Sem bússola – Ao final de 2013, mais de 51 milhões de pessoas viviam como refugiadas no mundo, constatou o Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur) em seu novo relatório anual “Tendências Globais”, lançado nesta sexta-feira (20). Trata-se da primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial que o número ultrapassa os 50 milhões.
Os motivos para o abandono forçado da terra natal são conflitos, perseguições, violência ou violações dos direitos humanos. Do total de 51 milhões, mais de 33 milhões eram deslocados internos – ou seja, tiveram de deslocar-se dentro do próprio país –, enquanto quase 17 milhões tiveram de cruzar fronteiras. Mais de um milhão de pessoas pediram asilo em 2013.
“Não se trata de uma tendência crescente, mas de um verdadeiro salto quântico”, afirma António Guterres, alto comissário da ONU para refugiados.
Novos e velhos conflitos
Durante vários anos, o Acnur verificou números relativamente estáveis. Isso estava ligado principalmente às consequências de conflitos de longa data. Os refugiados vinham, sobretudo, de países como a Somália, Afeganistão ou República Democrática do Congo. Até que a guerra civil na Síria começou, em 2011. Desde então, o número de refugiados aumentou rapidamente.
Entretanto, Guterres afirma que novos conflitos vêm se formando em todo o mundo. “Esta aceleração deve-se ao fato de que os conflitos se multiplicam de forma imprevisível, enquanto perduram velhas crises. A capacidade de a comunidade internacional evitar ou resolver conflitos é muito limitada.”
Em 2013, por volta de 11 milhões de pessoas foram forçadas a fugir. Isso equivale a quase 30 mil novos refugiados a cada dia. Dois anos atrás, essa cifra girava em torno de 14 mil por dia. E as perspectivas para 2014 não são nada animadoras.
“Estamos apresentando as estatísticas para o ano de 2013, mas quando se olha para o que aconteceu desde então, percebe-se que as coisas estão piorando”, diz Guterres. “A velocidade com que ocorrem novas crises é um fato. Ela mostra que, a princípio, as coisas vão piorar, até que, em algum momento, haja uma melhora”, acrescentou.
Ajuda humanitária não é suficiente
A guerra na Síria continua. Também no Sudão do Sul e na República Centro-Africana não se veem sinais de alívio. Além disso, diante dos acontecimentos recentes, já se registram centenas de milhares de refugiados no Iraque.
O Acnur enfrenta um dos anos mais difíceis de seus mais de 60 anos de história. Em tempo recorde, os funcionários da agência da ONU registraram refugiados, distribuíram alimentos e medicamentos, e negociaram o reassentamento de pessoas em situação particularmente vulnerável com países terceiros.
“A ajuda humanitária, a proteção dos refugiados, isso é parte da resposta, mas tal resposta será sempre apenas um paliativo”, considera Volker Türk, diretor da Divisão de Proteção Internacional do Acnur. “Isso significa que precisamos urgentemente de iniciativas políticas para que esses conflitos possam ser resolvidos, tanto pelos principais responsáveis nos próprios países quanto pela comunidade internacional.”
Exemplo da Alemanha
Enquanto não se avistam soluções políticas para os principais conflitos atuais, milhões de refugiados permanecem à espera sob condições precárias. Nesse contexto, a maior parte dos cuidados fica por conta dos países vizinhos. Atualmente, Paquistão, Irã, Líbano, Jordânia e Turquia registram o maior número de refugiados.
Dos refugiados mundo afora, 86% vivem em países em desenvolvimento, destaca o Acnur. Ao mesmo tempo, a agência de refugiados da ONU apela aos países industrializados para que mostrem solidariedade e assumam uma parte da responsabilidade condizente com a sua riqueza.
É grande a esperança de que a decisão da Alemanha de acolher dez mil novos refugiados sírios sirva de exemplo para outros países. Trata-se de dez mil pessoas cujas condições de vida melhoraram por meio do reassentamento – um passo importante para aliviar a miséria dos refugiados no mundo, considera Guterres.
“Visito regularmente pessoas realocadas em todo o mundo”, diz o alto comissário da ONU. “Você não pode imaginar a alegria que é vir para a Alemanha, Suécia, EUA ou Canadá e encontrar uma família, que antes vivia no campo de refugiados de Dadaab, no Quênia, e hoje leva uma vida normal.” (Deutsche Welle)