Na política não há coincidências, assim como prevalece a tese da ação por interesse. Isso significa que qualquer movimento de um político ou de um partido tem por trás uma razão maior e escusa. Quando o Mensalão do PT, primeiro escândalo de corrupção da era petista, veio à tona, o partido de tudo fez para postergar a abertura do respectivo processo. De chicanas jurídicas a nomeações de ministros alinhados para o Supremo Tribunal Federal, de tudo um pouco comprometeu o andamento da Ação Penal 470, que mandou para a cadeia os alarifes que protagonizaram o esquema criminoso de compra de apoio político no Congresso Nacional por meio de polpudas mesadas.
Agora, com Dilma Vana Rousseff, a presidente da República, enfrentando os efeitos colaterais de um pedido de impeachment, legal e devidamente acolhido pela Câmara dos Deputados, o Partido dos Trabalhadores, assim como o staff palaciano, quer acelerar a análise do requerimento que aponta crime de responsabilidade para ejetar a petista do poder. O desespero do governo é tamanho, que horas após o acolhimento do pedido de impeachment a base governista começou a defender a suspensão do recesso parlamentar, o que de chore exige que do Congresso a autoconvocação. De tal modo, se essa teoria vingar, o recesso, que na prática começará no próximo dia 17 de dezembro e se estenderá até 31 de janeiro, estará fora do calendário político.
Há muitas razões para essa pressa por parte do governo, mas pelo menos quatro merecem análises pontuais:
Pressão popular
Temendo que o descontentamento da população, que não mais suporta a avalanche de corrupção e o tsunami de incompetência, retorne às ruas, o Palácio do Planalto vê na celeridade da análise do pedido de impeachment uma trincheira para evitar que Dilma seja apeada do poder. Por enquanto o governo contabiliza votos em número suficiente para arquivar o pedido de impedimento durante votação no plenário da Câmara – são necessários 342 votos para prosseguir ou arquivar –, mas esse cenário pode mudar, dependo da disposição dos brasileiros de bem de pressionar e cobrar os deputados federais.
Além disso, o plano do governo foca também o período das festas de final de ano, quando os brasileiros estão ocupados e preocupados com os preparativos finais, as poucas e anoréxicas compras, a virada do ano e as indesejáveis contas que sempre marcam o primeiro mês do calendário.
De início os partidos de oposição mostraram-se favoráveis à suspensão do recesso parlamentar, mas depois, com o repentino interesse do governo em relação ao tema, os adversários de Dilma Rousseff mudaram de ideia. Ou seja, nem para pensar de forma estratégica a oposição serve.
Acirramento da crise
Outro tema que leva o governo a defender a rapidez na análise do pedido de impeachment é a preocupação com o inevitável acirramento da crise econômica. A partir de agora focado na defesa de Dilma, o governo perderá força e combatentes na batalha para aprovar projetos econômicos que contemplam o ajuste fiscal.
Com os preços administrados puxando para cima a resistente inflação, a elevação dos níveis de desemprego preocupando as famílias, a queda do consumo assustando o País, o PIB encerrando o ano com retração de 3,5% e a produção industrial em queda livre, além do justificável temor dos investidores internacionais, a sensação da população em relação à crise deve subir sobremaneira. Isso é considerado pela cúpula do governo como mais um gatilho a acionar a insatisfação popular com um governo corrupto, incompetente, perdulário e paralisado.
Escândalos de corrupção
Considerando que a Operação Lava-Jato ainda está longe do seu final, se é que isso será possível algum dia, o governo também se preocupa com o surgimento de novos escândalos de corrupção envolvendo “companheiros”. Não bastasse a Lava-Jato, a Operação Zelotes, da Polícia Federal, colocou na alça de mira algumas figuras estreladas que gravitam na órbita do PT e do Palácio do Planalto: Cláudio Luís Lula da Silva, Erenice Guerra e Gilberto Carvalho. Todos investigados no esquema criminoso de compra de medidas provisórias e anulação de multas tributárias no CARF.
De tal modo, o governo aposta na rapidez da análise do pedido de impeachment para escapar das consequências das investigações, que podem ser devastadores quando reveladas as delações premiadas de Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano; Nestor Cerveró, ex-diretor da Petrobras; Pedro Corrêa, ex-deputado federal pelo PP de Pernambuco e condenado à prisão na Ação Penal 470; e Delcídio Amaral, preso pela PF na última semana e que pode contar o que sabe em troca de liberdade vigiada.
Dança de cadeiras no STF
No caso de o pedido de impeachment avançar – por enquanto não há razão para ser arquivado – e for aprovado pelo plenário da Câmara dos Deputados, o passo seguinte será o Senado Federal. De acordo com o que determina a legislação vigente, a decisão do Senado será tomada em julgamento sob o comando arbitral do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), no caso Ricardo Lewandowski.
Acontece que em meados de 2016 Lewandowski deixará o posto, entregando a batuta do STF para a ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, que recentemente ganhou as redes sociais no rastro de um discurso contundente em que afirmou que o crime não vencerá as leis. A ministra mandou um duro recado aos alarifes com mandato que apostam na impunidade para continuar saqueando o Brasil.
Como se sabe, Ricardo Lewandowski tem uma simpatia visceral pelo PT, algo que ficou evidente durante sua atuação ao longo do julgamento da Ação Penal 470, que mandou petistas estrelados para uma temporada no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília. Sendo assim, para o governo e para o PT é melhor ter Lewandowski no comando da sessão do Senado, do que ficar nas mãos da crítica e mineira Cármen Lúcia.