Indicado ao STF, Kassio Marques erra ao afirmar que prisão em segunda instância depende do Congresso

 
Indicado para vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) que será aberta com a aposentadoria compulsória do decano Celso de Mello, que completará 75 anos em 1º de novembro próximo, o desembargador Kassio Nunes Marques, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), disse a um grupo de senadores que a decisão sobre a prisão após condenação em segunda instância é de responsabilidade do Congresso Nacional.

O próximo ministro do STF tem o direito de dedicar doses de sabujice aos senadores que irão sabatiná-lo na Comissão de Constituição e Justiça e em seguida aprovarão a indicação no Plenário do Senado, mas beira a irresponsabilidade demonstrar desrespeito à Constituição.

Em seu artigo 5º, inciso LVII, a Carta Magna é clara ao estabelecer que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Tomando por base que o artigo 5º é cláusula pétrea, qualquer alteração no entendimento do enunciado depende de uma nova Constituição.

Entende-se como “trânsito em julgado” uma decisão judicial – ou acórdão – da qual não se pode mais recorrer, seja porque não mais existem recursos possíveis, seja por decurso de prazo, seja por acordo homologado por sentença entre as partes. Sendo assim, o Supremo continua sendo a última instância da Justiça a que qualquer condenado em instâncias inferiores pode recorrer.

Afirmar que a prisão em segunda instância depende de decisão do Parlamento tem dupla interpretação. A primeira delas é que a feitura de uma nova Carta depende da realização de Assembleia Constituinte, o que remete à participação dos congressistas. Por esse prisma, a declaração de Kassio Marques está correta, o que não significa que isso acontecerá no curto prazo.

No contraponto, sob a ótica dos salamaleques disparados na direção dos senadores, trata-se de ziguezague interpretativo da legislação vigente no País, pois não se pode, de acordo com as regras atuais, decretar a prisão de um condenado sem o devido trânsito em julgado. Ou seja, se o futuro ministro do Supremo intentou agradar aos congressistas, escolheu a pior maneira possível, pois nada nem ninguém está acima da Constituição.

Faz-se necessário ressaltar que não se pode alterar o entendimento acerca de trânsito em julgado apenas porque fermenta no seio da sociedade a crença no punitivismo como forma de solucionar os muitos problemas que corroem o País.

A defesa que parte da sociedade faz da condenação a qualquer preço, em nome de ideologias, desrespeitando a legislação e ignorando os direitos do réu, se esvai no momento em que os mesmos que defendem essa arbitrariedade são alçados à mira da Justiça.

É importante lembrar a esses ignaros afoitos, sempre movidos pelo revanchismo ideológico, que sonegação tributária – prática comum no Brasil – é crime que pode culminar com prisão. Nesse caso, os defensores da punição a esmo mudam de ideia, já que alegarão ser necessário aguardar o trânsito em julgado.

Que ninguém, ao arrepio da Constituição, agarre-se a bamboleios interpretativos da lei na tentativa de mudar o que está sacramentado, induzindo a opinião pública a erro ao vender a falsa teria de que após determinada instância judicial os recursos são procrastinatórios. Caso alguém discorde do que define a Carta, que encabece um movimento para nova Constituinte.

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O grande problema do Brasil, assim como em diversos países, é que as autoridades tomam decisões sempre de olho na plateia. Ao que parece, Kassio Marques fez tal declaração tentando agradar seus sabatinadores. Triste Brasil!

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