Os dias que nos aguardam

(*) Carlos Brickmann

carlos_brickmann_13Já que a oposição não briga, o Governo decidiu brigar sozinho. E, à falta de adversário, escolheu dentro de suas forças quem briga com quem. Comprovando a competência dos articuladores políticos da presidente Dilma, o Governo briga com o Governo – e está perdendo a briga. Renan Calheiros, quem diria, um dos líderes da oposição! E ao lado de Eduardo Cunha, que pela primeira vez na vida se vê contestando quem está no poder (preste atenção: ele está gostando!).

Na quarta, por decisão de Renan e Cunha, entra em pauta um assunto que o Governo adoraria ver descansar em alguma gaveta: o veto de Dilma à emenda que reajusta a tabela de desconto do Imposto de Renda na fonte em 6,5% (o Governo só aceita 4,5%). Mais uma derrota anunciada: o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, perde essa, prejudicando suas tentativas de aumentar a receita oficial esfolando melhor os cidadãos. Quem votará pelo aumento da carga tributária? O PMDB já informou o autor da emenda de que estará a seu lado, contra Dilma.

Na mesma semana, os partidos devem indicar quem vai compor a CPI do SwissLeaks, aquela montanha de dinheiro que pode ser ilegal e que foi descoberta no HSBC da Suíça. Há quase nove mil contas de brasileiros – muitas das quais legais, declaradas, muitas das quais não tão legais assim. Mais dores de cabeça para Levy: ele deve ser convocado para explicar o que está sendo feito pelos órgãos de controle da Fazenda para identificar os brasileiros ilegais do HSBC.

Dilma bem que se esforçou para controlar o Congresso. Mas a vaca tossiu.

A voz das ruas

No Congresso, a crônica das próximas derrotas. Nas ruas, duas manifestações para esquentar o fim do verão: dia 13, passeatas em defesa da Petrobras, organizadas exatamente pelo pessoal acusado de ordenhar a Petrobras; dia 15, passeata unificada de quem é contra o PT, reunindo desde a turma do Fora, Dilma e Fora, PT até o pessoal do impeachment e os que pretendem, sem afastar ninguém, deixar clara a insatisfação com o Governo Federal.

Fatores perigosos: PT e aliados estão concentrando manifestantes no Paraná, Estado fortemente antipetista, tentando criar dificuldades ao governador tucano Beto Richa, reeleito no primeiro turno; e há esforços para infiltrar black-blocs nas manifestações antigovernamentais do dia 15, para tentar desqualificá-las como pura baderna. Clima horrível.

Muito barulho por nada

O PPS, pequeno partido oposicionista, decidiu pedir a abertura de processos por quebra de decoro parlamentar contra todos os congressistas investigados pelo STF. Não vai dar em nada: ser investigado não é crime. Depois do inquérito, caso julgue que é o caso, o STF pode abrir processo, com acusação e defesa; e, após o processo, em caso de condenação, configurado o crime, será o caso de discutir o decoro parlamentar. Até lá, é tudo manobra para aparecer na TV.

Calma no Brasil

Não se apresse em saudar Renan Calheiros como líder da oposição. Renan, até hoje, nunca se opôs ao governo. Foi ministro importante de Fernando Henrique, dirigiu a Petroquisa, subsidiária da Petrobras, sob Itamar Franco, foi importante aliado de Lula e Dilma. É um político coerente: está sempre apoiando, mesmo que mude o Governo. Seu desgosto com Dilma é recente, e motivado por desconsideração e traição: Renan disse a Dilma que não queria cargos, mas pedia atenção especial a Alagoas, onde seu filho acabava de se eleger governador. Dilma disse a ele que ficasse tranquilo: Renan Filho teria todo o suporte federal. Até agora não teve nada. Dilma nem mesmo atendeu a seus telefonemas.

A grosseria a levou a confrontar-se com um profissional do ramo. E ela está perdendo.

Quem tem a força

Dilma tem aversão pessoal pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha. São dois trabalhos: primeiro desenvolver a aversão e, depois, disfarçá-la, por falta de alternativa. Eduardo Cunha é, para Dilma, o que Zagalo foi para a torcida brasileira: vai ter de engoli-lo. Eduardo Cunha não só comanda a maioria da Câmara como é forte em sua base eleitoral.

O ótimo colunista Aziz Ahmed, de O Povo, do Rio, conta que uma semana antes do almoço que será oferecido a Cunha, na Associação Comercial do Rio, todos os convites já estavam vendidos, a R$ 100.

Centro de compras de deputados

Eduardo Cunha, sejamos justos, não usa seu prestígio só para criar problemas para Dilma. É um político construtivo. Quer construir um shopping center no Congresso, junto ao Anexo 5 – três prédios e um plenário novinho, para aumentar o conforto de Suas Excelências durante as árduas jornadas de trabalho. Coisa de um bilhão de reais.

Eduardo Cunha quer atrair a iniciativa privada para financiar parte da obra, que deve ser extremamente necessária: a Câmara dos Comuns, em Londres, não tem sequer poltronas suficientes para todos os parlamentares, quanto mais cinco anexos, talvez porque lá os deputados, ocupados com o trabalho, não tenham tanto tempo para preocupar-se com compras pessoais ou com o tamanho dos banheiros. Mas aqui, conhecendo-se o trabalho desenvolvido pelos parlamentares, os banheiros são essenciais.

E shopping center para deputados, por que não? Shopping é um conceito vitorioso e moderno de compra e venda.

(*) Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.

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