Lava-Jato: e-mails investigados pela PF revelam que Lula fez lobby para o grupo Odebrecht

lula_384Castelo de areia – Análise da troca de e-mails entre o empresário Marcelo Bahia Odebrecht, da Construtora Norberto Odebrecht, e seus executivos, mostra que o ex-presidente Luiz Inácio da Silva manteve proximidade nada republicana com a maior empreiteira do País durante seus dois mandatos (2003-2006 e 2007-2010). Nesses e-mails ficam evidentes as tratativas do petista com seus assessores e ministros em defesa dos interesses da construtora em negócios dentro e fora do Brasil.

De acordo com análise da PF, em um e-mail o presidente da Odebrecht e dois executivos da empreiteira, Marcos Wilson e Luiz Antonio Mameri, tratam com o então ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, sobre interesses da empresa em negócio na Namíbia.

“Miguel Jorge afirma que esteve com os presidentes (do Brasil e da Namíbia) e que ‘PR fez o lobby’, provável referência ao presidente Lula”, registra análise prévia feita pela Polícia Federal.

À época, o presidente do país africano era Hifikepunye Pohamba e, em fevereiro de 2009, Lula recebeu-o para um almoço no Itamaraty.

O primeiro e-mail analisado da série é de 6 de fevereiro de 2009, no qual Marcelo Odebrecht e executivos do grupo tratam do convite do presidente Lula para almoço com o presidente da Namíbia. “Marcelo, o Presidente Lula está lhe fazendo um convite para participa de um almoço, com o Presidente da Namíbia, no dia 11/02 (quarta-feira), às 13h00, no Itamaraty, salão Brasília”.

No e-mail o executivo informa: “Entendo que pode ser uma boa oportunidade função de nossa hidrelétrica. Seria importante eu enviar uma nota memória antes via Alexandrino com eventualmente algum pedido que Lula deve fazer por nós”.

Alexandrino Alencar, executivo ligado ao Grupo Odebrecht, o presidente da maior empreiteira do País, Marcelo Odebrecht, e outros três ex-dirigentes da companhia foram presos na Operação Erga Omnes há mais de cem dias.

No dia 11 de fevereiro de 2011, o executivo Marcos Wilson, da Odebrecht, escreveu para o ministro. “Miguel, se você estiver com o presidente Lula e o da Namíbia é importante que esteja informado sobre esta negociação e, se houver oportunidade manifestar sua confiança na capacidade desta multinacional brasileira chamada Odebrecht”.

Descrito no e-mail, o projeto em pauta é o de uma hidrelétrica, a Binacional Baynes, que envolvia um consórcio brasileiro formado pela Odebrecht com a Engevix – duas empreiteiras acusadas de corrupção na Lava Jato – e as estatais Eletrobrás e Furnas, junto com a Namíbia e Angola. O Investimento era de US$ 800 milhões.

No mesmo dia, o então ministro respondeu ao executivo: “Estive e o PR fez o lobby. Aliás o PR da Namíbia é quem começou – disse que será licitação, mas que torce muito para que os brasileiros ganhem, o que é meio caminho andado”.

Conforme os investigadores, a sigla “PR” é uma referência ao presidente da República, usada em várias outras trocas de e-mails. A mensagem eletrônica foi depois copiada a Marcelo Odebrecht.

Os e-mails analisados pela PF foram resultado da abertura de computadores e caixas de mensagens recolhidos nas sedes da Odebrecht, alvo de buscas em 19 de junho, quando o empresário e outros cinco executivos do grupo foram presos na esteira da Operação Lava-Jato. As mensagens revelam o monitoramento e as tentativas de influir nas agendas do presidente Lula durante seu governo.

As mensagens começam em 2005 e seguem até o último ano de mandato do presidente Lula, em 2010. Nelas constam convites de almoço, pedidos de encontro e atuação do petista em nome da empreiteira em países como Venezuela, Peru, Angola e dentro do próprio governo.

Como fica evidente nas mensagens, Alexandrino Alencar seria um dos principais canais da empreiteira com o governo Lula.

No governo, um dos alvos é uma pessoa identificada como “Seminarista” nas trocas de mensagens, que para a PF é o ex-chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho. Em maio de 2005, por exemplo, a secretária de Odebrecht encaminha documento para Alexandrino Alencar – executivo preso na Lava-Jato. “Dr. Marcelo pede-lhe a gentileza de encaminhar ao Seminarista e informar que o encontro com o Presidente está previsto para amanhã às 10h30”, informa.

Em setembro de 2009, e-mail de Darci Luz encaminhou para funcionário da Odebrechtmensagem trocada entre Marcelo Odebrecht e executivos do grupo “sobre investimentos e encontro com o Presidente do Peru, Alan Garcia, e eventual mensagem ou orientação por parte do presidente Lula”.

