Polícia para quem precisa de polícia

(*) Carlos Brickmann –

Lembre do hino da Seleção de 1970: “Noventa milhões em ação”. Hoje, a população brasileira é superior a 190 milhões. Na época, a população do Estado de São Paulo era de 17,7 milhões de habitantes. Hoje, é de algo como 42 milhões.

Em 1964, o governador paulista Adhemar de Barros anunciava que a Força Pública, nome utilizado à época pela PM, tinha 60 mil homens. Hoje, tem pouco mais de 80 mil. Comparando: a população do Estado se multiplicou, o efetivo da PM cresceu só uns 30%. Pior: dos 80 mil homens da PM, cerca de 23 mil estão fora das ruas, em atividades diversas (e, se calcularmos quantos PMs estão de férias, em folga, em licença médica, o número de policiais nas ruas vai cair ainda mais). A população cresce depressa, a PM cresce bem devagarzinho.

Quem revelou estes números espantosos foi um órgão oficial, o Tribunal de Contas do Estado. O comandante-geral da PM, coronel Roberval França, diz que não é bem assim: uns dois mil dos soldados afastados da rua cuidam dos centros de atendimento de emergência, recebendo chamados da população.

Alguém poderia explicar a este colunista por que se treina uma pessoa para policiamento de rua, utilização de armas, táticas de enfrentamento, para depois colocá-la no atendimento a chamados telefônicos? E isso se refere a dois mil homens: e os outros 21 mil afastados das ruas? Fazem tarefas burocráticas, que uma secretária, sem treino militar, cobrando menos, faria melhor.

Fora o governador, alguém pode se surpreender com a falta de policiamento?

Tudo dominado

E, se o problema fosse apenas o da falta de policiais, a insegurança não seria tão grave quanto é. O crime organizado tem bases sólidas. Hoje, uma pessoa presa não “escolhe” entrar ou não para o PCC: é obrigada a obedecer às ordens dos chefes dos bandidos. Os parentes que vão visitá-los recebem listas do que devem levar à prisão, o que inclui objetos proibidos, e são instruídos sobre a melhor maneira de contrabandeá-los. E ai dos presos, reféns do crime organizado, se a família não cumprir as tarefas: eles sofrerão as consequências.

Tudo em silêncio

O comando da segurança pública paulista diz que o PCC foi desarticulado, e que usa eventuais incidentes isolados para fingir força. É a mesma tática do silêncio usada há quase 30 anos, quando surgiu a organização Serpentes Negras, desmentida enfaticamente pelo Governo estadual da época; e usada pouco mais de dez anos depois, quando Fátima Souza, repórter da Rede Bandeirantes, relatou o surgimento de nova organização criminosa, o PCC.

Tenta-se desmoralizar o repórter, os editores do jornal recebem a palavra das autoridades de que não há nada daquilo, que os crimes visivelmente articulados são apenas coincidentes. Isso evita que tenham de combater a articulação criminosa. Dá menos trabalho.

Cala que eu te escuto

Nos parlamentos de todo o mundo, há sempre uma parcela de teatro. Aqui também; a diferença é que em Brasília a coisa ficou tão exposta que ninguém mais sente necessidade de guardar as aparências. A tal CPMI do Cachoeira, por exemplo, decidiu abertamente só convocar o empreiteiro Fernando Cavendish, da Delta, depois que se fez um acordo para que ele permaneça calado.

Tudo bem, se ele abrir a boca pode sobrar para muita gente, dos mais diversos partidos; mas ninguém se preocupou em manter esse acordo na penumbra.

Discrição para quê, se todos sabem que ali ninguém quer ir fundo para evitar marola?

Os dois riscos

Além de Cavendish, foram convocados também Paulo “Preto” Vieira de Souza, que foi diretor da Dersa, estatal paulista que cuida de estradas; e Luiz Antônio Pagot, ex-diretor do DNIT, Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes. Os dois são potes até aqui de mágoa, mas se foram convocados é porque devem se comportar. “Paulo Preto” advertiu seus amigos do PSDB que não se abandona um amigo ferido, e Pagot disse que quer falar.

Mas “Paulo Preto” tem tradição de política tucana e Pagot é ligado ao governador Blairo Maggi, do PR – partido que, conforme o Estado, é aliado ao PSDB ou ao PT. Pode haver surpresas. Mas até agosto, quando serão ouvidos, tudo estará mais calmo.

Discriminação, não

A Rede TV! acaba de levar uma surra jurídica memorável: foi condenada por unanimidade a indenizar, com 200 salários mínimos, o modelo Carlos Cunha Gonçalves, por comentários discriminatórios sobre sua vida profissional e pessoal, que expuseram ao ridículo seu nome e imagem. A ação contra a Rede TV! foi movida pela advogada Tania Lis Tizzoni Nogueira.

Um detalhe incomum: em vez de apenas seguir o voto do relator, como é habitual quando há concordância na sentença, o revisor, desembargador Grava Brasil, fez questão de apresentar seu voto, detalhando os motivos que o levaram a condenar a emissora e rejeitar a discriminação. É a segunda vez que a Rede TV! é derrotada neste processo.

Veja bem

O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, PSB, e o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, PSD, até divergem às vezes, mas estão jogando juntos.