O Administrador brasileiro no século XXI

(*) Marcus Vinícius de Andrade –

Da mesma forma que acontece em todas as áreas e campos de atuação profissional, normalmente, quando os administradores encerram seus estudos na faculdade e encaram o mercado de trabalho, levam um choque de realidade ao se depararem com um ambiente tão competitivo e voraz, como é o nosso.

O que se escuta é que, no geral, o trabalho de varejo não é tão reconhecido; as indústrias cobram especializações e cursos de pós-graduação; os órgãos públicos são disputados… Enfim, todos querem um profissional que já tenha experiência, que fale outras línguas, que domine conhecimentos mercadológicos, que seja líder pro ativo – e por aí segue uma lista interminável de exigências, impostas pelo mercado de trabalho.

Mediante tal perspectiva, existem dois tipos de reações dos profissionais administradores:

1º Há aqueles que ainda acreditavam ser a faculdade um sinônimo de “riqueza”, que quando se depararam com as realidades, entram em “parafuso”. Tudo o que consegue ver é a desvalorização profissional, a falta de reconhecimento por parte de empresários e empregadores, a falta de condições mínimas de trabalho e os baixos salários. Estes mesmos indivíduos não perdem tempo e também não economizam posts nas redes sociais para falar o que sentem e o que vêem. Anos depois você olha para este tipo de profissional e ele continua o mesmo: mal empregado ou às vezes, até mesmo, disponível no mercado de trabalho.
2º Existe, também, aqueles que em contato com a realidade ao invés de verem um problema, vêem um desafio. Estes, em sua maioria, mesmo antes de terminar a faculdade, já estão no mercado de trabalho, aprendendo como se faz na prática. Esse perfil de profissional não economiza em investimentos no conhecimento mercadológico, em cursos de línguas, em especializações e em oportunidades de crescimento profissional. Anos após formar-se na faculdade você olha para estes indivíduos e constata que eles são diretores, gerentes, – são empresários e empreendedores, profissionais bem sucedidos no mercado.

Pessoalmente já conheci muitos profissionais administradores com ambos perfis citados acima. Mas, nos últimos dias, lendo alguns depoimentos sobre o mercado em redes sociais, fiquei pensando sobre meu passado e minha história na administração de empresas e no empreendedorismo…

Os meus primeiros passos foram numa casa de pau a pique e piso queimado. Era um jovem esperto, que colecionava figurinhas “volta ao mundo”, que era proibido de ver o programa da Xuxa e que considerava um pecado mortal beber Coca-Cola… (a religião provocava tudo isso)

Na hora do almoço, às vezes tínhamos somente macarrão com margarina, mas na escola não se lembrava disso ao empreender as melhores festinhas surpresa com muito doce e bolo para a professora. Tinha muito gosto em juntar a turma em torno do objetivo de surpreender e agradar a “tia” da escola. Minha rede de relacionamento, que naquela época ia dos colegas à coordenação e direção da escola, era de vital importância para mim – mesmo não sabendo ou compreendendo o que era networking.

Aos 14 anos, como qualquer adolescente, aspirava pelo tênis da moda, sonhava com a roupa de etiqueta e vários outros itens que na minha condição era impossível possuir. Meus pais não tinham condições para aquilo. Foi assim que nasceu a necessidade genuína de trabalhar.

Naquele mesmo ano tive o meu primeiro emprego e dentre outros muitos, trabalhei em lanchonetes, em casa de sucos, em loja de móveis, em gráficas e serigrafias, em escola de informática, até que um dia fui parar dentro da produção de uma indústria agro alimentícia.

Quando decidi aos 18 anos iniciar minha faculdade de administração fui para uma cidade desconhecida, sem parentes ou familiares, sem nenhum vínculo de amizade ou apoio a minha chegada. Neste período todas as adversidades de minha vida estavam sublimadas pelo contentamento de estar dando inicio à realização dos meus sonhos. Acredito que não exista algo mais poderoso na metamorfose da vida do que o desejo focado em ações de realização de sonhos.

Enquanto estudava as teorias da administração e me preparava em conhecimentos mínimos do mundo empresarial, sentia que estava criando no futuro as minhas próprias oportunidades. Naqueles primeiros anos de faculdade, comecei a perceber e entender que a vida não estava simplesmente acontecendo comigo.