“Seria importante verificarmos com nosso amigo se existe alguma mensagem ou orientação por parte do Pres. Lula para minha conversa com Alan Garcia”.

Em outra mensagem, Marcelo Odebrecht encaminha e-mail para outros executivos, em outubro de 2007, e na “conversa” usa siglas e trata da agenda de Lula, que estava em visita a Angola. “Aparentemente, os executivos da Odebrecht mantêm contatos com autoridades da embaixada a fim de colocar em pauta, no encontro, assuntos de interesse da construtora”, ressalta análise da PF.

Com o título “Agenda Lula – URGENTE”, há citação a contatos no Itamaraty e o pedido para inclusão de Emílio Odebrecht – pai de Marcelo – em agenda do presidente “Rubio já fez os primeiros contatos junto ao Ita e me informou que é tradição: cabe ao anfitrião a escolha dos 20 convidados”.

Na visita, nos dias 17 e 18 de outubro, o empresário monitora a agenda do presidente Lula, lembra que da última vez o pai, Emílio, foi um dos convidados e reitera o pedido para incluir representante da empresa no evento. “Importante incluir Emílio no almoço. Novamente, segundo o Embaixador, é lado daí quem decide”.

Ainda em 2007, Odebrecht recorre ao “Seminarista” para resolver um problema da empreiteira com um dos ministros do governo Lula. Marcelo pede a Alexandrino que acione o “Seminarista” para tratar de um leilão em que a empresa participava e questiona a postura do então ministro de Minas e Energia, Nelson Hubner. Homem de confiança de Dilma Rousseff.

“Alex, o Hubner está querendo jogar o PR ainda mais contra nós. Importante você fazer esta mensagem chegar no seminarista ainda hoje”.

Os documentos analisados pela PF foram anexados na última sexta-feira (25), aos autos da Lava-Jato pelo delegado Eduardo da Silva Mauat. Representam uma pequena parte das 392.842 mensagens abertas, sendo que nesse levantamento foram analisados grupos específicos de mensagens de interesse.

A assessoria de imprensa do Instituto Lula ressaltou em nota que “o e-mail é de autoria do ex-ministro Miguel Jorge, por isso cabe a ele falar sobre sua mensagem, que indica que o assunto foi levantado pelo presidente da Namíbia, dentro das relações entre os dois países. O Itamaraty detém as informações sobre o referido almoço e os presentes na recepção ao presidente da Namíbia. A visita oficial e o almoço do presidente da Namíbia fizeram parte da agenda do ex-presidente, publicamente divulgada para a imprensa naquele dia”.

O ex-ministro Miguel Jorge esclareceu: “Eu não me lembro desse episódio nem de como foi a reunião entre os dois presidentes, mas havia uma atuação institucional em favor de empresas brasileiras, sendo a Embraer uma espécie de cartão de visita da capacidade da indústria nacional. Em praticamente todas as viagens do presidente, havia reuniões com empresas, embora elas não viajassem com ele – mas, sempre, havia uma reunião pública e aberta, em que falavam o PR e ministros (das Relações Exteriores, ou do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, ou da Agricultura (nessas duas regiões, havia um enorme interesse pelo trabalho de pesquisa da Embrapa). Nas reuniões do PR com outros presidentes, das quais participei, não havia a presença de empresas. Durante meu tempo no Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, organizei mais de 10 missões comerciais, usando o Sucatão da Presidência, e cerca de mil empresas participaram dessas missões – empresas grandes, como Embraer, Sadia etc – e muitas médias e pequenas, que aliás, eram nossa prioridade”.

Enquanto isso, “a Odebrecht esclarece que os trechos de mensagens eletrônicas divulgados apenas registram uma atuação institucional legítima e natural da empresa e sua participação nos debates de projetos estratégicos para o País – nos quais atua, em especial como investidora. A empresa lamenta, no entanto, a divulgação e interpretações equivocadas sobre mensagens sem qualquer relação com o processo em curso”.

O ex-ministro de Lula e home de confiança Gilberto Carvalho nega categoricamente que recebeu diretamente de Marcelo Odebrecht ou Alexandrino Alencar qualquer sugestão para discursos em agendas internacionais ou assuntos relativos à Odebrecht.

O presidente Lula sempre expressou que queria se transformar em um caixeiro viajante do Brasil, por isso nas inúmeras viagens, por todos os continentes, sempre fez questão de convidar muitos empresários, realizando reuniões nos países visitados na perspectiva de abrir novas negociações para empresas brasileiras. A Odebrecht foi uma dentre muitas.

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