Além da avalanche de corrupção, brasileiro precisa monitorar a crise institucional que chacoalha o País

Deflagrada em março de 2014, a Operação Lava-Jato desvendou um assombroso esquema de corrupção, o qual vem sendo combatido a duras penas e terá de ser enfrentado de forma permanente. Afinal, a cultura da corrupção não será extirpada do cotidiano nacional da noite para o dia.

A operação da Polícia Federal revelou as entranhas de uma roubalheira sistêmica que levou o Brasil à débâcle institucional. Esse ponto, em que enfrentamentos entre poderosos ditam os ritmo da discória, coloca a democracia em risco e atenta contra o cidadão.

A esgrima política que tomou conta das fronteiras dos Poderes constituídos, por causa dos inúmeros escândalos de corrupção, tem mostrado aos brasileiros não apenas o avanço de uma crise institucional preocupante, mas um movimento de insegurança jurídica que ameaça o Estado Democrático de Direito.

Entre respeitar a Constituição Federal em sua inteireza, assim como a legislação infraconstitucional, e querer passar o Brasil a limpo, há uma zona de conflito que se agiganta com a necessidade de recolocar o País nos trilhos do bom senso.

Sabem os leitores que o UCHO.INFO cultua o legalismo como forma de conduzir o Estado, mas isso não pode servir de gatilho para disputas insanas e quase intermináveis entre os atores políticos como um todo.

Ao longo dos últimos três anos, este portal alertou de maneira recorrente para o perigo que representava e ainda representa o cumprimento da lei de acordo com a conveniência do momento. A questão não é proteger criminosos, mas evitar o surgimento de precedentes ilegais que fragilizam o cidadão comum.

Nesse período, o País viveu inúmeros casos de enfrentamento entre os Poderes, como se vivêssemos em um faroeste jurídico. Voltando um pouco mais na linha do tempo, o carnaval avançou sobre legislação vigente ganhou corpo por ocasião do Mensalão do PT, cujo julgamento produziu decisões judiciais descabidas e ungidas pela malfadada hermenêutica. Bandidos conhecidos foram beneficiados por bamboleios interpretativos da lei, até o cometimento de novos e iguais crimes.

Desde o advento da Lava-Jato, o brasileiro tem visto decisões absurdas por parte do Judiciário, que em dada instância prende sine die, enquanto no Supremo Tribunal Feral a liberdade muitas vezes é concedida sem cerimônia e em desrespeito à lei.


Não obstante, a Carta Magna traz em seu texto uma aberração legal que permite ao Legislativo recusar determinadas decisões tomadas pelo Judiciário. O melhor exemplo foi o afastamento de Aécio Neves do mandato de senador, rejeitado pelo plenário do Senado. Ou seja, a Constituição estabelece que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza” (artigo 5º), mas no Brasil uma minoria se sobrepõe à maioria em termos de direitos e regalias.

Outro exemplo dessa queda de braços entre os Poderes constituídos surgiu nos últimos dias, no vácuo da prisão de Jorge Picciani, presidente licenciado da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), e mais dois deputados estaduais, e uma decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2).

Na última sexta-feira (17), o plenário da Alerj revogou a prisão dos deputados Jorge Picciani, Paulo Mello e Edson Albertassi, todos do PMDB. A direção do Legislativo fluminense, em clara usurpação de competência, enviou ao presídio de Benfica alvará de soltura dos três parlamentares, algo que caberia ao TRF-2. Afinal, apenas quem prende pode determinar a soltura.

Nesta terça-feira (21), o TRF-2 decidiu, por unanimidade, que o trio acusado de corrupção deveria retornar a prisão, uma vez que a decisão da Alerj de soltar os deputados não teve a anuência do tribunal. O “prende e solta” em questão só não prosperará em questão porque a Alerj desistiu de contestar a decisão da Justiça.

Por outro lado, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro anulou a sessão da Alerj que revogou a prisão de Picciani, Mello e Albertassi. O que, ao pé da letra, ensejaria a realização de nova sessão extraordinária para analisar o tema.

Em outro vértice do poliedro da crise institucional está exemplo semelhante, mas em outra esfera do Poder. Ainda sem ter dado explicações, a Procuradoria-Geral da República (PGR) levou adiante uma ação monitorada que surgiu a partir da gravação de um diálogo entre o presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista. A PGR sabia que a gravação era ilícita, mas mesmo assim avançou na negociação de um acordo de colaboração premiada apenas porque a ordem era mandar a República pelos ares.

Fosse pouco, o Ministério Público Federal (MPF) não aceita ser investigado por outros Poderes, alegando que somente os iguais é que podem investigar e julgar os procuradores da República. Essa é a justificativa da procuradora-geral Raquel Dodge em manifestação enviada ao STF, que na pessoa do ministro Dias Toffoli derrubou a convocação do procurador Eduardo Pelella, ex-chefe de gabinete de Rodrigo Janot, pela CPMI da JBS.

O Brasil está se tornando um reduto de tribunais de exceção, o que é perigoso para a democracia. Senadores e deputados só podem ser processados, condenados e presos com a autorização das respectivas Casas legislativas. O MPF não aceita que procuradores sejam investigados por terceiros. Os militares só podem ser julgados pela Justiça Militar. E o cidadão comum… Bem, o cidadão comum que respeite a lei e aceite silenciosamente o papel de eterno financiador da balbúrdia. Ainda é tempo para conter a crise institucional!

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