Inquietitudes: qual é a sua?

    (*) Marli Gonçalves –

    Adoro inventar palavras novas, ou mesmo apenas dar-lhes umas novas letras, formas e sentidos, para que possam ser mais usadas e gastas do que o normal. Às vezes elas vêm à minha cabeça bem prontinhas. Até poderiam ser encaminhadas para um dicionário especial, que seria um sucesso de vendas nos meios populares, lá onde as palavras nascem dos sentimentos. Tortinhas, mas expressivas.

    Apresento-lhe, portanto, um sentimento que vejo comum a nós, brasileiros, pelo menos aos de bem, nesse momento: inquietitude. Ela, claro, a palavra, é uma variação da inquietude. Mas não para aí. Ela não se dá por rogada. Vai à luta, se mexe, tenta modificar as coisas, está atenta. É uma inquietude com atitude. Com movimento, e uma coisa que vibra (!) dentro de nós. A inquietitude é esperta, observadora, espera a hora e faz acontecer.

    Claro que a inquietitude – pelo menos a que penso – se difere também do furor, inclusive sexual, interno. Esses últimos dias – em um daqueles momentos particulares de auto-análise, porque não dá para ter terapia$ e é preciso se entender – estava tentando compreender a minha inquietação e impaciência. Às vezes até acordo no meio da noite, o que não é normal, tentando resolver coisas que são – ou deveriam ser – apenas do dia. A inquietação é difusa, mais do que a luz do abajur seja de que cor for. Ela incomoda, dá palpitação, você pensa mil coisas em um minuto, se embaralha mais ainda. Acaba deixando ainda mais coisas sem conclusão, tanto cansaço, tanta preguiça.

    As inquietudes, simples, existentes, segundo minhas observações, aumentam em períodos de Lua Cheia, como a grande e prateada dessa semana, sei lá por quais raios lunares e interplanetários vindos do infinito buraco negro. Daí a palavra ter se fixado na parte inventiva de minha cabeça e conseguido até me distrair, e se incorporar na forma de ação, e aí já de inquietitude. Não tem quem fale em ócio criativo? Acabo de inventar a inquietude com atitude, e também posso dar um blá de 171 a respeito, cheio de teses. Que tal uma palestra sobre como todo o país espera fervorosamente por mudanças, e que se uníssemos nossas inquietitudes conseguiríamos sair desse estágio de torpor?

    Tinha assistido a debates na CPI, lido noticiário econômico, consultado meu não-saldo no banco, aberto quatro envelopes de contas para o dia 10 que se enfiaram debaixo de minha porta e que eram minhas mesmo, e me irritado com um nheconheco dos pedais do carro que fará com que ele seja recebido na oficina não vai demorar. O tempo estava seco. O Sol, lindo, o céu, azul, e eu fora do alcance de ambos. Não deu outra: deu o negócio.

    Na verdade eu era a tradução viva de um sentimento para o qual existe um termo, em iídiche, mais ou menos assim “nishguit”. Seria a grosso modo um mau humor sem razão, uma aflição sem calor, pressentimentos sem razão, fatias de pessimismo inoportunas, desdém. Apelidei de “nishguit da Lua Cheia”.

    Nossa língua é viva e tem tudo para ser mais dinâmica do que é. Inclusive batida nos dentes para reclamar de tantas hipocrisias e remelexos. Juntamos palavras, inventamos sons. Agora ouvi, por exemplo, uma cantora falar que o seu ritmo era o sertanejaxé. Fazer o quê? Ouvimos pop rock, samba-canção, porque não funkaxé, funknejo, rapopular, gospelsamba? Na política teríamos o Lulaluf, o Haddaerunda, o Kassaserra, o Chalitemer, entre outros…

    Basta mexer um pouquinho. Aglutinar. Rir para não chorar. Para quem diz que a língua é viva e a escrita, morta, digo que ambas estarão sempre se superando, principalmente para reportarmos os acontecimentos. Também não é ideia de aceitar erros, mas produzir acertos. Juntar lé com crê.

    Enfim, aplacarmos nossas inquietitudes. Com movimentestos, enquanto há tempis, diria o sábio Mussum.

    São Paulo, 2012, não para, não para. Mas parou para ver o Corinthians, igual parou para não ver o PCC em 2006

    (*) Marli Gonçalves é jornalista – Inquietude feminina que dá com lua, e sem lua também. Adora novas palavras, novos gestos e transformações. E tudo começou quando ganhou o genial “Emília no País da Gramática”, de Monteiro Lobato (1934).

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