Trapalhada do governo de Cabral Filho na prisão indevida de coronel pode gerar indenização milionária

Fazendo contas – O tráfico de drogas no Brasil estreou provavelmente no Rio de Janeiro. Afinal, a conformação geográfica da cidade que é cartão-postal do País facilita o comércio de entorpecentes e dificulta a ação policial. Tudo porque o grosso do negócio se dá nas dezenas de favelas espalhadas pela região metropolitana do Rio de Janeiro. As drogas descem os morros, circulam pelas muitas ruas da Cidade Maravilhosa e finalmente sobem às coberturas que se debruçam nos prédios que margeiam a orla da Zona Sul carioca.

Com o advento das drogas, a polícia fluminense foi obrigada a se especializar em ações de patrulhamento dignas de filmes hollywoodianos. Tanto é assim, que o Rio de Janeiro concentra um considerável número de policiais altamente experientes em ações táticas especiais. E aqui aproveitamos para destacar o valente delegado Alexandre Neto, um dos mais competentes e sérios policiais do Rio.

Vítima de sua mobilidade paquidérmica, o Estado vem perdendo a guerra para o tráfico, mesmo com alguns triunfos em batalhas isoladas. Fazer o “V” da vitória é algo muito distante, pois o tráfico se reinventa sem burocracia e com rapidez invejável. Sem contar que em comunidades carentes onde se instala consegue compensar as falhas recorrentes do Estado. Como se fosse pouco, a contabilidade do tráfico, abundante, diga-se de passagem, é absolutamente flexível quando o assunto é corromper autoridades. A história mostra que até mesmo políticos de altíssimo escalão foram eleitos com o dinheiro dos barões das drogas.

Por conta das constantes derrotas e o avanço do tráfico, o Estado se vê na obrigação de dar uma resposta à sociedade, cada vez mais indignada com a deliberada ação dos traficantes. O que não se pode, no afã de se encontrar um bode expiatório, é apontar o dedo a quem é inocente, pelo menos até prova em contrário. A prisão do coronel Djalma Beltrami, comandante do Batalhão da PM em São Gonçalo e acusado pela Polícia Civil de receber R$ 160 mil por mês dos traficantes, é o resultado dessa necessidade premente de dar ao contribuinte uma resposta, mesmo que mentirosa. A conclusão de um delegado, até então estapafúrdia, colocou na cadeia um oficial militar que sequer teve o nome citado nas provas apresentadas à Justiça. Pior ainda foi a decisão atabalhoada do juiz, que expediu o mandato de prisão sem se ater ao teor da transcrição das gravações telefônicas.

No despacho que acompanhou o habeas corpus que garantiu a liberdade do coronel Djalma Beltrami, o desembargador Paulo Rangel, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, é tácito ao apontar as trapalhadas da investigação. “A autoridade policial não cumpriu com a lei ao elaborar relatório conclusivo da investigação e sim deu a sua versão sobre os fatos. E aqui está o perigo: a versão da autoridade policial colocou, até então, um inocente na cadeia. Quem irá reparar o mal sofrido pelo paciente? Quem irá à sua casa dizer à sua família que houve ou um açodamento, ou um grave erro ao se concluir que ‘zero um’ pode ser o Comandante Geral, pode ser o Prefeito, pode ser o amigo do policial que está no comando da guarnição, enfim… ‘zero um’ pode ser qualquer pessoa”, escreveu o magistrado.

O desembargador Paulo Rangel, em sua decisão, evidencia, nas entrelinhas, que a corrupção advinda do tráfico é piramidal e ascendente. “Quem irá à sua casa dizer à sua família que houve ou um açodamento, ou um grave erro ao se concluir que ‘zero um’ pode ser o Comandante Geral, pode ser o Prefeito, pode ser o amigo do policial que está no comando da guarnição, enfim… ‘zero um’ pode ser qualquer pessoa”, escreveu Rangel. Ou seja, a corrupção vai da raia miúda ao Olimpo do poder.

Imaginar que “zero um” é obrigatoriamente o comandante de uma repartição militar é no mínimo elucubração de camelô. Mas o perigo maior para o Estado está em um questionamento do desembargador: “Quem irá reparar o mal sofrido pelo paciente?”.

Sempre fanfarrão quando lhe convém, mas covarde com todas as letras nas horas de dificuldade, o governador Sérgio Cabral Filho, ainda dominado pelo obsequioso silêncio, já deve estar com a calculadora nas mãos, pois o coronel Djalma Beltrami, que pode querer continuar servindo ao Estado, ganhou na loteria sem ter jogado. Afinal, a indenização pelo suposto dano causado à reputação e à honra do oficial será milionária.