Marli Gonçalves –
Tapetão? Isso já é um carpetão. Cheio de pregas e tachas. Me pergunto só, todo dia, como é que gente de bem pode ainda estar e ficar calada, apática, impassível diante do que vem ocorrendo descaradamente nesta campanha, mais especificamente no último mês? Como é que podemos aturar que, para manter o fervor do apego ao poder e aos cargos, eles agora cheguem ao pé do ouvido das pessoas mais necessitadas, de quem tanto falam, bradam que protegem, que são pai e mãe, que são isso e aquilo, e vão lá para mentir para eles, incutir o medo e o terror?
Falta de capacidade política para vencer com honra? Preferência de perder com desonra? Apelação. Essa eleição está mesmo cheia de ãos. Tapetão, sopetão, mensalão, petrolão, delação, corrupção, dinheirão. Se parar para pensar virão muitos outros ãos. Extorsão, por exemplo, caminhando juntinho com a trairagem.
Sem mentira, pensei que talvez houvesse ainda sobrado alguma compostura quando se tornou visível uma variação de pensamentos dentro do PT. Ou que o passado político de muitos deles, com muitos dos quais estivemos juntos em muitos fronts, lhe desse alguma vergonha na cara, ou ao menos discernimento.
Não. Inventaram um país. Tão maravilhoso, tão legal, tão com tudo certo que nem o mais criativo dos compositores poderia descrever esse paraíso tropical que nos é apresentado diariamente na campanha eleitoral; nem Jorge Ben nos melhores tempos. Será que estão bebendo muito alguma coisa diferente, tipo o que deram para a Alice no País das Maravilhas? Porque eles crescem para apavorar, e ficam pequenininhos para entrar sorrateiros em tudo quanto é cantinho, igual a ervinhas daninhas. Vivem mesmo num mundo de fantasia.
Mas nós não. Sabemos ler, procurar distintas fontes de informação, temos capacidade de reflexão. Estamos vendo o país parado, os negócios estancados, a inflação treinando o galope pocotópocotó. Parecemos mais samurais cortando tudo. Corta isso, corta aquilo, deixa disso, não paga lá, se estoura nos juros.
Enquanto isso, os caras faltam fazer amor gostosinho com os bancos durante anos, nunca banqueiros lucraram tanto, nunca entidades estatais distribuíram tantas benesses, se envolveram com tanta corrupção, e nunca, ainda, tantas benesses foram queimadas, inclusive com petróleo, por exemplo, no caso Eike Batista e seus xs. Já estou logo dando nomes aos bois porque há um exército dissimulado, vindo das profundezas desse paraíso artificial criado – para eles deve estar tudo bem – pronto para acusar quem não os ache lindos, xingando de nomes de várias aves, como tucanos e abutres. Eu sou só um passarinho fora da gaiola, chamado Saudade. Saudade de quando pensamos em um mundo melhor.
Mas também tem Alice no País dos Espelhos. Aí acredito seja onde reside a inspiração dos homens de marketing que capitaneiam o mal, distribuindo-o com a maior cara de pau e muito dinheiro. Buscam no espelho tudo de péssimo de seus próprios rostos para apontar o dedo em outras direções. Olham para a Marina e a acusam de ser ligada aos bancos quando, se você pensar bem, ela está é conseguindo salvar uma herdeira, a Neca Setubal, desse destino tão cruel de família. Nunca vi petistas serem tão agressivos, por exemplo, com os Moreira Salles e sua dinastia, o cineasta Walter, ou o cineasta João, esse último até autor de um filme sobre a campanha do Lula. Quando é com eles, tudo pode, tudo é certo. Tudo é democrático. Afinal, a cantilena é que tiraram não sei quantos milhões da miséria.
Adivinhe só. Estão destruindo um país da América Latina. Adivinhe qual. Ah, esse aí que você também pensou é uma resposta certa, sim. Porque para piorar ainda há a união do ruim com o pior e com o que há de mais atrasado, principalmente em relação ao comportamento, à modernidade, o que inclui, sinto muito, países até mais distantes, como a fechada China e a rancorosa Rússia.
É agora a hora da união. Porque o tapetão vai fazer escorregar, tropeçar, e muita louça pode ser quebrada. Precisamos consolidar uma oposição, parar de nhenhenhem, mineirices para lá, Deus para cá. Se não surgirem estadistas agora, com interesses mais elevados que seus anseios ou seus umbigos, sei não…
Somos todos de um grupo só, lutamos contra 30 anos de uma violência brutal, formamos vários movimentos. Aconteceu que muitos se desgarraram de vez e, na gangorra política, estão aboletados no Planalto e em cima de postes plantados. Esses aí é que são o problema atual, nadando sim no petróleo.
Nós sabemos que o pré-sal é mesmo importante, mas ainda é um ovo em formação lá na galinha; que os programas sociais são fundamentais porque qualquer coisa é boa para quem precisa, como o ar para respirar, mas eles não podem paralisar, criar pessoas deitadas em redes esplêndidas.
Nós sabemos tudo isso. Precisamos retomar as mudanças de onde as paramos. Nada mais importa agora, a não ser a união, enquanto é tempo.
Senão, fechem as cortinas para não verem tanta sem-vergonhice e sacanagem com requintes de vingança que virá por aí. A nós restará só continuar a varrer a sujeira para debaixo do tapete. Do tapetão.
São Paulo, eleição Brasil, 2014
(*) Marli Gonçalves é jornalista – – Mas antes de tudo, cidadã. Leal a princípios, não a partidos.
Tenho um blog, Marli Gonçalves, divertido e informante ao mesmo tempo, no http://marligo.wordpress.com. Estou no Facebook. E no Twitter @Marligo