MPF questiona prisão de brigadistas de ONG que atua em Alter do Chão, no Pará, no combate a incêndios

O Ministério Público Federal (MPF) em Santarém (PA) pediu explicações à Polícia Civil do Pará sobre o motivo da prisão de membros da Brigada Alter do Chão, ONG que atua no combate a incêndios na região desde 2018. Os brigadistas foram acusados de provocar queimadas que destruíram em setembro parte de uma Área de Proteção Ambiental (APA) em Santarém, com o intuito de atrair doações de entidades ambientalistas.

O MPF divulgou nota, na quarta-feira (28), afirmando que no inquérito da Polícia Federal, em curso desde setembro, “nenhum elemento apontava para a participação de brigadistas ou organizações da sociedade civil.”

“Ao contrário, a linha das investigações federais, que vem sendo seguida desde 2015, aponta para o assédio de grileiros, ocupação desordenada e para a especulação imobiliária como causas da degradação ambiental em Alter”, ressalta a nota.

Os procuradores enviaram ofício à Polícia Civil do Pará pedindo acesso ao inquérito. As investigações ainda não foram concluídas, mas quatro membros da Brigada foram presos preventivamente, acusados de iniciar os incêndios florestais na região.

O delegado José Humberto Melo Jr., da Polícia Civil, acusa membros de três ONGs locais – Brigada Alter do Chão, Aquíferos Alter do Chão e Projeto Saúde e Alegria (PSA) – de receberam repasses da ONG internacional WWF para combater os incêndios. Só que, de acordo com o delegado, parte dos recursos teria sido desviada.

Melo Jr. diz ter localizado um vídeo que mostra os brigadistas ateando fogo em um ponto da floresta. As imagens, que segundo o delegado teriam sido postadas no Youtube e depois retiradas, serviram de base para que a polícia pedisse a quebra de sigilo telefônico dos quatro voluntários. Um deles é funcionário da ONG Saúde e Alegria e voluntário da Brigada, que surgiu de uma iniciativa do Instituto Aquífero.

“Conseguiram logo após esse incêndio um contrato com a WWF, inclusive eles venderam 40 imagens para a WWF ao custo de R$ 70 mil para uso exclusivo. E com essas imagens, a WWF conseguiu financiamentos, inclusive doações a título de exemplo, do ator Leonardo DiCaprio, que doou 500 mil dólares para a WWF auxiliar essas ONGs no combate às queimadas na Amazônia”, afirmou o delegado.

A WWF Brasil informou, em nota, que, de fato, fez um repasse de R$ 70 mil para a Brigada de Alter do Chão, mas afirma que o total foi destinado à compra de equipamentos para combate ao fogo. A ONG assegura que nunca comprou qualquer imagem ou fotografia e ainda negou que tenha recebido alguma doação do ator americano. “Tais informações que estão circulando são inverídicas”, diz o comunicado.

Para justificar as prisões, a Polícia Civil divulgou onze áudios de interceptações telefônicas. Em um deles, um dos brigadistas teria assumido que estaria por trás dos incêndios criminosos, dando a impressão de que o fogo teria surgido de uma ação coordenada. A polícia considera esta uma das “provas robustas” que justificaram as prisões preventivas.

“Não vi nada que incriminasse os brigadistas. Só conjecturas”, afirmou José Ronaldo Dias Campos, advogado de Gustavo de Almeida Fernandes, um dos brigadistas presos. “Estamos trabalhando para revogar a insubsistente prisão preventiva dos brigadistas, que acreditamos injusta”, afirmou.


Em nota, o Instituto Aquífero alertou que “os trechos de áudio de um brigadista voluntário que foram vazados para a imprensa estão sendo disseminados sem a devida contextualização”.

A Polícia Civil afirma que a ONG Saúde e Alegria, que atua há mais de 30 anos no Pará, “emprestou” o CNPJ para o Instituto Aquífero, para viabilizar o recebimento de doações. Caetano Scannavino, diretor da ONG, negou o empréstimo de documentos ou dados para o repasse de dinheiro. Ele diz que sua entidade é parceira na formação de brigadistas e apoia as iniciativas da brigada.

O MPF ressalta que há diversos interesses em jogo na região. “Por se tratar de um dos balneários mais famosos do país, a região é objeto de cobiça das indústrias turística e imobiliária e sofre pressão de invasores de terras públicas”, afirma a nota dos procuradores.

A Brigada afirma estar “em choque” com a prisão de seus voluntários e afirma contribuir desde o início das investigações com informações e documentos. A defesa dos voluntários afirma que não há base para a prisão preventiva, uma vez que os quatro detidos possuem emprego e residência fixa, além de não terem antecedentes criminais.

Irresponsabilidade e oportunismo de Bolsonaro

Presidente da República, Jair Bolsonaro tem personalidade dual, pois de forma simultânea admite publicamente ser despreparado em diversas áreas e tenta vender a falsa ideia de ser o último gênio da raça.

Denunciado ao Tribunal Penal Internacional, com sede em Haia (Holanda), por incitação ao genocídio de povos indígenas e crimes contra a humanidade, Bolsonaro continua refém dos ruralistas, o que o obriga a fazer declarações absurdas, algo que o UCHO.INFO classifica como contrapartida espúria ao apoio recebido durante a corrida presidencial de 2018.

Na quarta-feira (27), ao participar, na capital amazonense, da cerimônia de abertura da Feira de Sustentabilidade do Polo Industrial de Manaus (Fespim), o presidente disparou contra as ONGs, tendo por base a decisão da Justiça de determinar a prisão dos brigadistas acusados irresponsavelmente de atear fogo na floresta, em Alter do Chão (PA).

“Aos poucos, a verdade aparece. Há dois meses falei que a questão das queimadas eram patrocinadas sim por ONGs. Eu conheço essa raça. Tirando as exceções, eu conheço esse pessoal”, disse Bolsonaro. Esse discurso irresponsável ecoa declaração por ocasião do ápice das queimadas, quando o presidente culpou as ONGs pelos diversos focos de incêndio que consumiram boas extensões florestais.

Ninguém tem dúvidas acerca do oportunismo rasteiro e do palavrório boquirroto de Jair Bolsonaro, mas se a Polícia Federal, em inquérito, não identificou qualquer prova que pudesse incriminar os brigadistas, o presidente deveria ater-se ao silêncio e à própria ignorância, sem se deixar levar pela necessidade de se apresentar ao mundo como falso gênio. Diante desse cenário, o mínimo que um cidadão de bom senso pode fazer é concluir que no Palácio do Planalto existe um irresponsável com todas as letras, assessorado por pessoas igualmente incompetentes.

Bolsonaro insiste em fermentar o discurso de ódio, a cizânia da sociedade e o revanchismo ideológico, como se a Constituição não o obrigasse a governar para todos os brasileiros, sem distinção de qualquer natureza. Fossem os políticos brasileiros dotados de doses rasas de coragem, o presidente da República já estaria no centro de um processo de impeachment. Contudo, os interesses canhestros e a conivência espúria impedem que isso ocorra. (Com agências de notícias)