Ministra da Agricultura adota discurso oposto ao de Paulo Guedes sobre meio ambiente, mas não convence

Quando os integrantes de um governo não combinam antecipadamente o discurso e dão pouca importância para o ajuste fino da oratória, o resultado sempre é dos piores. Esse sempre foi um dos principais pecados do PT, tanto como partido quanto como governo, mas esse modus operandi parece se repetir na gestão Bolsonaro.

Ministro da Economia, Paulo Guedes, que foi batizado pelo presidente da República como “Posto Ipiranga”, afirmou em Davos, na Suíça, durante o Fórum Econômico Mundial, que as pessoas destroem o meio ambiente porque têm fome. Guedes foi duramente criticado pelo UCHO.INFO, assim como por vários líderes globais, pois sua fala é tão irresponsável quanto populista. É compreensível que o ministro tenha embarcado para a Suíça com a missão de “limpar a barra” de Bolsonaro, mas devaneio oficial é demais.

Paulo Guedes precisou, no dia seguinte, explicar aos jornalistas o que dissera em Davos, já que a repercussão negativa de sua declaração foi maior do que se esperava. E quando um político é obrigado a explicar o que disse, é porque o besteirol foi além do planejado.

A ministra da Agricultura, Tereza Cristina Corrêa da Costa Dias, participou do Fórum Global para Alimentação e Agricultura, em Berlim, e adotou discurso contrário ao do colega de Esplanada dos Ministérios. A ministra, que foi duramente questionada na Alemanha após a declaração de Paulo Guedes, disse que não é preciso desmatar para comer, bastando apenas aumentar a produtividade do campo. Essa declaração, típica de quem precisa sair pela tangente, serve para acalmar o ânimo dos “gringos”, mas está longe de retratar a realidade.

Tereza Cristina usou alguns dados oficiais para reforçar sua fala, como, por exemplo, que 2,3% do território da Amazônia são usados para produção agrícola e 10,5% para pecuária, e destacando que não se pode demonizar a agricultura por conta dos problemas ambientais.

“As pessoas estão surdas em relação ao Brasil; existe uma opinião formada de que a gente queima, então mesmo a gente mostrando números, muitas vezes não somos ouvidos. O Brasil tem problemas, mas não é essa calamidade toda”, disse a ministra da Agricultura.

“Na Europa, existe uma má vontade com o Brasil, o Brasil é a bola da vez, como se a gente não fizesse nada certo, o que não é verdade”, declarou. “Essa imagem tem interesses, é o medo que agricultores de muitos países da Europa têm do Brasil, que aumentou com o acordo União Europeia-Mercosul.”

A fala da ministra Tereza Cristina não poderia ser outra, pois, antes de chegar ao Ministério, ela coordenava, como parlamentar e empresária do agronegócio, a bancada ruralista da Câmara dos Deputados. A ministra da Agricultura precisa deixar de lado o discurso de gabinete e tirar da gaveta da escrivaninha a realidade que permeia o meio ambiente. A questão não é má vontade da Europa com o Brasil, nem temos dos europeus diante do acordo União Europeia-Mercosul, que ainda precisa ser aprovado pelos Parlamentos dos países envolvidos.

Por mais que a tecnologia tenha avançado nas últimas décadas, assim como o avanço é permanente, a capacidade produtiva da terra não cresce na mesma proporção da demanda por alimentos. Isso explica o avanço do agronegócio sobre áreas de preservação, mesmo que essa ação criminosa não seja operada por integrantes do setor, mas por criminosos do campo.

É importante ressaltar que ninguém desmata uma área de floresta equivalente a dez ou vinte campos de futebol na base do machado, pois trata-se de uma operação que exige equipamentos pesados e dinheiro para custear a infraestrutura criminosa. Quem tem recursos para financiar uma operação ilícita como o desmatamento não aparece na linha de frente, mas vale-se dos violadores da lei para, mais adiante, auferir lucros absurdos.

No final das contas, as áreas desmatadas, que antes eram de preservação ambiental, acabam nas mãos de empresários do agronegócio, seja de forma direta ou indireta, pois ninguém derruba uma floresta para contemplar o horizonte, mas para ganhar dinheiro de maneira ilícita. Resumo da ópera, só degrada o meio ambiente quem tem dinheiro, não quem tem fome.