Tem outro jeito agora?

    (*) Marli Gonçalves –

    A gente se mata, se irrita, sofre muito, envelhece, pega rugas, se acaba, debate até com as paredes e dá com os burros nágua. Sem conformismo, que não é bem de meu feitio. Mas às vezes temos de nos perguntar: tem outro jeito agora?

    Em geral a resposta será não, não tem outro jeito agora. Vamos vivendo. É o que temos para o momento. Relaxa e goza, diria aquela loura que vocês sabem. Sofremos muito por coisas que às vezes funcionam somente como uma maldita culpa, martírio, imolação. Uma culpa que sempre procuramos – temos um masoquista morando dentro de nós, que cria pernas e se apresenta sempre que pode, de preferência já sangrando e com punhais espetados. Não está sempre em nós a solução; não nos foi dada a chave. E o “agora” é tempo. É hoje. Amanhã, daqui a pouco, pode ser diferente.

    Mas vamos sentindo tal culpa – atrelo à cultura religiosa que recebemos – que parece buscarmos que ela justifique, como um álibi, aquilo que enfrentamos nem sempre muito galhardamente. Ou pode ser que haja muitos espelhos em nossos caminhos, vidros que espelham nossa própria imagem. Isso acaba por nos voltar para nosso próprio rosto como acusados.

    Perdoem-me por filosofar em voz alta. Mas quem sabe não esteja apenas tentando verbalizar um sentimento que no fundo é seu também, e que talvez ocupe os seus pensamentos? Do lado de cá acontece que não tenho tido muito tempo nem ocasião para meditar mais profundamente, buscando apoio em grandes pensadores. Nem faço terapia. Sinto na pele, real, e sobe pra cabeça como dizem os mais simples.

    Quem sabe pensar nisso também não o fará resolver alguma coisa? Ou não. Tem outro jeito agora? – pergunte-se. Como eu ficaria feliz se tiver podido ajudar alguém com a minha própria busca de respostas!

    Há fases da vida nas quais somos submetidos a pressões quase insuportáveis. Quase insuportáveis. Sempre lembro de um grande e ponderado amigo me dizendo em um momento difícil para que eu mantivesse a calma, que ninguém ganha, nem carrega, uma cruz maior do que si; por isso, carrega a que lhe é dada. Tomba, cai, levanta e vai. É mesmo o que acontece acima de tudo.

    Não adianta dar murros em ponta de faca. O que adianta é ter clareza. O famoso assim é se assim lhe parece. Para não ficar indolente diante do que pode ser mudado; mas também não tentar se arremessar contra o que não, não pode ser – como fazemos. Por isso tantas pessoas se endividam, por exemplo. Momentos irresponsáveis para tentar se livrar de uma situação que talvez só o tempo possa resolver criam problemas maiores do que um certa humildade diante dele.

    Aprendemos muito percebendo a vida dos outros. Essa semana vimos e nos emocionamos às lágrimas diante de uma mulher paralisada, mas que é quem nos paralisa: Ana Amália Barbosa. Há dez anos sofreu um AVC, continua sem falar, sem mover nem um dedo, sem comer nem mover-se sem muita ajuda e dificuldade. Mas defendeu uma tese, maravilhosa, ajudando, “Além do corpo: uma experiência em Arte/Educação”. E ela ainda ensina com o que aprendeu – estimula crianças que nasceram com paralisia cerebral. Você deve ter visto: ela escreve apenas com leves, quase imperceptíveis movimentos de queixo, olhando as letras projetadas; opera um computador por meio de programas desenhados especialmente para ela pelo Hospital Sarah Kubitscheck, de Brasília.

    Tem outro jeito agora? Não. E ela por acaso parou por causa disso? Não. Um exemplo que tenho certeza: quem viu, não esquecerá jamais. Tenho muito orgulho de contar com a mãe de Ana Amália, Ana Mae Barbosa, entre minhas leitoras. A força genética de uma família.

    Então, se você se perguntava de onde tirei o tema dessa semana, já descobriu. Foi assim. Foi também olhando no espelho para passar um batonzinho e vendo os cabelinhos brancos pipocando como acontece em momentos de stress e pressão, percebendo marcas que chegam sem que eu possa segurá-las, nem mesmo retirá-las; não agora, digamos assim.

    Foi percebendo que não há outro jeito senão encarar os desafios que se impõem, tentando contorná-los da melhor forma possível, e por obrigação, sim, senhor. Tem outro jeito agora? Não. Posso parar? Não. Amanhã será outro dia.

    Foi assim. Pensar na vida é muito bom. Mudar e reagir ao que deve ser mudado e ao que a reação poderá fazer melhorar. Para assim continuar.

    Garanto: bem mais leve.

    São Paulo, perto de completar mais um ano, 2012

    Marli Gonçalves é jornalista – Muda o que pode. Tudo o que tiver outro jeito, agora.

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