Concurso para professor de Direito da USP é marcado por denúncias de plágio e falta de originalidade

(*) Maurício Nogueira para o ucho.info –

Direito ultrajado – Um concurso para professor titular de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo se transformou em um escândalo. Se o uso de plágio em defesa de teses de doutorado e mestrado é um exemplo da putrefação da qualidade de ensino de nível superior, o que dizer de práticas nada catedráticas por parte de um desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Em 26 de novembro de 2010 foi publicado edital que dava início ao processo para escolha do professor titular de Direito Civil da Faculdade de Direito da USP. Segundo informações que chegaram à redação do ucho.info, antes de conseguir seu título de livre-docente, requisito essencial para o concurso, circulava e já era orquestrada, no Departamento de Direito Civil, que o professor José Luiz Gavião de Almeida, desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, seria o “candidato do departamento”, e o inusitado, sem concorrência.

Os livre-docentes do Departamento foram consultados e instruídos a não concorrer. Assim, Gavião Almeida se tornou-se o único candidato inscrito do corpo docente da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (foto abaixo).

É sabido que no Departamento de Direito Civil é praxe que o grupo de docentes defina um professor para vencer o concurso, não importando a qualidade da tese e se há outros interessados. A escolha é prévia e o resultado é conhecido desde antes da publicação do edital.

Mas um candidato “de fora”, ou seja, “não escolhido”, surgiu para conturbar o esquema no último dia das inscrições, em 30 de maio 2011. Em seguida, foram distribuídas as teses dos então dois candidatos para os professores titulares da faculdade, com o concurso não agendado ou mesmo a banca examinadora definida.

O professor da faculdade e desembargador do TJSP, Gavião de Almeida, apresentou a tese intitulada “Responsabilidade sem Dano ao Código Civil de 2002”. O detalhe é que a tese não apresentou o requisito essencial do ineditismo, que figura no edital do concurso.

Na mencionada tese verificou-se a compilação de dois artigos anteriormente publicados pelo professor Gavião de Almeida: “Responsabilidade Civil Trazidas pelo Código Civil de 2002”, em Cadernos de Direito (Piracicaba), janeiro-dezembro de 2009, pp. 141-158, publicado em coautoria com José Pedro M. O. Gavião de Almeida, e “Novos rumos da responsabilidade civil por ato ilícito”, em “Temas atuais de responsabilidade civil”, São Paulo: Atlas, 2007, pp. 57-74.

O material evidencia o autoplágio: em amarelo, o trecho copiado integralmente, em laranja, as pequenas modificações para confundir o leitor.

O que se observa é que os dois artigos não estão citados na tese e as mudanças são disfarçadas, com o intuito de ludibriar os examinadores e os leitores. E as irregularidades não se limitam à falta de ineditismo. O plágio na tese fica mais do que explícito. Haja vista que um dos artigos utilizados na tese fora publicado em coautoria, em outras palavras, trata-se de um trabalho científico de outro autor que foi usurpado.

Não passa despercebido, assim como causa espécie, que o jurista Álvaro Villaça Azevedo seja citado duas vezes como Álvares Villaça Azevedo. O professor Álvaro Villaça Azevedo (foto abaixo) foi orientador de mestrado e doutorado do professor Gavião Almeida, denotando que a tese possa ter sido escrita por terceiros. O esforço para aprovar o candidato Gavião de Almeida ao título de professor titular seguiu, como tradicionalmente acontece, a teoria do “candidato da vez”.

E tem mais. A tese do professor Gavião de Almeida no concurso de livre-docência, realizado entre 10 e 14 de janeiro de 2011 – referente ao edital do concurso para professor titular em andamento – foi também acusada de plágio pelo professor Gustado Ferraz de Campos Monaco, que apresentou à Congregação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo as provas do ocorrido. Entretanto, a Congregação não se manifestou para impedir a aprovação do professor Gavião de Almeida, antevendo a sua inscrição para a próxima vaga de titular do departamento.

Outros requisitos do edital do concurso pressupõem originalidade e ineditismo. Ao se analisar a tese de livre-docência do professor Gavião de Almeida, sob o título “Adoção de Adulto”, observa-se que ocorreu um autoplágio, utilizando trechos de um artigo publicado. Trata-se do “Reconhecimento de filiação”, em “Direito de Família do Novo Milênio – Estudos em homenagem ao Professor Álvaro Villaça Azevedo”, São Paulo: Atlas, 2010, pp. 523-545. Mediante a comparação de trechos das obras fica evidente a ausência de ineditismo.

Mesmo com os fatos acima narrados e documentados, a Congregação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo não só possibilitará ao professor Gavião de Almeida participar do concurso para professor titular, como, provavelmente, tomará posse com louros de vitória na contenda. Entretanto, com um modus operandi no mínimo questionável para galgar o título.