Sérgio Moro, o falso herói nacional, deveria alugar doses de coragem e pedir demissão do cargo

Quando decidiu trocar a toga pelo status de ministro de Estado, Sérgio Moro não pensou duas vezes, mas fez um jogo de cena para que a opinião pública não percebesse suas reais intenções e o mantivesse no panteão nacional dos heróis (sic). Como a massa ignara verde-loura não é pequena e se deixa levar por enredos novelescos, não foi preciso muito esforço para que Moro alcançasse seu objetivo.

A chegada de Sérgio Moro ao Ministério da Justiça foi milimetricamente pensada, com a devida antecedência, inclusive com pinceladas em redes sociais a cargo de pessoas próximas, que sugeriram na corrida presidencial de 2018 que o voto era livre, desde que não se votasse em bandido. Como o conceito de bandido no Brasil é difuso e muda de acordo com a ideologia dominante, é difícil saber o que de fato é banditismo.

Moro pediu “carta branca” a então presidente eleito Jair Bolsonaro, sendo prontamente atendido, mas nos últimos dois meses tem colecionado reveses vexatórios. O primeiro deles foi aceitar conviver politicamente com um réu confesso de crime de caixa 2, no caso Onyx Lorenzoni. Na sequência, Moro, por determinação do presidente da República, foi obrigado a recuar em relação ao texto do decreto que flexibilizou a posse de armas de fogo. Em mais uma apunhalada palaciana, o ministro viu-se obrigado a deixar de fora do projeto anticrime a prática de caixa 2, algo que ele próprio criticou com contundência enquanto magistrado. Para fechar esse ciclo de vexames oficiais, Moro foi desautorizado no caso da indicação de Ilona Szabó para o Conselho Nacional de Políticas Criminais e Penitenciárias (CNPCP).


Caso respeitasse a própria história e tivesse doses rasas de dignidade, Sérgio Moro teria pedido demissão na esteira da ordem de Bolsonaro para afastar Ilona Szabó de um conselho meramente consultivo, cuja missão é apresentar propostas que podem ou não ser adotadas pelo governo. Covarde, mas cultivando interesses maiores, talvez escusos, Moro prefere engolir a carraspana a seco, enquanto o patrão é incensado pela ignorância dos devotos.

Sérgio Moro, sob alguns olhares, cometeu um erro ao trocar a magistratura pela possibilidade de ser alçado ao Supremo Tribunal Federal. Sob outros olhos, o ex-juiz acertou ao se transformar no xerife de araque que sequer é uma ameaça aos corruptos. Melhor seria se tivesse ficado onde estava, com a caneta do Judiciário nas mãos, mesmo que às vezes, contrariando o que prega o bom Direito, condenasse com base em indícios.

Moro, esse falso herói de uma república bananeira decadente, é fruto da preguiça do brasileiro em relação à política. No afã de compensar o desinteresse pelas coisas da política e desanuviar a consciência, o cidadão prefere alçar ao Olimpo de camelô uma figura tosca que, embriagado pelo poder e movido pela vaidade, aceita ser desautorizado seguidas vezes por um ignóbil que passou quase três décadas no Parlamento sem aprender como se faz política.

Ao submeter-se a essa situação grotesca e degradante, mantendo-se como uma marafona em casa de miseráveis, Sérgio Moro não apenas coloca em risco uma indicação cada vez menos provável ao STF, mas atira na vala da suspeição sua carreira como juiz. Afinal, quem se rende ao calor das redes sociais – ou submete-se às ordens de quem assim age – pode ter tomado decisões sob o mesmo manto.

Não se trata de colocar em xeque a honestidade do outrora juiz e do agora ministro, mas é preciso ressuscitar a frase enunciada pelo imperador romano César, por ocasião do divórcio de Pompeia Sula: “Minha esposa não deve estar nem sob suspeita”. Foi a partir dessa declaração que teria surgido o dito popular “A mulher de César não basta ser honesta, deve parecer honesta.”