Mudança na Lei Seca para punir motoristas alcoolizados pode proporcionar conflitos jurídicos

Dúvidas de sobra – Por ocasião da sua elaboração, a Lei Seca não levou em conta o direito constitucional de o cidadão não ser obrigado a produzir prova contra si mesmo. Com isso, a realização do teste do bafômetro passou a depender da boa vontade daquele que, parado pelas autoridades, é suspeito de dirigir sob o efeito de bebidas alcoólicas.

Ministro da Justiça, o petista José Eduardo Martins Cardozo anunciou na terça-feira (31) que o governo federal pretende buscar um acordo com o Congresso Nacional que garanta a modificação da Lei Seca e que decrete o fim da impunidade.

De acordo com o ministro, com a eventual mudança na lei o estado de embriaguez poderá ser “provado por quaisquer das provas emitidas em estado de direito, como testemunha, filmagens e outras”. Com a retirada do limite de teor alcoólico aceitado na versão vigente da Lei Seca, o condutor que quiser provar que não bebeu terá de se submeter ao teste do bafômetro.

“Não vamos colocar a dosagem limite como regra de demonstração. A ideia é dizer que aquele que dirigir embriagado incorrerá em crime. Isso pode ser provado por quaisquer provas emitidas em direito. E claro, a pessoa que quiser demonstrar às autoridades policiais que não está embriagado terá o direito de fazer o teste do bafômetro provando que não está embriagado. Ou seja, inverter a lógica da lei”, explicou Cardozo.

Questionamento jurídico

É válida toda medida que penaliza com rigor os motoristas que tomam o volante sob o feito do álcool, mas é preciso cuidado para não se criar um conflito jurídico que acabará entupindo ainda mais o Judiciário. Afirmar que um motorista apresenta sinais de embriaguez carece de cuidado, pois qualquer acusação depende de provas, não apenas de testemunhas, que podem se equivocar no momento da constatação do estado de embriaguez de um terceiro. Eventuais filmagens poderão ser contestadas na Justiça, sob a alegação de que as imagens foram editadas e que o acusado estava encenando. Não existindo a materialidade da prova será difícil levar a punição adiante. Analisando a tentativa de mudança da Lei Seca sob outro prisma, a Constituição estabelece de forma clara a presunção de inocência, Com isso, uma eventual acusação de embriaguez de motorista levará anos para surtir efeito, podendo, inclusive, ser invalidada pela prescrição.

Impunidade

O ministro José Eduardo Cardozo aposta na mudança como forma de acabar com a sensação da impunidade. “A lei é boa, mas é necessário superar problemas que possam alimentar a sensação de impunidade. A ideia nossa é modificar a lei para que a sensação de impunidade que volta novamente fazer com que as pessoas se sintam livres para beber e dirigir possa ser combatida”, defende o titular da Justiça.

Verdadeiro atentado contra o Estado Democrático de Direito, a sensação de impunidade é algo que ganhou o País com força depois da chegada ao poder central de Luiz Inácio da Silva, que nos oito anos em que esteve no Palácio do Planalto tratou de proteger assessores e companheiros acusados de transgressões e falcatruas de todos os matizes. A não punição dessas pessoas reforçou entre os brasileiros a tese de que no Brasil as leis servem para ser descumpridas.

A solução é deflagrar uma maciça campanha de conscientização popular, pois só assim álcool e direção sairão das estatísticas sobre acidentes e do noticiário policial. Por outro lado, de nada adianta a tal campanha se em outros segmentos do cotidiano, como a política, por exemplo, a sensação de impunidade imperando. Ou os brasileiros mudam de forma consciente, ou o Brasil continuará sendo o país do jeitinho, a terra da malandragem.