O CEO global do Carrefour, Alexandre Bompard, pediu desculpas formais ao governo brasileiro seis dias após anunciar um boicote da sede francesa do grupo às carnes provenientes do Mercosul e disse que a carne brasileira tem “alta qualidade”.
“Se a comunicação do Carrefour França gerou confusão e pode ter sido interpretada como questionamento de nossa parceria com a agricultura brasileira e como uma crítica a ela, pedimos desculpas”, escreveu em carta endereçada ao ministro da Agricultura, Carlos Fávaro.
Na nota, o executivo disse que a operação brasileira da rede varejista continuará a comprar carne de agricultores do Brasil, mas reafirmou que, na França, o produto francês continua tendo prioridade – sem esclarecer, portanto, se voltará a comprar do Mersocul.
“Compramos quase toda a carne que necessitamos para as nossas atividades na França, e assim seguiremos fazendo. A decisão do Carrefour França não teve como objetivo mudar as regras de um mercado amplamente estruturado em suas cadeias de abastecimento locais, que segue as preferências regionais de nossos clientes”, escreveu.
“Do outro lado do Atlântico, compramos dos produtores brasileiros quase toda a carne que necessitamos para as nossas atividades, e seguiremos fazendo assim”, completou sobre as lojas em atividade no Brasil.
“Carne de alta qualidade”
O pedido de desculpas ainda defende a parceira da rede varejista com o Brasil. “O Brasil é o país em que o Carrefour mais investiu sob minha presidência, o que confirma nossa ambição e nosso comprometimento com o país”, disse. Bompard ainda reiterou que a agricultura brasileira “fornece carne de alta qualidade, respeito às normas e sabor”.
A produção da carta foi mediada pelo embaixador francês no Brasil, Emmanuel Lenain, em rodadas de negociação com representantes do Ministério da Agricultura.
Em nota, o Ministério da Agricultura e Pecuária afirmou que recebeu a manifestação de Bompard reconhecendo a “alta qualidade, o respeito às normas e o sabor da carne brasileira”.
“Com um sistema de rigoroso de defesa agropecuária, que posiciona o Brasil como o principal exportador de carne de aves e bovina do mundo, o Mapa reitera os elevados padrões de qualidade, sanidade e sustentabilidade da produção agropecuária brasileira”, escreveu a pasta, reforçando “as boas relações diplomáticas conquistadas pelo governo brasileiro”. O ministério ainda argumentou que trabalha para não permitir que “declarações equivocadas coloquem em dúvida um trabalho de defesa agropecuária de alto nível”.
A citação sobre a qualidade sanitária da proteína bovina produzida no país havia sido uma demanda da pasta, que também queria que o pedido viesse do próprio Bompard, e não de um representante brasileiro. Apesar do pedido de desculpas, o anúncio original do veto segue publicado nas redes sociais do executivo francês.
Carrefour pressiona contra acordo Mercosul-UE
No dia 21 de novembro, o executivo havia informado que a sede francesa do Carrefour não mais compraria carne proveniente dos países do Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai), como forma de pressionar a União Europeia a não formalizar um acordo de livre-comércio com o bloco sul-americano. O CEO justificou que o boicote seria uma forma de apoiar os agricultores franceses que, segundo o executivo, vivem uma “grave crise”.
Na ocasião da decisão, produtores franceses entravam no terceiro dia de protestos massivos contra o acordo costurado entre Mercosul e União Europeia. O medo do setor europeu é que a carne sul-americana entre na Europa sem precisar cumprir as mesmas regras ambientais e sociais demandas aos fornecedores franceses, o que deixaria o produto mais barato. Ecoando estes pedidos, Bompard chegou a dizer que a proteína animal do Mercosul não atende às exigências e normas do mercado francês. Foi este ponto que gerou maior reação do governo brasileiro.
As tratativas entre os blocos para formalizar o acordo nunca saíram do papel, apesar de o texto original ter sido assinado pelas partes em 2019, duas décadas após o início das negociações. A discussão voltou a ganhar força em 2023, quando os europeus apresentaram um protocolo adicional para adaptar o texto às novas exigências ambientais da União Europeia, o que reabriu negociações do lado sul-americano por mais incentivos às indústrias nacionais.
Veto gerou reação de frigoríficos
A retratação de Bompard chega após forte reação do setor produtivo brasileiro ao boicote de seus produtos no mercado francês. Frigoríficos brasileiros como JBS, Marfrig e Masterboi, decidiram parar de fornecer proteína bovina também às lojas brasileiras do Grupo Carrefour, que incluem Atacadão e Sam’s Club, como forma de forçar um desabastecimento da rede no mercado nacional.
A reação foi endossada pela Federação das Associações Rurais do Mercosul (Farm), que disse não aceitar “ataques injustificados” e sugeriu uma reação “firme” contra o grupo. O movimento também foi apoiado por Fávaro.
“Eu estou feliz com a atitude dos nossos fornecedores, se para o povo francês, o Carrefour não serve para comprar carne brasileira, o Carrefour também não compre carne brasileira para colocar nas suas lojas aqui no Brasil”, disse em entrevista à Globo News publicada antes do pedido formal de desculpas de Bompard. “Não é pelo boicote econômico. O problema é a forma com que o CEO do Carrefour tratou, o primeiro parágrafo da carta, da manifestação dele, que fala com relação à qualidade sanitária das carnes brasileiras, que é inadmissível falar”, completou.
Em nota enviada no dia 21 de novembro, operação brasileira do Carrefour afirmou que as operações da empresa no país não seriam impactadas pela decisão de Bompard. Com a reação dos fornecedores, porém, o grupo disse que a “decisão [dos frigoríficos] pela suspensão do fornecimento de carne impacta nossos clientes”. (Com Deutsche Welle e agências de notícias)
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