(*) Carlos Brickmann –
A Rainha de Copas, de Alice no País das Maravilhas, era brava, grosseira e incompetenta, chegada às decisões intempestivas – por exemplo, “cortem-lhe a cabeça!”. Mas nem a Rainha de Copas chegou aos pés da presidenta Dilma: “Nosso país precisa ter compromisso com aqueles que desviam dinheiro público”. Está no vídeo https://www.youtube.com/watch?v=Zk5_8D9qBpQ, gravado na sexta em Duque de Caxias, Rio. Claro, compromissos devem ser cumpridos.
E os compromissos estão sendo cumpridos, tanto pelo Governo quanto pela, digamos, Oposição. O deputado André Vargas, do Paraná, ainda não foi julgado pela Comissão de Ética pela ligação com Alberto Youssef, o principal preso da Operação Lava-Jato. Como estão todos em campanha, como as eleições estão aí, como há segundo turno, como haverá as comemorações dos vitoriosos, como no fim do ano há festas e férias, é difícil que alguém se preocupe com corrupção. Os mandatos terminam em 31 de dezembro. A partir de janeiro, cassar o quê?
Já os suspeitos de envolvimento no Petrolão ficam oficialmente para o ano que vem. Os parlamentares citados na delação premiada de Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras, só serão denunciados no Legislativo, pela, digamos, Oposição, em fevereiro de 2015 – depois das eleições e das férias, que ninguém é de ferro. Mas dificilmente alguém será punido: até agora, a praxe é não cassar ninguém por crime cometido fora do exercício do mandato. Eventuais crimes foram cometidos no mandato que termina agora. No próximo estará tudo zerado.
Quem senta no trono?
Temos uma presidente, Dilma Rousseff. Como viajou a Nova York, teve de ser substituída, como se estivéssemos na época em que as comunicações eram feitas via marítima, por carta. Temos um vice-presidente, Michel Temer. Tem palácio bem abastecido, carros, empregados, seguranças, jardineiros, passagens, e uma única obrigação em troca do salário: substituir a presidente em suas ausências. Como agora. Mas não pode assumir: candidato a vice de Dilma, se assumir perde o direito a candidatar-se. Arrumou-se então uma viagenzinha ao Exterior, para que o vice não tenha de cumprir sua única obrigação legal.
O presidente da Câmara seria o terceiro da lista, mas se assumir não pode ser candidato ao Governo do Rio Grande do Norte. O presidente do Senado seria o quarto, mas não pode assumir porque seu filho é candidato ao Governo alagoano.
Temos quatro, não temos nenhum. Quem ocupa a Presidência até amanhã, quinta, é o quinto: o presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski. Qual sua função? Não pode tomar iniciativas, não pode demitir, não pode nomear. Está lá só para manter a cadeira quentinha à espera da volta da presidente Dilma.
Exemplo externo
Quem substitui Barack Obama quando ele viaja? Ninguém: onde quer que esteja, é o presidente em exercício. Tem um vice, que só assume em emergências.
Questão de princípios
Em seu discurso na ONU, Dilma repudiou o bombardeio americano aos terroristas do ISIS, ou Estado Islâmico (a França também os bombardeou, mas foi poupada, por algum motivo, da feroz indignação presidencial). O Estado Islâmico já degolou alguns jornalistas, com o assassínio gravado em vídeo; persegue cristãos, yazidis (próximos à antiga religião do zoroastrismo), muçulmanos que não sejam sunitas. Todos são obrigados a converter-se, ou a pagar altas taxas para manter-se em sua religião. Os que resistem são fuzilados sem julgamento.
Mas Dilma não os repudiou. Para os terroristas do Estado Islâmico, Dilma é clementa.
O nome é “gratuito”
O horário eleitoral apelidado de gratuito custa neste ano R$ 839,5 milhões, em isenção de impostos concedida às emissoras de rádio e TV. O cálculo é da Receita Federal. Fora isso, a União paga o Fundo Partidário (o candidato Levy Fidelix se queixou da quantia que seu PRTB recebe – R$ 100 mil por mês. Os grandes partidos recebem bem mais do que isso). E há quem defenda o financiamento público de campanha como se fosse novidade.
Olhando os números, quem dirá que o financiamento público de campanha atualmente não existe?
Moderníssimo
Por falar em horário gratuito, a Câmara dos Deputados decidiu comprar 60 televisores de 32 polegadas, com tela de cristal líquido ou LED, modelo full HD. Custo da compra, segundo a ONG Contas Abertas, que acompanha os gastos públicos: R$ 51.200.
Agora Suas Excelências, finalmente, terão melhor imagem.
Política divertida
Um bom programa: assistir à peça República das Calcinhas, de James Akel, com Andressa Urach. Akel criou um espetáculo divertido, descompromissado, puro entretenimento – e que, no entanto, mostra direitinho como funcionam os bastidores de nossa política. Aliás, nossa não: a política da República de Banânia, onde se passa a ação.
No Teatro Maria Della Costa, SP, nas sextas às 21h30, nos sábados às 19h30 – uma ideia que vem fazendo sucesso e ampliando o público: dá para ver a peça e voltar a tempo de assistir à novela.
Detalhe: o Maria Della Costa é a primeira obra de Oscar Niemeyer e Lúcio Costa em São Paulo.
(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.