(*) Gilmar Corrêa
Discutir a obrigatoriedade de diploma para jornalista sempre foi um tema polêmico. É o mesmo que colocar a mão num abelheiro. E essa colméia ficou muito mais furiosa. A surpreendente (dizem alguns que já estava escrito nas estrelas) decisão do Supremo Tribunal Federal revogou a exigência do diploma e do registro profissional embutida no decreto-lei 972/1969 dos anos de chumbo. Integrava a legislação anacrônica da censura à imprensa, também revogada por unanimidade há alguns dias pelos mesmos ministros.
A decisão agradou aos patrões, os donos dos veículos de comunicação que há muito lutavam para extirpar o diploma das redações. Agradou também a jornalistas formados na batalha do dia a dia em busca de notícias e que, por uma razão ou outra, não frequentaram os bancos das escolas de comunicação.
Derrubar a exigência do canudo provocou, de outro lado, críticas severas de entidades como a Federação Nacional dos Jornalistas e Associação Brasileira de Imprensa, duas entidades que se notabilizaram na história pela defesa das liberdades e do livre exercício profissional, e pela valorização da profissão de jornalista.
Decisão da Justiça se cumpre não se discute, mas comparar a atividade de jornalista a um cozinheiro, como fez o presidente da Suprema Corte, é misturar cobras com lagartos. Há uma distância muito grande entre mexer com panelas e usar a pena no bom exercício de informar de maneira ética e profissional.
Assim, também podemos acreditar que exercer a advocacia não precisa de qualificação, mas de gente esperta em juntar decretos e leis numa petição ou colocar na cadeira de juiz alguém suficientemente capaz em discernir o que é o certo e o errado. Longe de querer polemizar com o ministro Gilmar Mendes ou comprar briga com os advogados, mas o fim da exigência do diploma para o exercício da profissão de jornalista merece análises mais aprofundadas.
Não seria o momento de rediscutir as grades curriculares nas faculdades, assunto que a academia foge como o diabo da cruz? E nesse aspecto é interessante analisar a preparação do futuro jornalista, hoje, infelizmente, despreparado para enfrentar o mercado de trabalho mesmo com o canudo nas mãos.
As escolas de comunicação são como as escolas públicas. Não motivam o estudante. Metade dos bons jornalistas atuantes nas redações entrou cedo no mercado de trabalho, muito antes de receber o diploma. E não é novidade a ânsia em acabar logo com o curso, porque a adrenalina da notícia superou a vontade de escutar professores desligados do tempo e do mercado.
Não sou contra o diploma ou a mecanismos de preservação da profissão, sempre sensível a picaretas ou a patrões inescrupulosos, aproveitadores e exploradores. Mas há necessidade de rediscutir a preparação profissional. Talvez seja necessária apenas uma especialização, privilegiando questões de técnica e a ética.
Além de se mudar as academias de comunicação social, é preciso garantir os direitos de quem já está no mercado de trabalho há muito tempo ou que tenha conquistado seu diploma após quatro anos nos bancos escolares em faculdades públicas ou privadas. A tarefa de entidades, como a ABI ou Fenaj, agora será a de vigilância e buscar um acordo com os patrões, uma espécie de autorregulamentação – como sugeriu o ministro Ayres Britto com a liberdade de imprensa, já que deixou de existir a Lei de Imprensa.
Não seria prudente abrir o mercado de qualquer maneira para todo o tipo de gente e de profissão. É preciso um mínimo de ordem para que o jornalismo não vire uma casa de Mãe Joana. Há muitos advogados que pensam que são jornalistas, mas nenhum cozinheiro com pretensões jornalísticas.