Grupo que lutou pela criação do Parque Augusta, em SP, defende a autogestão

parque_augusta_01Valeu o esforço – No último dia 23 de dezembro, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, sancionou, após pressão popular, o projeto de lei que cria o Parque Augusta, ultima área verde da região e localizada no centro da capital paulista.

Com 25 mil metros quadrados e 300 árvores de 46 espécies distintas, todas remanescentes da Mata Atlântica, entre elas jacarandá e palmeira, a área abrigou no passado o Colégio Des Oiseaux, instituição de ensino privado mantida pelas cônegas de Santo Agostinho e voltada para a classe abastada de então, onde estudaram a ex-primeira-dama Ruth Cardoso e a ex-prefeita Marta Suplicy.

Tombado pelo Patrimônio Histórico em 2004 e até então sem destino definido, o terreno foi declarado de utilidade pública em 1970, mas em seguida a Câmara Municipal revogou o decreto, devolvendo o imóvel aos proprietários. O impasse já durava mais de quarenta anos, sem que as autoridades decidissem sobre o que funcionaria em uma das últimas áreas verdes da cidade, que em sua região central desrespeita sobremaneira as recomendações da Organização das Nações Unidas sobre o tema. De acordo com a ONU, o ideal é que as cidades tenham 12 metros quadrados de área verdade por habitante, enquanto a capital paulista, segundo dados da própria prefeitura, tem 1,34 metro quadrado.

Desde o então prefeito Paulo Salim Maluf (1969-1971) ao atual, o petista Fernando Haddad, os mais variados projetos foram desenvolvidos tendo como cenário o que deveria ser o Parque Augusta. De supermercado a um Museu da Música Popular Brasileira, tudo já foi pensado para ser instalado no terreno, que já funcionou como estacionamento e foi endereço do Projeto SP, um reduto onde aconteciam eventos culturais.

O grupo que lutou pela preservação da área e a sua transformação em local público divulgou Carta Aberta à população em que defende a autogestão do Parque Augusta.

Confira abaixo a íntegra do documento

“Carta sobre o Parque Augusta

Em 23 de dezembro, o prefeito de São Paulo sancionou o Projeto de Lei 345/2006, que define a criação do Parque Augusta. O quarteirão entre as ruas Augusta, Caio Prado e Marquês de Paranaguá tem valor simbólico único: com mais de 600 árvores de Mata Atlântica, a maioria nativa, lá está o último bosque do centro de São Paulo, em um terreno de 24 mil metros quadrados. Diante disso, a assembleia do Parque Augusta deliberou a redação desta carta.

Após a recente valorização da região, as incorporadoras Setin e Cyrela definiram um projeto privado com duas torres comerciais de 30 andares. A mata seria uma área particular no fundo do lote, aberta ao público em horários específicos.

A ameaça da perda do último bosque de Mata Atlântica preservada da região aprofundou a luta pelo Parque Augusta – que já dura décadas. O movimento em defesa do parque se organiza de forma independente e apartidária, com caráter espontâneo e colaborativo, completamente desvinculado de quaisquer instituições políticas, religiosas e econômicas.

Todas as decisões, dentro dessa forma de organização, são tomadas por meio de assembleias deliberativas. Realizadas semanalmente no próprio parque e convocadas pela internet, por nossas redes sociais, a assembleia aberta é o espaço de respaldo.

Assim, o movimento realizou, nas últimas semanas, dezenas de ações dentro e fora do parque que, devido ao sucesso de público e mídia no apoio à causa, pressionaram o prefeito pela sanção do projeto público. Vale ressaltar que essa ideia era rechaçada pela atual gestão, que por meses demonstrou interesse pelo projeto privado.

O projeto de Parque Augusta defendido é o da manutenção de uma área pública que contemple preservação e conscientização ambiental, lazer, arte e cultura. Além disso, expressamos a preocupação pelo mecanismo de criação do parque, garantindo que acompanharemos o processo político e financeiro que tornará público o terreno hoje privado.

Entendemos que a única possibilidade de construção deste parque é o debate aberto e permanente. Nossa experiência em autogestão é uma realidade estruturada e aberta a quem se interessar. Aqui, diversos indivíduos e grupos estão trabalhando um caminho conjunto de articulação política e organização social, sempre na perspectiva da horizontalidade. Nenhum indivíduo responde institucionalmente pelo Parque Augusta. Cada um é responsável por seu cuidado. Qualquer responsabilização individual é intimidação.

Não aceitaremos outro burocrático parque municipal, cercado e fechado à participação e proposição popular. Também não aceitamos ceder um centímetro de solo nativo para o lucro de grupos imobiliários. Estamos falando do corpo da cidade, não de mercadoria. O movimento visa a gestão pública do espaço, tendo o cuidado de diferenciar público de estatal.

O Parque Augusta não é uma exceção, ele é um protótipo, exemplo a ser propagado. Somos uma experiência corrente, viva, que não será ignorada. Nosso processo continuará como está, generoso, criativo, descalço no parque, aberto a quem chegar para somar, e todos podem chegar. Já estamos construindo o Parque Augusta. Conseguimos uma vitória importante e agora a luta segue ainda mais intensa: sustentar e desenvolver o projeto de autogestão. Ali, cultivamos uma nova cidade.

Que viva o Parque Augusta!

– Assembléia do Parque Augusta”