Cerco fechado – Responsável na primeira instância pelos processos da Operação Lava-Jato, o juiz federal Sérgio Fernando Moro indicou que, a partir de um acordo de cooperação firmado pelo Ministério do Planejamento para gerir empréstimos consignados a servidores federais, partidos e políticos podem ter recebido propina. A suspeita do magistrado se baseia em depoimento do empresário Milton Pascowitch ao Ministério Público Federal (MPF), em acordo de delação premiada.
Nesta quinta-feira (13), a Polícia Federal deflagrou a décima oitava fase da Lava-Jato, cumprindo mandados judiciais em São Paulo, Brasília, Porto Alegre e Curitiba para obter provas dos supostos crimes cometidos com o esquema dos empréstimos consignados. O ex-vereador Alexandre Romano (PT), de Americana, no interior paulista, foi preso na ação. Ele é suspeito de ser um dos operadores do pagamento de propinas por meio do contrato assinado pelo Ministério do Planejamento.
De acordo com as investigações do Ministério Público Federal, empresas do Grupo Consist Software faziam repasses a pessoas encarregadas de intermediar os subornos. O grupo havia sido contratado por entidades que assinaram acordo de cooperação com o Planejamento para gerir o software que autoriza empréstimos consignados a servidores federais.
As entidades que contrataram a Consist são a Associação Brasileira dos Bancos (ABBC) e o Sindicato Nacional das Empresas Abertas de Previdência Complementar (Sinapp). “Os mandados terão por objeto a coleta de provas relativa à prática pelos investigados dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, além dos crimes antecedentes à lavagem de dinheiro, especialmente o pagamento de propinas pelas empresas do Grupo Consist (Consist Software, Consist Business e SWR Informática) a agentes públicos ou a partidos políticos”, detalhou Moro na decisão.
Pascowitch, apontado como um dos operadores do esquema de corrupção, revelou que uma de suas empresas, a Jamp, simulou contratos de consultoria de R$ 15 milhões com a Consist. Segundo ele, parte do dinheiro recebido foi repassado ao PT por solicitação do ex-tesoureiro, do partido João Vaccari Neto.
Conforme os procuradores da República, parte desses recursos foi arrecadado para o esquema de corrupção pelo ex-vereador Alexandre Romano, que é ligado ao ex-ministro e mensaleiro condenado José Duirceu, também investigado e preso na Lava-Jato. Outra parte da propina teria sido paga ao empresário Milton Pascowitch, que assinou acordo de delação premiada e está em prisão domiciliar. Os investigadores calculam, ao todo, que até R$ 52 milhões foram repassados aos operadores do esquema de corrupção por meio desta transação.
Sérgio Moro ressaltou em seu despacho que é possível que os pagamentos “sem causa” da Consist a Milton Pascowitch e a Alexandre Romano estejam relacionados ao benefício que a empresa obteve prestando serviços ao Ministério do Planejamento.
“Informa a autoridade policial que a Consist teria iniciado os pagamentos após a celebração do Acordo de Cooperação Técnica entre o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e a Associação Brasileira de Bancos (ABBC) e o Sindicato das Entidades Abertas de Previdência Privada (SINAPP) para fins de disponibilização, via internet, de serviços e sistema informatizado de gestão de margem consignável em folha de pagamento”.
O magistrado ressaltou que o acordo teria permitido à Consist gerir o sistema de pagamentos consignados no Ministério do Planejamento a partir do acesso aos dados relativos a mais de 2 milhões de servidores públicos federais. A empresa, aponta a investigação, recebendo valores mensais, agora de entidades privadas, recebia comissão de cada parcela de amortização mensal dos empréstimos que eram descontados dos servidores públicos.
“Segundo a autoridade policial, sem prejuízo da necessidade de aprofundamento, o acordo possibilitou à empresa Consist contratar indiretamente com o poder público sem qualquer procedimento licitatório prévio”, enfatizou.
Diante das suspeitas, o Ministério do Planejamento anunciou nesta quinta-feira a rescisão do acordo de cooperação técnica firmado com a ABBC e a Sinnapp. Em nota, a pasta afirmou que a rescisão ocorrerá nos próximos trinta dias e que uma sindicância interna apurará eventuais irregularidades. Ou seja, o ministério decidiu colocar a tranca na porta após a fuga do ladrão.
O órgão também ressaltou que a Consist foi contratada pelas duas entidades, que assinaram o contrato para fazer a gestão da concessão de crédito consignado. A pasta enfatizou que “não há relação do ministério com a empresa suspeita de pagar propina”.
“A empresa [Consist] faz análise de crédito para a instituição que concede o crédito consignado. Então é uma relação privada. Apesar disso o Ministério do Planejamento vai investigar se houve alguma irregularidade indireta nesse processo”, finalizou.