Xadrez da energia – O dragão representa, de acordo com a mitologia chinesa, a energia do fogo e a transformação. E é exatamente assim que a China se comporta se considerado o seu apetite por recursos naturais em qualquer parte do planeta, como é a relação do país com o petróleo. Segunda maior economia global, o gigante asiático tenta intensificar sua aproximação de países como Brasil, Venezuela e Equador com o conhecido objetivo de procurar matérias-primas que garantam as elevadas de crescimento econômico do país e sua consequente segurança energética.
A dependência de Pequim em relação a matérias-primas estrangeiras se nota, por exemplo, nos contínuos créditos chineses trocados por petróleo da Venezuela e do Equador, além do interesse de três estatais chinesas em participar do primeiro leilão do pré-sal brasileiro, marcado para 21 de outubro próximo.
“Como a China chegou ‘atrasada’ à disputa internacional de hidrocarbonetos e as principais reservas de petróleo já estavam sendo exploradas por empresas ocidentais, o país desenvolveu uma estratégia que prioriza a penetração em países onde não há forte competição externa de empresas ocidentais”, afirma Henrique Altemani de Oliveira, professor de relações internacionais da Universidade Estadual da Paraíba. “Assim, ela evita confrontação com os EUA e as potências europeias.”
Por trás da necessidade chinesa de petróleo para ajudar no crescimento econômico existe uma estratégia geopolítica: a obtenção de apoio político de diferentes países sul-americanos. “O apoio político dos países da América do Sul, como também os da África, apresenta-se como um trunfo mais do que importante nos fóruns negociadores internacionais que utilizam o princípio do voto quantitativo. O interesse quanto à América do Sul cresce de importância quando ainda se considera que a região está na área de influência dos EUA”, diz Altemani.
Crédito por petróleo
China e Venezuela têm intensificado a cooperação comercial nos últimos anos. Desde 2007, o país da “Grande Muralha” emprestou cerca de US$ 41 bilhões ao governo bolivariano de Caracas, crédito que está sendo expandido de forma quase contínua. Em setembro passado, o presidente Nicolás Maduro visitou o presidente chinês, Xi Jinping, e reforçou essa parceria.
No acordo de cooperação entre as duas nações, a Venezuela paga os créditos por meio de petróleo – exporta cerca de 310 mil barris por dia aos chineses através da estatal PDVSA. Os yuanes recebidos de Pequim são utilizados em projetos assistencialistas do governo de Maduro, em obras de infraestrutura e no financiamento de importações de produtos básicos e grandes projetos petrolíferos.
“A China tem assegurado o seu abastecimento de petróleo por mais de dez anos com a Venezuela, que conta com a maior reserva mundial de petróleo pesado”, diz Ana Soliz Landivar, do Instituto Alemão de Estudos Globais e Regionais (Giga), em Hamburgo. “Uma das características da China é assegurar o seu abastecimento por meio do desembolso imediato de créditos em troca de contratos a longo prazo com um preço fixo por barril de petróleo.”
Parceria com o Equador
O Congresso do Equador autorizou, no início de novembro de 2012, a exploração de petróleo no Parque Nacional de Yasuní, na Amazônia. A extração de petróleo no parque, que possui a maior reserva de petróleo do país e uma das maiores biodiversidades do mundo, teria sido motivada também por pressão da China.
De acordo com especialistas, o Equador depende cada vez mais dos empréstimos enviados por Pequim. Desde 2008, quando decretou moratória de parte de sua dívida externa, Quito passou a ter nos chineses seus principais credores. A China anunciou em julho, inclusive, que vai investir na construção de uma refinaria no Equador, no valor de cerca de 12 bilhões de dólares, para suprir a demanda interna de derivados do país sul-americano.
“A aproximação chinesa em relação aos países sul-americanos pode ser prejudicial se não for negociado de maneira a preservar as riquezas naturais e a cultura tradicional associada ao meio ambiente”, diz Thiago Gehre Galvão, pesquisador do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB). “Mas pode ser positiva se a presença chinesa for moderada por contratos que protejam os interesses dos países da região e sua sociedade, empresas e empregos.”
Brigando pelo pré-sal
Três estatais chinesas se inscreveram para participar do leilão do Campo de Libra – o primeiro da camada pré-sal, a ser realizado em 21 de outubro. As empresas chinesas Sinopec, Sinochem e CNPC (China National Petroleum Corporation) disputarão com outras oito companhias o maior campo descoberto, até agora, no pré-sal.
Estima-se que o Campo de Libra tenha de 8 a 12 bilhões de barris, sendo que, atualmente, as reservas brasileiras comprovadas correspondem a cerca de 15 bilhões de barris. O prazo do contrato será de 35 anos, não renováveis, e espera-se que a vencedora do leilão realize um investimento de cerca de US$ 200 bilhões durante a exploração do campo.
A participação obrigatória da Petrobras, de no mínimo 30% do consórcio vencedor, desanimou grandes multinacionais, como as americanas Exxon e Chevron, além das britânicas BP e BG, mas não as estatais chinesas, que confirmaram o interesse pelas gigantescas reservas de petróleo do país. Contudo, como citado, o interesse chinês no Campo de Libra não é mercantil, mas econômico e estratégico.
“São restrições que, para empresas privadas, significam controle e risco de interferência na gestão. O caso chinês é diferente, pois a participação deles é feita por conta do interesse estratégico de longo prazo”, diz o economista Evaldo Alves, da Fundação Getúlio Vargas (FGV). “A China entra na disputa não apenas com o objetivo de ter lucro, mas para obter mais uma fonte de suprimento.” (Com informações do DW)