Silêncio revelador em interrogatório no STF sobre golpe

(*) Gisele Leite

O ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, decidiu permanecer em silêncio durante seu depoimento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a investigação da suposta tentativa de golpe de Estado.

Por seu advogado, Matheus Milanez, que confirmou que o militar só responderá às questões formuladas pela própria defesa. Heleno, contudo, respondeu às perguntas formuladas pelo seu defensor.

É a primeira vez que um réu no processo utiliza o direito constitucional ao silêncio como estratégia defensiva na atual fase de oitiva dos acusados. A decisão de Heleno marca um momento significativo no desenrolar do caso que apura a suposta articulação golpista liderada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

No indiciamento realizado pela Polícia Federal, Augusto Heleno foi identificado como integrante do chamado “núcleo de inteligência paralela”, estrutura que teria operado para viabilizar a consumação de um golpe de Estado.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) formalizou denúncia contra o militar, atribuindo-lhe responsabilidade pelo “direcionamento estratégico” da organização criminosa investigada.

O General Heleno aparece como um dos principais conselheiros de Bolsonaro na suposta articulação golpista. Contudo, a defesa do ex-ministro tem trabalhado para demonstrar que houve um distanciamento político entre o general e o ex-presidente durante a segunda metade do governo.

As testemunhas apresentadas pela defesa, todas com experiência de trabalho direto com Heleno, relataram que o ex-ministro orientou a continuidade normal da transição governamental após a derrota eleitoral de Bolsonaro. Segundo esses depoimentos, o general manteve funcionários de administrações anteriores nos quadros do GSI e nunca abordou questões relacionadas à minuta golpista ou promoveu a politização do órgão.

Entre as principais evidências que envolvem General Augusto Heleno está um documento elaborado pelo general da reserva Mario Fernandes, considerado um dos principais suspeitos de arquitetar a trama golpista. O texto previa a criação de um Gabinete Institucional de Gestão de Crise, que seria comandado por militares imediatamente após a execução do golpe de Estado.

A minuta deste gabinete de crise designava especificamente Augusto Heleno como chefe do grupo. O documento também estabelecia outras estruturas dentro do gabinete, como assessorias de comunicação social e de inteligência, totalizando 18 militares no grupo, com predominância de integrantes da reserva do Exército.

Além disso, manuscritos do ex-ministro-chefe do GSI apreendidos pela Polícia Federal constituem outro elemento probatório significativo. As anotações sugerem que o governo Bolsonaro considerou utilizar a Advocacia-Geral da União (AGU) para bloquear operações policiais que a própria administração classificava como ilegais.

Segundo a interpretação da Polícia Federal, os registros de Heleno descrevem uma “comunhão de esforços” no governo Bolsonaro para conceder poderes à AGU na definição de quais decisões judiciais seriam consideradas legais.

“Os elementos de prova não deixam dúvidas de que a organização criminosa estava elaborando estudos para de alguma forma tentar coagir integrantes do sistema de persecução penal para que as investigações contra seus integrantes fossem cessadas”, afirma a PF.

As investigações também apontam que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), órgão subordinado ao GSI, teria sido aparelhada durante o governo Bolsonaro. Segundo as apurações, a agência foi utilizada para infiltrar agentes, espionar adversários políticos e disseminar informações falsas sobre o processo eleitoral brasileiro.

Esta suposta instrumentalização da Abin representa mais um elemento que conecta Augusto Heleno às investigações, considerando sua posição hierárquica como ministro responsável pelo órgão durante o período investigado.

As perguntas do Ministro Moraes estavam vetadas e não seriam respondidas. Entre elas, porque Heleno dizia tomar dois Lexotans na veia por dia para não mandar Jair Bolsonaro tomar medidas drásticas ao fim das eleições.

O referido General responderia apenas às perguntas combinadas, treinadas e orientadas pelo advogado. Deu muito certo.

Já nas primeiras perguntas o advogado queria saber se seria correto afirmar que o cliente jamais defendeu qualquer irregularidade em relação às eleições.

“Realmente não havia oportunidade”, respondeu Heleno, mandando a bola para o próprio gol Já nas primeiras perguntas o advogado queria saber se seria correto afirmar que o cliente jamais defendeu qualquer irregularidade em relação às eleições. O advogado perdeu a paciência. “General, é só sim ou não.”

O Ministro Moraes assistiu de gabinete e não conteve a galhofa. “Não fui eu, general Heleno. Que fique nos anais do Supremo. Foi o seu advogado”, disse o ministro, para risos da plateia – e do próprio réu, pela segunda vez em alguns anos.

O militar afirmou que nunca deu ideias ao então presidente de ruptura democrática e que não lhe dava conselhos políticos fora das atribuições do GSI. General Heleno também afirmou que “aceitou” a derrota de Bolsonaro e a vitória de Lula em outubro de 2022.

O general da reserva Augusto Heleno comentou, durante depoimento ao Supremo Tribunal Federal, declarações feitas durante uma reunião ministerial do governo Bolsonaro.

Uma frase em especial chamou atenção e foi questionada pelos investigadores: “Não vai ter revisão do VAR. Então o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa, é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa, é antes das eleições.”

Ao ser confrontado sobre o sentido dessa fala, Heleno afirmou que se tratava de uma metáfora para ações urgentes: “Essas duas palavras são usadas normalmente quando queremos caracterizar que precisa de uma ação imediata.”

O general deixou claro que não sugeria nenhuma ação fora das regras democráticas e reafirmou o discurso de Jair Bolsonaro de que “jogaria dentro das quatro linhas”: “De maneira nenhuma [quis dar a entender algo contra a Constituição]. Isso aí era uma ação dentro. É importante que o presidente Bolsonaro colocou que ia jogar dentro das quatro linhas e eu segui isso religiosamente”.

Quinto réu na Ação Penal (AP) 2.668 a ser interrogado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, foi ouvido na manhã em 10.06.2025 em audiência na Primeira Turma. O depoimento foi o terceiro feito no segundo dia de interrogatórios. Ele estava acompanhado de seu advogado, Matheus Milanez. Somente respondeu às perguntas de seu defensor.

O direito de permanecer em silêncio, mesmo que parcial, se dá por um antigo princípio de que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo. O silêncio do réu não pode ser entendido pelo juiz como uma confissão e não pode ser utilizado pelas autoridades para prejudicá-lo.

Frise-se que o interrogatório é o momento de o réu se defender daquilo que está sendo acusado, cabendo ao juiz identificar as provas do crime e avaliar a argumentação e provas da defesa. “O réu não tem o dever de contribuir com a acusação. Cabe ao Estado afastar a presunção de inocência.”

(*) Gisele Leite – Mestre e Doutora em Direito, é professora universitária.

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