Todos os aspectos de minha vida estavam reagindo exatamente ao que eu pedia a ela – quando sai de casa rumo a uma cidade desconhecida, quando ingressei em uma faculdade de administração mesmo em condições financeiras limitadas, eu estava evocando o meu sonho de infância – ser um executivo bem sucedido. E foi exatamente isto que começou a acontecer, o meu segundo ano de faculdade foi marcado pelo nascimento de um novo Marcus Vinicius.

Naquele segundo ano da faculdade com muita dificuldade consegui um estágio em um negócio no mercado farmacêutico que transformou minha vida. Foi através de network com colegas de sala, que trabalhavam na empresa júnior, tomei conhecimento da oportunidade, cujo valor era inferior a um salário mínimo, da época.

Tratava-se de uma oportunidade perfeita para quem não precisava trabalhar para sobreviver, afinal era uma chance de alguém sem nenhuma experiência como eu, poder aprender na prática o que se via na teoria da faculdade. O problema era que eu precisava trabalhar para sobreviver. Mesmo assim, depois de considerar os pros e os contras tomei coragem e decidi batalhar por esta oportunidade.

Hoje, quando olho para trás, vejo o quão certa foi minha decisão. Aprendi que a coragem para enfrentar certas situações impostas pela vida é a fronteira que separa o fracasso do sucesso. Anos mais tarde saí de lá como um sonhador, aventureiro, corajoso, desbravador e visionário: saí de meu primeiro estágio como um empreendedor.

É claro que não me aventurei no mercado apenas como estagiário. Comecei como um aprendiz, mas antes de empreender fui auxiliar, coordenador, gerente e diretor. Aprendi tudo o que precisava e através da rede de contatos que desde pequeno valorizava e cuidava como se fosse ouro, criei do nada um empreendimento que hoje me traz muitas alegrias.

Muitos estudantes de várias áreas do conhecimento e vários campos de atuação profissional deixam de aproveitar oportunidades como àquela que se apresentou para mim, por achar que vai ganhar muito pouco, ou por achar que estágio não tem importância no ingresso da carreira, e até mesmo por achar que faculdade ou o curso superior por si só garantem um futuro de sucesso e prosperidade.

A verdade é que o mercado de trabalho é cruelmente competitivo. Programas de Trainee com altos salários iniciais não são para todos, ter a xerox do diploma na pastinha do currículo não vale nada, o que conta mesmo para a grande maioria dos universitários e recém-formados em processos de seleção nas empresas, é a experiência mínima e básica para qualquer vaga de “auxiliar”. Fora disso sobra os estágio mal remunerados e às vezes até voluntários. Ter coragem para enfrentar esta dura realidade é de suma importância para quem não quer se formar em uma área e por “conveniência” trabalhar em outra totalmente diferente.

No inicio de minha carreira como administrador enfrentei com coragem os salários baixos e todas as adversidades do mercado de trabalho. Hoje tenho meu próprio empreendimento, oferto mais de 200 empregos (20 diretos e aproximadamente 180 indiretos), meu faturamento superam os seis dígitos e com uma carteira com mais de 800 clientes tenho o orgulho de fazer a diferença como administrador, empreendedor empresário no Brasil.

Na vida até aqui, constatei que podemos sempre aprender com experiências positivas e com as experiências negativas. Desde sempre decidi olhar para o meu passado, para minha infância, e observar todas as experiências boas e ruins que tive. Decidi ainda tirar o melhor disso tudo, crescer e prosperar.

Diante de tudo o que vivi até aqui, as vezes fico me perguntando, quantos administradores e empreendedores estão dispostos a encarar o passado, e aprender as melhores lições? Quantos administradores estão dispostos a olhar para o mercado, para os problemas da profissão e encarar tudo como um desafio, como uma oportunidade de crescimento? Por que mesmo diante de vários outros exemplos de empreendedores bem sucedidos, ainda existem aqueles que insistem em viver uma vida profissional de derrotas, culpando o país, a classe profissional e a sociedade?

Também não sei as respostas para minhas perguntas. O que sei é que não haverá nunca uma “profissão perfeita” em nenhum campo profissional do mercado. E na administração não será diferente. Haverá sempre muita cobrança, competitividade e dificuldades para quem está saindo da faculdade.

Diante disto tudo, posso dizer com toda certeza que o sucesso de uma carreira profissional está nas mãos e no desejo de realização de cada um. Acredito que podemos ser a mudança, fazer a diferença compartilhando a paixão que temos com a profissão de administrar negócios e empreendimentos no Brasil.

(*) Marcus Vinicius de Andrade é empresário e administrador de empresas. É fundador e diretor executivo do ICTQ – Instituto de Ciência, Tecnologia e Qualidade – www.ictq.com.br