Combinado não vale – Quando assumiu o mandato de senadora e na sequência a primeira vice-presidência do Senado, a petista Marta Suplicy tinha um objetivo específico: ganhar visibilidade política para reforçar uma eventual campanha rumo à prefeitura de São Paulo. Fora da disputa pelo trono paulistano por imposição do ex-presidente Luiz Inácio da Silva, que optou por Fernando Haddad, a senadora paulista alimentou a possibilidade de ser guindada à Esplanada dos Ministérios no vácuo da reforma ministerial prometida pela presidente Dilma, o que não deve acontecer com tanta largueza.
Por conta dessa sucessão de tropeços, Marta Suplicy decidiu romper o acordo de deixar a vice-presidência do Senado, em 2012, em favor do companheiro José Pimentel (PT-CE), ex-ministro da Previdência Social. A guinada de Marta Suplicy deve ser interpretada como uma estratégia para Dilma acomodá-la no primeiro escalão do governo federal, como forma de evitar uma intifada na bancada petista do Senado.
Acontece que a decisão de Marta Suplicy provocou um efeito cascata no Senado Federal, especificamente no núcleo petista. Senador pelo PT do Rio Grande do Sul, Paulo Paim deveria, por acordo, ceder a presidência da Comissão de Direitos Humanos para a senadora Ana Rita (PT-ES). Inspirado pela decisão da senadora paulista, Paim sentiu-se à vontade para romper o acordo selado em 2011 para evitar disputas internas. “Não dá para todo ano ficar fazendo acordo e mudando os quadros, já que o mandato previsto para os cargos é de dois anos”, alega Paulo Paim, que por enquanto deseja permanecer no cargo até 2013.
Outro senador que pegou carona na moda lançada pela ex-prefeita de São Paulo é Delcídio Amaral, do PT do Mato Grosso do Sul. Presidente da Comissão de assuntos Econômicos do Senado, Delcídio, por acordo, deveria ceder o cargo para Eduardo Suplicy (PT-SP) na retomada dos trabalhos parlamentares.
Essa não é a primeira vez que acordos são descumpridos no Senado, pois há casos de gravidade maior. Eleito senador pelo Rio de Janeiro em 1998, a bordo de uma coligação de partidos de esquerda, o ex-prefeito carioca Roberto Saturnino Braga (PT) prometeu dividir o mandato de oito anos com Carlos Lupi, ex-ministro do Trabalho e presidente nacional do PDT. Passados quatro anos, ou seja, metade do mandato, Lupi cobrou a promessa, mas Saturnino Braga descumpriu o acordo e levou o mandato até o final. Resumindo a questão, a prática é conhecida no Partido dos Trabalhadores.
Aproveitando a revolução que toma conta da bancada petista no Senado, a oposição decidiu turbinar a crise gerada a partir do descumprimento de acordos e anunciou que contestará o tal rodízio na Justiça. O argumento de que os oposicionistas poderiam contestar os mandatos dos senadores que deixassem os postos antes da hora foi apresentado por Marta Suplicy para permanecer na vice-presidência do Senado, alegação que foi prontamente adotada pelos demais rebelados (Paim e Delcídio).
Senador pelo Democratas de Goiás, Demóstenes Torres anunciou que poderá recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir o tal rodízio, cujo objetivo é fazer com que os treze integrantes da bancada petista no Senado ocupem um dos cargos a que o partido tem direito, em algum momento do mandato de oito anos.
Em outras paragens políticas, a prática do descumprimento de acordo recheou o currículo do festejado Afonso Arinos de Melo Franco. Eleito senador da República em 1986, pelo Partido da Frente Liberal (PFL), Afonso Arinos contou com a ajuda de Hydekel de Freitas Lima para financiar a campanha ao Senado. Genro do ex-deputado federal Tenório Cavalcanti, o “Homem da Capa Preta”, Hydekel de Freitas, ex-prefeito de Duque de Caxias (RJ), acabou eleito como primeiro suplente de Afonso Arinos, que lhe prometeu cumprir apenas dois do mandato de senador, tempo suficiente para comandar a Comissão Provisória de Estudos Constitucionais, responsável pela produção do texto que serviu de base para a Constituição Federal de 1988. Passados os dois primeiros anos de mandato, Afonso Arinos não cumpriu o acordo, sendo que Hydekel de Freitas só assumiu a vaga em 1990, com a morte do titular. Ou seja, o Democratas, que sucedeu o PFL de Afonso Arinos, não pode abusar da galhardia ao contestar a manobra petista. (Com informações da Agência Congresso)