(*) Marcos de Vasconcellos, do Consultor Jurídico –
Por ser chamado de homossexual no programa SuperPop, da RedeTV!, um modelo e ex-dançarino do Clube das Mulheres conseguiu R$ 124,4 mil de indenização por danos morais. “Carlucho”, como é conhecido o modelo Carlos Alberto Cunha Gonçalves, foi citado diversas vezes durante o programa da apresentadora Luciana Gimenez exibido em fevereiro de 2006, que teve como foco a história do Clube das Mulheres. Ex-colegas do dançarino disseram que ele havia deixado o grupo por ser gay.
A defesa do modelo, feita pela advogada Tânia Lis Tizzoni Nogueira, alegou que a moral do profissional foi atingida e que ele foi exposto ao ridículo. Argumentou que ele recebeu diversos telefonemas de amigos e conhecidos para falar e perguntar sobre o assunto depois da exibição do programa. A RedeTV! foi condenada a indenizá-lo em 200 salários mínimos no julgamento em primeira instância, em 2007. No último dia 5 de junho, a condenação foi mantida pela 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo.
O abalo que gerou o dano moral não está no fato de ser chamado de homossexual, mas na exposição em si, diz o voto do revisor do caso no TJ-SP, desembargador Grava Brazil. O dano moral se deve ao “fato de a emissora de televisão ter explorado o nome do apelado e fatos pessoais de sua vida, sem sua devida autorização e sem seu consentimento”. O voto de Brazil foi vencedor no julgamento.
No programa, segundo sentença de primeira instância, do juiz Carlos Dias Motta, foi “esclarecido” que os dançarinos do Clube das Mulheres não devem ser homossexuais, “pois dançam para mulheres, e não para homens”. Durante essa discussão, um dos convidados da atração, chamado Juninho, disse que já tinha se relacionado com um dançarino, que não era mais parte da equipe, identificado como “Carlucho”.
A orientação sexual de Carlucho não importa para o exame da causa, diz a sentença. “Tampouco importa fazer juízo de valor ou julgamento moral a respeito. São assuntos que dizem respeito à sua intimidade. Importa, contudo, verificar em que medida é permitida a divulgação de fatos da esfera íntima e privada de qualquer pessoa, bem como a forma desta divulgação.”
O juiz aproveitou para alfinetar o programa de TV: “Mesmo programas de natureza notoriamente sensacionalista devem guardar o mínimo de respeito à dignidade da pessoa humana, pois a liberdade de manifestação, conquistada a alto preço, não pode ser motivo para violação imotivada e injustificada de princípios igualmente contemplados na Constituição Federal”.
A RedeTV! — que no processo aparece como TV Omega Ltda. — alegou que as referências não foram feitas diretamente ao autor e que impedir a discussão travada no programa seria ir contra a liberdade de expressão.
Os áudios do programa, diz o voto do relator do caso no TJ-SP, desembargador José Luiz Gavião de Almeida, mostram a violação à intimidade e a impossibilidade de ser ela justificada em razão da liberdade de imprensa e expressão, “pois esses direitos constitucionais só servem para afastar o direito à intimidade quando um interesse público relevante esteja presente”. Tal interesse público não está presente no televisivo, uma vez que “o interesse presente foi econômico a explorar a mera curiosidade de determinadas pessoas a respeito de assuntos da vida alheia”.