(*) José Pastore –
Na última reunião do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho (Cert) da Fecomércio de São Paulo, as discussões se iniciaram sobre a possibilidade de o Brasil continuar criando empregos com base no atual modelo que privilegia o consumo- impulsionado por salário, crédito e transferência de renda. Os conselheiros estão divididos. Alguns acham que esse modelo está com os dias contados. Outros acham que o modelo já se esgotou.
Todos concordam que o Brasil conseguiu reduzir a pobreza e promover as classes de renda mais baixa com base na estabilização da moeda, nos aumentos de salário ( em especial do mínimo), na transferência de renda e na expansão do crédito. Em conjunto, essas quatro forças estimularam o consumo e a geração de empregos. A elas se somaram os bons ventos na exportação de commodities.
Mas isso tem fôlego? Em 2011, os juros estavam altos e os consumidores faziam fila para comprar automóveis e motocicletas. Hoje, os juros estão mais baixos, mas as novas prestações não cabem no seu bolso – bastante endividado. O endividamento impôs cautela aos tomadores e fornecedores de crédito. A inadimplência em veículos bateu a casa dos 6%, o dobro de 2011. Os consumidores sumiram das concessionárias.
No caso em tela, a retração de demanda foi agravada pelas despesas que normalmente se acumulam nos primeiros meses do ano – IPTU, IPVA, matrícula escolar e outras. Há, ainda, o fato de que os consumidores da classe C que compraram o seu primeiro veículo há um ou dois anos não têm condições de trocá-lo novamente, mesmo porque devem mais que o valor do bem que possuem.
O esfriamento desse setor preocupa quem acompanha o mercado de trabalho, porque a cadeia de produção de veículos é muito longa e afeta quase toda a indústria e muitos empregos. No primeiro trimestre de 2012, a produção industrial em São Paulo caiu 6%; no Rio de Janeiro, quase 7%. Só aumentou no Nordeste, 4%.
Apesar da existência de uma massa salarial robusta e que pode sustentar um bom nível de emprego até o fim do ano, o quadro em 2013 é incerto. O emprego de amanhã depende do investimento de hoje.
O modelo de crescimento baseado no consumo pouco pode fazer para formar poupança e alavancar os investimentos dos atuais 18% para 22% ou 23% do PIB. A disparada salarial e o aumento dos benefícios têm pressionado (para cima) o custo unitário do trabalho, propelido também por benesses aprovadas por leis, decretos e portarias que encarecem a contratação. Os lucros das empresas caíram 17% no último trimestre, o que afeta o investimento. Este também caiu 2,5% em relação ao último trimestre de 2011. A esse quadro se somam as incertezas advindas do quadro internacional. A China está desacelerando, a Grécia criou o caos na Europa e os Estados Unidos andam de lado. Tudo indica que o Brasil crescerá cerca de 2,5% – o que é pior que o fiasco do ano passado, quando o PIB cresceu apenas 2,7%.
Com investimentos cadentes, não há como antever a sustentação do emprego para os anos futuros. Foi esse tipo de análise que levou os conselheiros do Cert a considerarem o atual modelo de consumo como esgotado ou prestes a se esgotar. Mas, neste ponto, surgiu outra divisão, ainda mais preocupante. Enquanto alguns acreditam na liderança da presidente Dilma para fazer as reformas e tirar o Brasil da trilha do desemprego, outros acham que o modelo não vai mudar, pois é ele que tem garantido preciosos dividendos eleitorais aos governantes de plantão, e assim continuará até a chegada de uma crise profunda.
Embora eu tenha esperança de que as coisas mudem antes de um grave desastre, não ouso desafiar os meus colegas de conselho que conhecem a cultura dos políticos brasileiros melhor do que eu. E você, leitor, acha que um país pode crescer sem investimentos e só com base no consumo?
(*) José Pastore é professor da FEA-USP, membro da Academia Paulista de Letras e Presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomércio de São Paulo. www.josepastore.com.br.