Janot acusa Cunha de usar a Câmara dos Deputados para agir em ‘interesse particular’

rodrigo_janot_12Fio trocado – Procurador-geral da República, Rodrigo Janot encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) resposta ao pedido da Câmara dos Deputados, formulado por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), para anular provas colhidas contra Eduardo Cunha, presidente da Casa, no sistema de informática do Congresso.

O procurador-geral acusou a Câmara de atuar em “exclusivo interesse particular” do deputado ao recorrer ao STF e fala em “confusão entre público e privado” no caso. “O agravo em questão evoca, em pleno século XXI, decantado vício de formação da sociedade brasileira: a confusão do público com o privado. O inquérito em epígrafe investiga criminalmente a pessoa de Eduardo Cunha, que tem plenitude de meios para assegurar sua defesa em juízo e, como seria de se esperar, está representado por advogado de escol”, assinalou Janot na peça. Apesar disso, continua o procurador, Cunha “solicitou a intervenção da advocacia pública em seu favor, sob o parco disfarce do discurso da defesa de prerrogativa institucional”.

Em nome da Câmara, a AGU encaminhou ao Supremo o pedido para invalidar provas colhidas no âmbito da Operação Lava-Jato, três meses depois da apreensão dos documentos. O advogado-geral da União, o petista Luís Inácio Adams, afirmou ter sido cobrado três vezes pelo presidente da Câmara para encaminhar a ação ao STF. Cunha nega.

“A invocação a violações ‘em abstrato’ a imunidades parlamentares esconde o fato de que a agravante, nestes autos representada pela Advocacia Geral da União, atua no exclusivo interesse particular da defesa de um investigado”, escreveu Janot, para quem a Câmara não aponta “como, onde e em que medida” o acesso às informações técnicas solicitado violou prerrogativas parlamentares.

A manifestação de Rodrigo Janot, protocolada nesta quinta-feira (13) no STF, ressalta que a Câmara não foi afetada ou teve prejuízo em razão da diligência cumprida e que é “terceiro alheio” à investigação. O procurador também destaca que não ocorreu busca e apreensão, mas sim uma solicitação autorizada pelo ministro Teori Zavascki para recolher dados do sistema de informática da Câmara. A intenção da medida foi apurar a autoria de um requerimento apresentado que teria servido para “pressionar” o lobista Júlio Camargo. O objetivo era comprovar tese baseada em elementos iniciais de que Eduardo Cunha fora o verdadeiro autor do requerimento.

A AGU alegou ao Supremo imunidade da sede da Câmara e também a necessidade de autorização prévia da Casa para a coleta de dados e documentos. Além disso, argumentou que a diligência violou o sigilo de fonte de informação da então deputada Solange Almeida, suposta autora do requerimento.

“Sucede que a Câmara dos Deputados não é parte na ação cautelar em foco, muito menos figura como investigada no inquérito. Não houve, portanto, para a Câmara dos Deputados, um efetivo prejuízo decorrente da diligência – prejuízo que não foi nem sequer indicado pela agravante”, sinalou Janot.

Na peça encaminhada ao STF, o procurador-geral ainda cita as diferentes versões apresentadas por Adams e Cunha sobre o pedido para encaminhar o recurso ao Tribunal. “A aparente tentativa do presidente da Câmara dos Deputados de dissociar seu nome do agravo interposto é reflexo direto da repercussão bastante negativa da iniciativa da Advocacia da União. Não é para menos: é óbvio, até para leigos, que a tentativa da Advocacia da União de invalidar provas colhidas no cumprimento da decisão do STF beneficia somente ao parlamentar investigado, tão evidente é a ilegitimidade recursal da Câmara dos Deputados (representada pela AGU)”, escreveu.

O procurador-geral da República sugere que “não é coincidência que esse parlamentar investigado seja o exatamente presidente da casa legislativa que a Advocacia da União afirma representar”.

Ao STF, Janot afirma que a peça enviada pela AGU “materializa uma patente violação ao princípio da impessoalidade”, que traduz a “confusão entre o público e o privado, tão renitente no Brasil”. O PGR pede que seja negado o recurso da Câmara até para que haja “efeito pedagógico” com intuito de proibir o uso da advocacia pública para fins privados.

O documento elaborado pela PGR sustenta ainda que a urgência em colher o material na Câmara se justificou pela “possibilidade de que fossem destruídas, alteradas ou suprimidas provas” no sistema da Casa, mantidas pela área de tecnologia de informação.

Janot lembra que o servidor da casa foi exonerado após a divulgação das informações sobre os arquivos do requerimento. O servidor foi ouvido pela PGR na condição de testemunha na investigação de Cunha. (Danielle Cabral Távora)

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