(*) Waldir Maranhão
Uma possível aliança entre o ex-presidente Lula e o ex-governador Geraldo Alckmin ganhou maior visibilidade com o jantar organizado pelo grupo “Prerrogativas” (advogados antilavajatistas), em São Paulo, do qual participaram políticos de várias legendas e empresários de diversos setores. O cardápio do evento foi o cálculo político para a formação de uma chapa capaz de derrotar o presidente Jair Bolsonaro, que sonha com a reeleição, mas enfrenta crescente resistência por muitos segmentos da sociedade.
Alckmin, que recentemente deixou o PSDB, partido que com o passar dos anos foi perdendo a essência ideológica, a socialdemocracia, ainda não decidiu a qual partido se filiará. O ex-governador de São Paulo tem até o fim do primeiro trimestre de 2022 para decidir. Apesar desse tempo, o ex-governador de São Paulo precisa tomar uma decisão o quanto antes, sob pena de inviabilizar um acordo político-eleitoral capaz de tirar o Brasil do atraso.
Extremamente habilidoso no campo da política, o ex-presidente Lula busca uma aliança partidária que garanta sua vitória nas urnas, talvez no primeiro turno, como demonstram as recentes pesquisas eleitorais. Esse agrupamento de legendas mira não apenas partidos de esquerda, mas também os de centro e de centro-direita. Quem duvida dessa aliança não soube interpretar o fato mais importante do mencionado jantar na capital paulista: a verdadeira aquarela partidária presente ao evento.
O concorrido encontro, que deixou muitos de fora, contou com a participação de Gilberto Kassab e Omar Aziz, do PSD; Baleia Rossi e Renan Calheiros, do MDB; Paulo Pereira da Silva (Paulinho da Força), do Solidariedade; Marcelo Freixo, do PSB; Randolfe Rodrigues, da Rede; Luciana Santos, do PCdoB; Rodrigo Maia (sem partido) e outros nomes da política nacional. Esse cenário mostra que não se deve descartar uma coalizão capaz de derrotar Bolsonaro na próxima corrida presidencial.
Esse enxadrismo político-eleitoral não é tão simples quanto sugere a foto de Lula e Alckmin, já que qualquer acordo visando a eleição presidencial de 2022 passa obrigatoriamente pelos estados. Isso significa que a tarefa de alcançar um consenso não será tarefa fácil. O melhor exemplo de aresta a ser aparada encontra-se em São Paulo, onde a disputa pelo governo local contrapõe o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) e o ex-governador Márcio França (PSB), que em cenário sem a participação de Alckmin brigam pelo direito de se instalar no Palácio dos Bandeirantes.
Kassab, presidente do PSD, garante que o candidato do partido à Presidência é Rodrigo Pacheco (MG), presidente do Senado que até pouco tempo defendia alguns interesses de Bolsonaro no Parlamento e empenhou-se para manter as escandalosas emendas do chamado “orçamento secreto”. Baleia Rossi, presidente nacional do MDB, pode ter rifado a candidatura da senadora Simone Tebet com sua participação no mencionado jantar. Sérgio Moro, ex-juiz da Lava-Jato e ex-ministro de Bolsonaro, continua patinando em uma candidatura que agrada apenas aos seus.
Além desse quebra-cabeças, que não é de fácil solução, há também um ingrediente que não pode ser desconsiderado: os índices de rejeição dos pré-candidatos. Aliás, os percentuais de rejeição merecem muito mais atenção do que os índices de intenção de voto. Até porque o primeiro pode comprometer o segundo.
Ex-governador do Ceará, Ciro Gomes (PDT) não participou do jantar organizado pelo “Prerrogativas”, que batizou o evento como “Jantar pela Democracia”, assim como o seu entorno foi citado nas conversas que marcaram a noite do último domingo. Porém, é importante colocar no radar um possível acordo com o pedetista, que desde sua aparição como presidenciável vem atacando Lula de maneira insistente. A Operação Colosseo, deflagrada há dias pela Polícia Federal, mirou Ciro e seu irmão Cid Gomes, mesmo que a decisão que autorizou a investida policial seja desprovida de aceitabilidade, uma vez que aconteceu dez anos após o início da respectiva investigação.
Publicamente, os pedetistas saíram em defesa de Ciro Gomes, mas nos bastidores cresce o entendimento de que o ex-governador cearense deveria desistir da sua pré-candidatura ao Palácio do Planalto. Caso essa aludida desistência se confirme, é preciso encontrar espaço político-eleitoral para acomodar Ciro Gomes, que, se abandonado, pode causar estragos em todas as frentes. Em outras palavras, é melhor ter o inimigo por perto e sob controle.
A grande questão está em como valorizar o capital político de Ciro Gomes – foi bem votado na eleição de 2018 – a ponto de possibilitar possível desistência no campo da disputa presidencial. Empacado no segundo pelotão das pesquisas eleitorais, Ciro olha à distância a polarização que tem na dianteira Lula e Jair Bolsonaro. Esse quadro mostra de forma clara que uma candidatura de terceira via ainda não amadureceu, talvez fique no universo do imaginário. Por isso é importante atrair Ciro para o pretendido arco de alianças, sem esquecer da devida contrapartida ao político cearense.
Pesquisas eleitorais são um retrato do momento, mas com o aperfeiçoamento constante dos levantamentos estatísticos os resultados têm se aproximado cada vez mais da realidade revelada pelas urnas. Até a disputa pela Presidência da República entrar no palco do cotidiano do brasileiro, o presidente Jair Bolsonaro, que continua com a caneta na mão, era unanimidade, pelo menos entre seus apoiadores.
Sendo assim, não posso deixar de sugerir a Bolsonaro a interpretação da célebre frase do genial e saudoso Nelson Rodrigues: “Toda unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade não precisa pensar”. O presidente da República pensou até recentemente com a unanimidade, mas acordou tarde demais para mirar os céus da inteligência política.
(*) Waldir Maranhão – Médico veterinário e ex-reitor da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), onde lecionou durante anos, foi deputado federal, 1º vice-presidente e presidente da Câmara dos Deputados.
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