Lava-Jato: vazamento de diálogo entre jornalista e irmã de senador configura atentado à democracia

Não se trata de novidade o fato de autoridades vez por outra usarem o status temporário que detêm para intimidar profissionais da imprensa. Nos últimos tempos, tal prática vem ganhando terreno no Brasil, o que atenta de forma deliberada contra a democracia e o direito à livre manifestação do pensamento.

Na terça-feira (23), o site BuzzFeed divulgou a transcrição de diálogo entre o jornalista Reinaldo Azevedo e Andréa Neves, irmão do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG). Sem que o conteúdo da conversa tivesse qualquer informação relevante ou indicasse o cometimento de um crime, o Buzzfeed insistiu na divulgação, como se o sensacionalismo barato fosse imprescindível ao direito à informação.

Com o avanço da tecnologia da informação e o advento das redes sociais a informação sofreu sério comprometimento em termos de credibilidade, até porque o “vale tudo” passou a reinar quase que absoluto, mas nada justifica a violação não apenas do sigilo da fonte – contemplado no artigo 5º, inciso XVI da Constituição Federal –, mas também e principalmente do direito à privacidade, tão bem definido no inciso X do mesmo artigo (5º) da Carta Magna.

Absolutamente condenável, o episódio culminou com a ruptura de contrato de trabalho entre o jornalista e a revista Veja, publicação que também foi objeto da conversa entre Reinaldo Azevedo e Andréa Neves e alvo de crítica por parte do jornalista em razão de determinada matéria.

Quando o UCHO.INFO condena de maneira incisiva os vazamentos no âmbito de investigações, em especial as da Operação Lava-Jato, o faz com o intuito de defender o cumprimento do que determina a Constituição e preservar o trabalho investigativo como um todo, evitando assim, mais adiante, a arguição de nulidade das provas por parte dos investigados.

Como sempre afirmamos, não será com o desrespeito à legislação vigente que o Brasil há de se livrar da acintosa avalanche de corrupção que vem derretendo o País e os cidadãos. Ou dá-se prosseguimento à assepsia da nação de acordo com o que determina o conjunto legal, ou é melhor aceitar a ideia de que vivemos debaixo de uma “badernocracia”.


Andréa Neves estava monitorada pelas autoridades e o conteúdo da conversa consta da delação coletiva do Grupo Odebrecht, cujas gravações foram liberadas pelo ministro Luiz Edson Fachin (STF) na semana passada. Como sempre, os órgãos envolvidos nas investigações da Operação Lava-Jato foram céleres em se eximir de qualquer culpa. O caso está sob a responsabilidade da Polícia Federal, da Procuradoria-Geral da República de o Supremo Tribunal Federal, o que permite afirmar que o vazamento ocorreu a partir de uma dessas instituições.

Como mencionado, essa prática intimidatória tornou-se comum no Brasil, pois políticos e autoridades não aceitam críticas, como se fossem o derradeiro reduto da moralidade pública. Se o vazamento ocorre no momento em que Azevedo reforça suas críticas à Operação Lava-Jato, como um todo, fica claro que o intuito era intimidar o jornalista. Algo perigosíssimo em termos de democracia.

O editor do UCHO.INFO foi vítima do mesmo procedimento criminoso por ocasião da Operação Satiagraha, que mandou para a cadeia, mesmo que por alguns poucos dias, um conhecido banqueiro oportunista, cujo nome estamos proibido de citar por arbitrária decisão da Justiça fluminense. Conversas do editor com uma fonte do caso, realizadas através do sistema de radiocomunicação de um celular, foram publicadas na íntegra por conhecida revista semanal.

Mais recentemente, a senadora Gleisi Helena Hoffmann (PT-PR) ingressou na Justiça contra o editor do UCHO.INFO com intuito de intimidá-lo, apenas porque insistimos no escândalo do pedófilo da Casa Civil. Sem obter sucesso em sua desastrada empreitada, a petista recorreu a uma conhecida jornalista paranaense para difamar o editor no estado sulista. E mais uma vez fracassou.

Concorde-se ou não com a opinião de Reinaldo Azevedo, é necessário reconhecer que o agora ex-blogueiro da Veja teve seus direitos criminosamente violados pelas autoridades envolvidas nas investigações da Lava-Jato. Destarte, alguém precisa vir a público e assumir o erro, pois do contrário esse método, típico de regimes totalitaristas, há de se perpetuar.

A classe jornalística bambeia entre o corporativismo e a autofagia, dependendo da situação, mas causa espécie a decisão do BuzzFeed, um veículo de comunicação, de violar o mais sagrado direito dos jornalistas, o sigilo da fonte. O tal site, se questionado, certamente recorrerá ao sigilo da fonte para justificar o injustificável. Como no universo da informação inexiste espaço para desavisados, resta concluir que a divulgação do conteúdo da conversa foi maldade ou oportunismo delinquente.

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