior esquema de corrupção de todos os tempos. Raspar o cabelo de um detento faz parte das regras do sistema prisional, o que não representa condenação ou punição. Contudo, diante da falta do que noticiar, ate a cabeça pelada do ex-bilionário virou manchete. Trata-se de um desrespeito ao consumidor de informação, pois a situação do país continua a mesma, apenas com um detalhe extra: um presidiário a mais em meio a centenas de milhares.
Outro grave desrespeito à opinião pública foi noticiar a possibilidade de Eike Batista fazer delação em seu primeiro depoimento à Polícia Federal. Antes de tudo, acordo de colaboração premiada é assunto de competência do Ministério Público e que depende de homologação por parte do Judiciário. Ou seja, falar em delação a essa altura dos acontecimentos é no mínimo irresponsabilidade jornalística.
Para quem vem acompanhando o desenrolar da Operação Lava-Jato, que está em cena desde março de 2014, delação premiada não é assunto tão fácil e corriqueiro quanto comprar pipoca na esquina mais próxima. Trata-se de algo complexo e que demanda tempo de investigação para confirmar as informações repassadas previamente pelo delator.
Por mais que a intenção de Eike Batista seja a de contar o que sabe sobre o esquema de corrupção comandado pelo ex-governador Sérgio Cabral Filho, do Rio de Janeiro, que desde novembro de 2016 encontra-se preso no Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, é preciso muito tempo para que isso ocorra. O empresário terá de depor à Justiça e, vencidas algumas etapas, será possível pensar em eventual acordo de colaboração. Até que isso ocorra, Eike terá de redobrar a paciência e esperar pelo momento certo.
Alguém há de afirmar que a fala do empresário, ainda no aeroporto de Nova York, antes de embarcar com destino ao Rio de Janeiro, sinalizou seu desejo de contar a verdade, mas isso não significa que as negociações para uma possível colaboração com a Justiça são favas contadas e que a mesma será bem sucedida. É fato que Eike tem muitas informações sobre o esquema criminoso que, na melhor das hipóteses, desviou US$ 100 milhões dos cofres públicos, porém é preciso continuar acreditando que o tempo é o senhor da razão e que o consumidor de informação não merece a fanfarronice da imprensa verde-loura.