Reza a sabedoria popular que “o lobo perde o pelo, mas não o vezo”. Esse ditado parece ter sido feito sob medida para o petista José Nobre Guimarães, deputado federal pelo Ceará, figura central do escândalo que ficou conhecido como “dólares na cueca”.
Ex-líder do governo da companheira Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados, Guimarães foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. O petista foi acusado por outro correligionário, Alexandre Romano, o Chambinho, que em outro depoimento também denunciou o ex-ministro Paulo Bernardo da Silva (Planejamento e Comunicações) e a senadora Gleisi Helena Hoffmann (PT-PR) no âmbito da Operação Custo Brasil.
De acordo com a denúncia da PGR, em 2011 Guimarães, que é irmão de José Genoíno, recebeu propina no valor de R$ 97,7 mil por facilitar financiamento do Bando do Nordeste do Brasil (BNB) a um usina de energia eólica do grupo Engevix, que também está atolada na Operação Lava-Jato.
A PGR afirma que o deputado petista viabilizou encontro entre Alexandre Romano, então agente da Engevix, com Roberto Smith, então presidente do BNB. O valor para a construção de usina eólica na Bahia era de R$ 260 milhões. Segundo a denúncia do MPF, José Guimarães “indicou e dava sustentação política” a Smith na presidência do BNB.
Mediante o sucesso da empreitada, Chambinho recebeu comissão no valor de R$ 1 milhão, “de forma disfarçada”, através de contratos fictícios de prestação de serviços de advocacia a empresas do grupo Engevix. Desse valor (R$ 1 milhão) saiu o montante pago a Guimarães, segundo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
“Em suma, o panorama probatório coletado demonstra robustamente o recebimento doloso de vantagem indevida pelo deputado federal José Guimarães, mediante o pagamento de dívidas pessoais por terceiros. A propina foi recebida em razão da atuação do parlamentar perante a presidência do Banco do Nordeste do Brasil, de sua indicação e sustentação política, para viabilizar a concessão de financiamento de acordo com os interesses da empresa”, destacou Janot na denúncia.
No documento consta que o valor de R$ 97.761,00 foi pago por meio de dois cheques, devidamente compensados em setembro de 2011, em favor do escritório Bottini e Tamasauskas Advogados – do criminalista Pierpaolo Bottini (advogada de Claudia Cruz, mulher de Eduardo Cunha) – e Samab Companhia Indústria e Comércio de Papel.
Janot pontua na denúncia que o escritório de Bottini confirmou ter recebido cheque no valor de R$ 30 mil pela atuação na defesa do parlamentar em um inquérito no STF. Quando um criminalista como Pierpaolo Bottini cobrar honorário tão irrisório, o brasileiro pode acionar o foguetório porque o Brasil terá se transformado na filial do paraíso. Nenhuma defesa no STF, por mais simples que seja, não sai por menos de R$ 1 milhão.
No tocante à empresa de papel, Rodrigo Janot afirma que também foi apresentada documentos que provam o depósito do cheque no valor de R$ 67.761,00, usado para pagar material de campanha (folhetos e “santinhos”).
Para o procurador, “o repasse de propina com base em contratos fictícios e mediante o custeio de despesas pessoais, por meio da realização de pagamentos a pessoas jurídicas credoras do agente público beneficiado, consistiu em estratégia de ocultação e dissimulação da natureza, da origem, da localização, da disposição, da movimentação e da propriedade de valores provenientes diretamente do crime de corrupção passiva”.