Dois lados – Em junho passado, quando eclodiu o escândalo de espionagem em torno da Agência de Segurança Nacional americana (NSA), foi ao ministro do Interior, Hans-Peter Friedrich, que Angela Merkel deu a tarefa de falar inicialmente pelo governo alemão. A chanceler federal só veio a se posicionar semanas mais tarde, já com a polêmica mais consolidada.
O episódio ilustra parte da personalidade e do estilo de governar de Merkel. Seus apoiadores veem no caso NSA uma demonstração do que seria uma das principais virtudes dela: a cautela. Seus detratores, por outro lado, enxergam passividade – e certa dose de oportunismo.
Pouco antes das eleições legislativas do fim de semana, que conferiram ampla vitória ao partido de Merkel, psicólogos do Instituto Rheingold, de Colônia, examinaram o estado de ânimo entre a população. A pergunta: o que desejam os cidadãos alemães? A resposta: após a crise financeira e do euro, acima de tudo continuidade, orientação e calma.
“É exatamente o que acreditam encontrar em Angela Merkel”, diz Thomas Kirschmeier, do instituto realizador da pesquisa. Para seus eleitores, afirma, a democrata-cristã é uma rocha em meio à tormenta.
Segundo Jacqueline Boysen, biógrafa de Merkel, para a chanceler é sempre a coisa em si que está em primeiro plano, não o seu ego. “Angela Merkel é inteligente e trabalhadora”, afirma. “Ela dá a entender que não quer permanecer no poder só pelo poder em si.”
Vício ou virtude
Nas eleições deste ano, os cidadãos cuidaram para que a União Democrata Cristã (CDU) de Merkel vencesse com quase oito pontos percentuais a mais do que no último pleito parlamentar. Alguns veem na política conservadora a personificação do alemão típico.
“No exterior, costuma-se ver a coisa assim porque Merkel encarna virtudes como pontualidade e pragmatismo”, diz Boysen. Thomas Kirschmeier complementa: além disso, ela é considerada confiável, e muitos no país apreciam seu modo tranquilo de tomar decisões.
Para os opositores, esse é justamente um foco de crítica. O líder da bancada parlamentar social-democrata, Thomas Oppermann, acusa Merkel de passividade diante de todos os problemas. Outro ponto de crítica: para ele, a chanceler não é suficientemente visionária, jamais esclarecendo aonde pretende ir com suas decisões.
Mas é justamente isso que caracteriza a forma de agir de Merkel, rebate sua biógrafa. “Ela é totalmente anti-ideológica e desligada das velhas tradições impostas pelo programa do partido.”
E foi essa liberdade que ela usou para modernizar a CDU, com a introdução do Elterngeld (auxílio aos pais que optam ficar em casa dos filhos), o fim do serviço militar compulsório, o abandono da energia atômica, enumera Jacqueline Boysen.
E nem mesmo as observações espirituosas dos opositores da chefe de governo alemã conseguiram abalar essa confiança básica incondicional. A presidente do Partido Verde, Claudia Roth, por exemplo, a acusou de empreender uma campanha eleitoral “de Valium e vácuo”, a fim de evitar temas controversos o máximo possível.
A julgar pela enquete do Instituto Rheingold, essa não é a opinião dos cidadãos alemães: a maioria deles se sente bem tendo Angela Merkel na chefia do governo.
“Mãezinha” na chancelaria
Por isso, muitos a veem como “mãe” da nação. “Angela Merkel tem a coisa maternal. De um modo ou de outro, ela mantém sua mão protetora sobre o país”, louva Thomas Kirschmeier. E, embora não tenha nenhum filho, foi apelidada “Mutti” (mãezinha) pelo próprio partido.
A intenção inicial, contudo, não era lisonjeira. Inimigos intrapartidários queriam acentuar uma tendência superprotetora, além de brincar com as associações do termo “Mutti” com a Alemanha Oriental e o passado de Merkel sob o governo autoritário.
Nesse meio tempo, contudo, o apelido ganhou conotação positiva, pois, aparentemente, os eleitores e cidadãos têm confiança em Angela Merkel: ela cuida, explica Boysen.
Agora, na qualidade de chanceler federal, ela cuida das funções diárias do cargo e sonda possíveis parceiros para uma coalizão governamental. Sua biógrafa conta como improvável uma coligação com os verdes, mas alerta: “Em todos estes anos, Angela Merkel sempre conseguiu uma coisa: nos surpreender”. (Deutsche Welle)