Impeachment: em troca de apoio, senadores ignoram o momento do País e chantageiam o governo

michel_temer_1011

O governo interino de Michel Temer herdou uma terra arrasada. Diante do estrago fruto da incompetência da petista Dilma Rousseff, passou-se à opinião pública a ideia de que o governo, mesmo que ainda não definitivo, seria de coalizão. Lamentavelmente, nos últimos treze anos o significado de coalizão distanciou-se da realidade e passou a representar um acordo espúrio para saquear o Estado. Cenário que só foi possível com a conivência dos palacianos de então, que tinham como meta levar adiante um projeto criminoso de poder.

O que se vê hoje no palco da política nacional é uma reprise do mesmo: escambo chantagista que cada vez mais faz do Brasil uma nação refém do banditismo político. Para apoiar o processo de impeachment de Dilma Rousseff e votar favoravelmente ao afastamento definitivo da petista, senadores cobram do presidente interino uma contrapartida. Essa moeda de troca vai desde o apoio de Temer a disputas locais – nas eleições municipais – a indicações para cargos em estatais e até para o comando do BNDES – o maior fomentador de empresas do País. Como se não importasse a necessidade de salvar o País.

Por causa do assédio acintoso dos senadores, Michel Temer tem recebido parlamentares no Palácio do Jaburu em encontros e reuniões, marcados muitas vezes fora da agenda oficial. E o peemedebista escuta mais do que fala. “O Temer está comprando a bancada. É uma compra explícita de apoio”, afirmou o senador Roberto Requião, que, apesar de peemedebista, é contrário à saída de Dilma.

Segundo interlocutores do governo no Senado, o “movimento” nada mais é do que uma lista de demandas, para não afirmar que se trata de uma imposição espúria no momento em que o momento o Brasil precisa sair do atoleiro da crise. De acordo com relatos de três senadores próximos a Temer, o caso mais excêntrico é o de Hélio José (PMDB-DF), que pediu 34 cargos, entre os quais a presidência de Itaipu, Correios, Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e até o comando do BNDES. Hélio José foi convencido da inviabilidade dos pedidos e do risco político que correria em sua base se apoiasse Dilma. Não levou nada e ainda decidiu votar pelo afastamento.

Provável candidato à prefeitura do Rio de Janeiro nas próximas eleições, o senador Romário (PSB-RJ), que votou pela admissibilidade do impeachment, ficou indeciso sobre o afastamento definitivo poucos dias depois. A dúvida foi comunicada ao Planalto, mas acompanhada de uma “fatura”. Romário pediu o comando da Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência e uma diretoria em Furnas. A primeira vaga já havia sido prometida para a deputada Mara Gabrilli (PSDB-SP). Cadeirante e militante histórica, ela queria emplacar um nome da área. Romário ganhou apenas o cargo, que ficou com a ex-deputada Rosinha da Adefal.

Já o senador Zezé Perrella (PTB-MG), ex-presidente do Cruzeiro, conseguiu emplacar o filho, Gustavo Perrella, na Secretaria Nacional do Futebol e de Defesa dos Direitos do Torcedor.

Enquanto isso, Michel Temer também é cobrado a se posicionar politicamente em disputas locais. O caso mais emblemático é o do Amazonas, onde o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB), aliado do senador Omar Aziz (PSD), é adversário do senador Eduardo Braga (PMDB). Todos são aliados de Temer e estarão em lados opostos na eleição municipal. O senador peemedebista reivindica o apoio do presidente em exercício para seu candidato, Marcos Rota. Já Aziz quer que Temer ajude Virgílio.


O presidente interino enfrenta o mesmo dilema no Paraná, onde dois aliados, o governador Beto Richa (PSDB) e o senador Alvaro Dias (PV), são adversários políticos e disputam influência em Itaipu.

Conforme cálculos do Palácio Planalto, a cassação de Dilma está nas mãos de 15 senadores. Atualmente, 38 se posicionam a favor do impedimento – são necessários 54. O ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, se recusa a revelar a “estratégia” para evitar a volta da petista. “Não vou revelar nomes, mas temos um controle diário dentro do Senado. Temos informação do movimento de todos, até mesmo daqueles que se dizem indecisos”, revelou, em um almoço com empresários na última semana.

O titular da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, confirmou que tem dialogado com senadores que buscam espaço no governo. “As conversas estão sendo republicanas e não está havendo essa pressão que se imagina, não”, disse.

As articulações são criticadas pela oposição. “Quando há um processo de julgamento de uma presidente, há uma alteração da condição do senador, que vira juiz. No período do julgamento, ele não pode negociar posição com cargo”, reclamou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ). O senador petista tem razão, apesar da sua conhecida incoerência, pois o que se vê é algo semelhante a um juiz que vende sentença.

Senadores que estiveram com Temer disseram que não trataram do afastamento. “Ele não tocou no assunto. Eu disse que ele precisava de uma agenda para os excluídos e perguntei quem iria pagar pelo ajuste”, disse Cristovam Buarque (PPS-DF), indeciso sobre o voto final e que também visitou Dilma. Na admissibilidade, ele votou contra a presidente.

Hélio José relativizou suas demandas. Ele disse que sugeriu nomes “apenas quando foi consultado” e considerou um “folclore” a lista de cargos que teria apresentado. A assessoria de Romário afirmou, por meio de nota, que não houve negociação por seu voto no impeachment e negou a demanda por uma diretoria em Furnas. Procurados, Perrella, Braga e Aziz não foram localizados. Alvaro Dias afirmou que “quer distância” de cargos.

apoio_04