Apelos de mães, por mães, para mães

    (*) Marli Gonçalves –

    Já vi, ouvi e li cada anúncio de presente ou glorificação do Dia das Mães de chorar, um mais sem senso e apelativo do que outro. Ao mesmo tempo choro mesmo é de ver, ouvir e ler cada vez mais quantas são as mães desesperadas por terem perdido seus filhos no meio do caminho na inglória batalha da vida

    A pior, sinceramente, uó, é o filme de uma marca de cosméticos, todo horário nobre. Na imagem a mulher, jovem e bonita, aparece na cena inicial calçando chinelos de hospital chique e, vejam só, uma narração dramática anuncia: sem maquiagem, sem se preocupar com vaidade, sem cabeleireiro (mas com um marido bem maravilhoso segurando a mão, numa das induções mais falsas da propaganda ultimamente), nas cenas finais ela está numa sala de parto ainda, onde aparece conhecendo seu bebê, e linda, no “dia mais importante de sua vida”. Apelação pouca é bobagem. Até parece que andam precisando vender a ideia de que ser mãe é a grande glória à qual nenhuma mulher pode abdicar sob o risco de ser considerada inexistente. Será? Manutenção de mercado consumidor? Reserva?

    A concorrência é forte demais para ver quem é mais piegas, quem apela mais para vender qualquer coisa que a sua mãe “vai adorar”, que essa data rende igual Natal. Esse comercial que eu cito reduz a mulher de tal forma que preciso frisar. Desculpe, hein! Mas tem muitas outras coisas que a gente pode fazer sem pensar em maquiagem e etceteras além de ter filhos. E o dia mais importante de nossas vidas pode ser também o dia que percebemos, por exemplo, que nossos filhos sobreviveram à selva urbana, conseguiram concretizar algo. O que anda bem difícil na barbárie geral.

    Todo ano é a mesma coisa. Parem para prestar atenção, além dos armários, telefones, panelas, eletrodomésticos surge nas entrelinhas o que o mercado realmente pensa da mulher, de quais são seus desejos, de como ela é vista ainda, de como lutam para que assim sejam mantidas. Mesmo com tantas mudanças, tantas conquistas e desafios, encarando o touro a unha, com suas jornadas de trabalho, a mulher é reduzida a uma risonha mãe à mercê de objetos que a cativem.

    Agora já estamos precisando apelar ao contrário. Mulheres, se não puderem, não tenham filhos. Porque, se vocês se descuidam, essas lindas crianças nem bem se entendem como gente saem por aí, roubando e matando, com algum tipo de arma que pode ser inclusive o fato de terem sido tão mimados que viraram bestas incontroláveis. Não é fácil ter filho nesse sistema de saúde, nem tranquila será sua sobrevivência nesse novo século que já vem marcado inclusive por desastres naturais.

    Por favor, não acreditem que tantas bolsas dadas pelo governo sejam justas – não sejam compradas por elas, pelo populismo de políticas sociais executadas por quilo. O sapato não vem junto com a bolsa, não faz par. A cada dia está mais difícil criar um filho. O planeta está se exaurindo e pouco adianta o povo sair por aí falando em sustentabilidade e racionalização. Mas sem planos para a educação, sem criação de mercados e empregos e com uma severa substituição da mão de obra por máquinas.

    Fora isso, especialmente, pense que vai ter – por obrigação – uma cabecinha para moldar, um espírito para entender e incutir a necessidade de um caráter firme, e voltado para a paz.

    Isso, além de caro, muito caro, dá trabalho e nem sempre tanto prazer. Todos os dias são Dia das Mães. Sejam elas biológicas ou adotivas; sejam elas solteiras ou casadas. E mais: tenham filhos ou não.

    São Paulo, 2013, simplesmente maio. Já, maio.

    (*) Marli Gonçalves é jornalista – – Sem filhos, porque como filha logo, desde menina, já sentiu que contos de fadas só nos livros. Nem nos filmes convence. Presta atenção.

    Tenho um blog, Marli Gonçalves, divertido e informante ao mesmo tempo, no http://marligo.wordpress.com. Estou no Facebook. E no Twitter @Marligo